Análise: Adr1ft
Ser Astronauta. Estou certo que muitos dos nossos leitores tiveram este sonho um dia. Hollywood sempre soube dar o lado romântico da exploração espacial e o mundo dos videojogos não ficou atrás. Adr1ft é um jogo que consegue colocar-nos nessa profissão de sonho… mas na pior das circunstâncias.
Se vos perguntar qual o filme de acção espacial dos últimos tempos que mais gostaram, talvez me falem de filmes de combates espaciais ou thrillers galácticos. Um dos filmes que mais gostei deste género, porém, foi “Gravity” com Sandra Bullock. A questão é simples: Ser Astronauta é, de facto, uma profissão única e cheia de prestígio, mas envolta em enormes riscos. O que acontece quando tudo corre mal? Como será sobreviver no espaço onde cada respiração e cada segundo contam? Como é tomar decisões quando a nossa vida está presa na gravidade zero? Este é o desafio da produtora Three One Zero para o seu novo título. Resta saber se a ciência e a jogabilidade podem andar de mão dada no vácuo.
No ano 2037, a bordo de uma massiva estação espacial na órbita da Terra, a Comandante Alex Oshima está com um dilema. A estação sofreu um evento catastrófico que resultou na perda de sistemas e na destruição de diversos módulos. Pior, Oshima é a única sobrevivente e o seu fato está com fuga de oxigénio e danificado. Lutando para sobreviver a Astronauta precisa entender o que passou, procurar os seus companheiros falecidos e tratar da evacuação. Só que, com esta falha destrutiva, os sistemas estão todos desactivados. A jovem precisa agir rapidamente, gerindo recursos, navegando pelos destroços, tudo isto em gravidade zero e quase sempre exposta ao vácuo e aos elementos.
A premissa até parece interessante mas, infelizmente, o enredo que já leram é só mesmo o que há para saber. Não há reviravoltas, nem surpresas, não há qualquer fio condutor, excepto uma luta urgente por sobreviver e procurar evacuar da estação. Em algumas salas haverão computadores com mensagens pessoais ou pelos escombros da estação encontrarão gravadores de voz e objectos que irão dar um vislumbre das relações da tripulação e ajudar a perceber o que aconteceu. Mas nenhuma dessas descobertas altera a história do jogo e servem apenas para satisfazer a nossa curiosidade.
Uma vez que a história é acessória, servindo só para nos dar um contexto, a jogabilidade acaba por ter um papel fundamental. Nos primeiros minutos somos mesmos levados a crer que este pode ser um título espacial excelente, como já não víamos há muito tempo. Imaginei de imediato jogar com um dispositivo de Realidade Virtual, usando um comando analógico para flutuar na gravidade zero, contemplando um jogo bonito e com o enorme planeta Terra como pano de fundo. Basicamente, exploramos a estação espacial em busca de recursos e activando sistemas, ao mesmo tempo que apanhamos os tais pedaços de enredo e outros coleccionáveis (tantos discos SSD para encontrar).
No entanto, as coisas começam a tornar-se demasiado repetitivas a dada altura, começando pela necessidade constante de reabastecer o fato com oxigénio. Esta mecânica chega ao nível da loucura, quando cada movimento (e respiração) esgota a limitada quantidade de ar. Sim, o fato usa o nosso oxigénio para alimentar os propulsores, que na gravidade zero estamos constantemente a usar. Assim sendo, vamos usar todas as garrafas de emergência ou estações de reabastecimento de oxigénio, convenientemente assinaladas por uma luz verde e espalhadas pela estação, só para não morrermos de falta de ar. E aqui tenho de perguntar: Numa missão espacial um Astronauta só tem um fato espacial à disposição? Se está danificado não pode usar um fato de reserva? Enfim…
Não há nada de errado nesta mecânica que só nos transmite uma noção de urgência. Mas é uma constante aborrecida, até porque apesar de repararmos o fato em várias fazes, tudo o que vamos fazer até aos créditos finais é mover-nos de garrafa de oxigénio em garrafa de oxigénio, sem que haja um real sentido de exploração. E aqui mesmo, neste ponto da navegação, surge um outro destaque que considero negativo: A infame falha de orientação para objectivos. Tudo bem, a base está destruída e por vezes temos de navegar pelo vácuo a procurar alternativas para uma porta bloqueada. Só que, nem sempre o ícone de objectivo é óbvio ou perceptível. Com a falta de oxigénio, acabamos “presos” no vácuo, perdidos e sem saber o que fazer… toca a recuperar checkpoints.
Mas não se preocupem se ficarem sem saber muito bem para onde ir. Vão regressar muitas vezes às mesmas áreas e repetir mecânicas de forma robótica. Incrivelmente, até mesmo a descrição dos passos seguintes é uma fotocópia da anterior. A Inteligência Artificial da estação espacial e a sua voz monocórdica faz questão de repetir sempre os mesmos objectivos: O servidor está offline, é preciso descarregar novas instruções, é preciso fabricar um core, é preciso instalar o novo core, é preciso reactivar o sistema. Em áreas diferentes, é certo, mas exactamente com os mesmos passos e procedimentos, onde só muda o trajecto e aumentam os perigos.
Havia aqui tanto para explorar. Sem ter tiros nem explosões, um jogo deste calibre, com muita relevância e precisão científica, mesmo com as mecânicas repetitivas, poderia ter uma acção bem mais diversa que apenas flutuar, pressionar uns botões aqui e ali, navegar entre sectores, abrir portas, garantir que enche o reservatório de oxigénio frequentemente… rebobinar e repetir. Poderia ter puzzles, alguma interacção mais complexa ou, pelo menos não repetir os mesmos passo. E como é um jogo curto, com uma duração aproximada de duas horas, em metade desse tempo parece já estar farto de inovar e limita-se a copiar-se até ao fim.
O que salva Adr1ft? A já mencionada credibilidade científica é um ponto forte. Basta um pouco de conhecimento geral e poderão concluir, por exemplo, que a solução encontrada de usar plantas para gerar oxigénio numa nave em órbita da Terra parece bastante plausível. Pelo menos fica a sensação desse realismo patente, mesmo que estejamos sempre à procura da reviravolta ou de um maior desafio. Não há. Só mesmo uma propulsão mais rápida com o fato, alguns objectos mais perigosos ou saltos maiores pelo espaço. De resto, é sempre a mesma coisa, do princípio ao fim, o que nos dias que correm é sinónimo de um título perfeitamente “esquecível”.
Contudo, não o retirem já da vossa lista de jogos a comprar. Notem que a produção da Three One Zero classifica este jogo como FPX… First Person Experience. Ou seja, uma Experiência na Primeira Pessoa. E isso é mesmo o que entrega. Conforme disse lá mais acima, é capaz de ser isto mesmo que um Astronauta experimenta no espaço, talvez sem a falha catastrófica (felizmente), mas até isso pode acontecer. E o melhor de tudo é que este jogo é irrepreensível a nível visual (esperem até verem o lado nocturno da Terra a flutuar no espaço), mas também a nível sonoro com diversos efeitos atmosféricos e uma banda sonora competente.
Como experiência, é mesmo inesquecível e grandioso. Deve ter havido muita investigação e interesse em reproduzir o que pode acontecer numa estação em órbita, até mesmo com os nódulos de água a flutuar ao nosso redor. Não sei bem se navegar com um fato pressurizado na gravidade zero pode ser tão complexo e ainda não entendi porque não há mais barras para nos segurarmos. Mas esta é a simulação mais próxima do que será a profissão de Astronauta e acredito que seja muito fiel à realidade.
Veredicto
Realismo, credibilidade… nada disso costuma vender jogos se a interacção não for apetecível. Afinal, basta-nos ver um bom filme de ficção científica e já poderemos “sentir” como é viajar no espaço. No entanto, Adr1ft quer ser uma experiência interactiva. E até consegue ser uma boa aventura visual, embora curta e repetitiva. Gostava de ter mais enredo e mais interacção e usar menos garrafas de oxigénio. O facto de ser um jogo lindíssimo com alguns momentos arrebatadores, muita intenção de ser realista ou, pelo menos, plausível, não parece chegar para se tornar um sucesso.
- ProdutoraThree One Zero
- Editora505 Games
- Lançamento15 de Julho 2016
- PlataformasPC, PS4, Xbox One
- GéneroSurvival
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuaçãoEsta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.