Análise – A Plague Tale: Requiem

Quando analisámos A Plague Tale: Innocence, vários elementos jogaram a favor do Asobo Studio. Um deles, foi o da surpresa. Com A Plague Tale: Requiem já não somos tão bem surpreendidos.

Talvez a pensar nisso, o estúdio assumiu que não iria tentar inovar, mas sim pegar nos principais elementos, expandi-los e dar-nos mais uma porção da interessante história com que o primeiro jogo arrancou. Temos novamente um jogo de aventura com enfoque na narrativa e uma acção mais no género furtivo, com puzzles e alguma estratégia à mistura. Neste jogo, porém, Amicia está mais letal e Hugo mais poderoso, até porque os inimigos estão menos tolerantes. É é claro que os ratos estão de volta, bem mais abundantes, embora num papel ligeiramente diferente. De resto, como irão ver, Requiem é praticamente uma continuação linear de Innocence.

Uma nota absolutamente essencial para o enredo. Raramente sou obrigado a fazer este reparo, até porque evito bastante os spoilers. Contudo, é muito importante que notem que é impossível não fazer spoilers do primeiro jogo. Bem sei que já foi lançado há algum tempo mas acredito que alguns só o irão descobrir com base neste jogo mais recente.

Infelizmente, como a história é uma continuação directa, se não jogaram Innocence, lamento mas terão spoilers aqui. O próprio jogo não faz grande cerimónia em estragar o enredo do primeiro jogo, assumindo sempre que o jogaram e, mais importante, que o terminaram. Por isso, se ainda tencionam jogar o primeiro A Plague Tale, apressem lá isso.

Dou uma dica: os dois jogos estão disponíveis (na data de lançamento para Requiem) no Xbox Game Pass. Vão lá num instante reviver a história de Amicia e Hugo, dois irmãos inocentes que, subitamente vêem a sua vida estragada por uma maldição, uma perseguição religiosa e a ameaça de uma peste espalhada por ratos esfomeados com aversão à luz. Eu espero.

Já voltaram? Ok, vamos lá continuar. Não fizeram batota, pois não? Ora bem… Seis meses depois dos eventos de Innocence, Amicia e Hugo da família De Rune fugiram para o Sul de França na companhia da sua mãe Béatrice e do jovem alquimista Lucas. Depois de Hugo dominar (quase) por completo o seu poder de chamar os ratos, a família pretende encontrar uma ilha que servirá de local para residir e esquecer a tribulações da Inquisição, ao mesmo tempo que lutam para tratar da doença misteriosa de Hugo.

Só que os poderes de Hugo e os problemas perseguem a família. Depois de um interlúdio com “as crianças a serem crianças”, cedo percebemos que este é um mundo violento em que, se não optarem por matar, serão mortos. Não vou aprofundar mais o argumento, porque acho que já estraguei uma boa parte do enredo do primeiro título, especialmente num ponto pivotal da história que serve de premissa nos primeiros capítulos. Fiquem descasados, não lancei spoilers deste segundo jogo.

Já irei falar mais da parte técnica mas não posso deixar passar a oportunidade de falar no primeiro impacto que este jogo proporciona. O primeiro Innocence surpreendeu bastante pela positiva quando nos mostrou um jogo francamente brilhante a nível visual, com um importante contraste entre luz e sombras, numa construção de níveis muito sóbria, por vezes ampla, por vezes claustrofóbica, por vezes bonita, por vezes grotesca. O estúdio Asobo soube muito bem criar um mundo medieval credível e a roçar o realismo em alguns momentos.

Em termos de jogabilidade, porém, não podemos dizer que Innocence era um jogo muito exigente. Entre os puzzles do tamanho de níveis e as áreas de combate furtivo, além de áreas de combate directo (que sempre me pareceram contra a corrente do jogo), Innocence não era um jogo assim tão complexo de jogar. Olhando com a perspectiva do tempo, o que faz desse jogo tão memorável é o conjunto de visual, história e, sim, a jogabilidade quando nos convida a esgueirar pelas sombras. Mas, só por si, as partes não funcionariam isoladas.

A Plague Tale: Requiem continua a ser esse jogo simples como foi o primeiro título. Contudo, parece-me que o foco foi mais em torná-lo menos previsível, variando mais a jogabilidade. Agora, não temos tantas situações de combate “obrigatório”, podendo, quase sempre, optar pela acção furtiva. Ao contrário do primeiro jogo, contudo, Amicia não é tão “indefesa” se for descoberta numa secção de combate furtivo. E também não é forçoso que enfrente todos os inimigos directamente. O que é, para mim, um aprimorar mais inteligente da interacção.

A pensar nisso, o jogo tem agora um esquema de progressão pensado para premiar mais o estilo de jogo de cada um. Além da evolução das barras de energia e do equipamento reunindo ítens variados como tínhamos no primeiro jogo, temos também habilidades específicas. A árvore de evolução distingue-se bem entre a acção directa e a furtiva, com habilidades viradas para quem prefere mais o combate linear ou outras para os que privilegiam as sombras. Pessoalmente, a segunda hipótese parece-me onde o jogo melhor se sente. Mas, nunca senti que os combates fossem descartáveis.

Se o combate é a vossa opção, Amicia, como já disse, está mais letal. Agora, a heroína está equipada com uma faca para embates próximos e uma nova besta para inimigos mais fortes. A fisga, ainda lá está, até porque os dardos não são eternos. Os potes e pedras para atirar e chamar a atenção, também. Agora, além de podermos acender ou apagar fogueiras com o poder da Alquimia, podemos usar alcatrão para ampliar a iluminação e, sim, pegar fogo a inimigos. A nível armamento, portanto, há mais “ferramentas”, que são também usadas de forma mais variada.

Quanto aos ratos, não pensem que Hugo é agora um “todo-poderoso” lorde dos roedores. Por acaso, olhando para o material promocional pré-lançamento, fiquei com a ideia que os ratos seriam mais uma arma que uma praga. Contudo, continuam a ser uma importante ameaça, embora possamos novamente usá-los em algumas secções para atacar os incautos ou mesmo para resolver alguns puzzles. Desta feita, notem, há muito mais rataria no ecrã, fruto do melhor hardware. Por isso, mais uma vez, não é aconselhado a musófobos.

Falando exactamente no hardware, tive a oportunidade de experimentar este jogo numa Xbox Series X e devo dizer que foi das experiências mais “suaves” que tive nos últimos tempos. Parece que neste ano os lançamentos são todos atribulados com problemas técnicos, pelo que já fico satisfeito quando são minimamente estáveis. Infelizmente, há algumas falhas a assinalar. As mais visíveis são problemas na detecção de colisões e no sincronismo de lábios, curiosamente um dos pontos negativos de Innocence e que também aqui estraga a experiência das cenas intermédias.

A qualidade visual geral é realmente impressionante, novamente com um importante foco na iluminação e nas sombras. A arquitectura medieval é, uma vez mais, criada com imenso rigor Histórico. Como já disse, há mais ratos, segundo a produção “mais de 300.000 ratos” podem ser criados no ecrã. Vou ter de acreditar na sua palavra. Não os contei, de facto, mas senti-os, com quebras pontuais de performance em secções em que o número parece mesmo insano. Fico, aliás, na dúvida como é que a versão Nintendo Switch se comporta com este nível visual.

Veredicto

A história de Hugo e Amicia tem aqui uma continuação à altura do primeiro título. De facto, A Plague Tale: Requiem é uma sequela que risca todos os elementos que esperamos numa continuação. Enquanto que o primeiro jogo surpreendeu pela positiva, o Asobo Studio ganhou a experiência necessária para expandir o conceito… mas nunca de uma forma desmedida. É maior, mais dinâmico, mais deslumbrante mas nunca foge mesmo à sua fórmula original, mantendo até alguns dos defeitos do primeiro jogo.