Análise – Back 4 Blood
Ser um “sucessor espiritual” de um ícone de um género, é uma tarefa complicada. Os Turtle Rock Studios fizeram algo muito interessante com o primeiro Left 4 Dead, criando uma legião de fãs e… uma multidão de “clones” como efeito secundário. Assim, o nível de exigência para Back 4 Blood era claro. E há sempre a questão se ainda há espaço para mais um jogo com zombies, claro.
Se bem se recordarão, a minha passagem por Back 4 Blood começou há uns tempos, aquando da Beta deste jogo. Na altura, disse que me deu “imensas horas de diversão”, tendo “algumas lógicas que o tornam distinto, sem perder a necessária familiaridade”. É só o que pedimos neste género, algo que o distinga mas que não deixe de ser divertido. Fiquei bem impressionado com o sistema de cartas e também gostei da fluidez de jogo. Sabendo que esta produtora já tinha experimentado um pouco com o falível Evolve, foi bom ver que conseguiu voltar à boa forma. Contudo, essa foi uma Beta claramente manufacturada para testar pontos-chave do jogo, numa dose “light” de conteúdo. Agora sim, temos os “miolos” compostos e integralmente disponíveis para analisar. Carreguem as armas, porque a horda vem aí.
Vou ser sincero: estou farto de jogos para matar zombies aos magotes. Se não forem zombies é qualquer outra ameaça desse tipo, num qualquer género de acção cooperativa contra hordas de inimigos. O último jogo em que investi tempo neste registo foi World War Z e jurei a mim mesmo que não perderia mais tempo a desancar monstros em catadupa. Culpem a série de tv The Walking Dead, culpem os próprios estúdios Turtle Rock pelo primeiro Left 4 Dead, culpem a cultura “politicamente correcta” que nos leva a matar “gente morta”, tivemos já muitos títulos semelhantes nos últimos anos, numa jogabilidade que, sejamos honestos, muda muito pouco. Se só olharmos para este elemento, Back 4 Blood é “só mais um”. Mas, não é bem assim.
Esta fórmula contém uma atracção inegável e que nos faz regressar, projecta vendas e parece dar lucro que justifique que não passe de moda. É como um vício, talvez. Será a natureza mais brutal de cada um a vir ao de cima? Será que queremos ver violência excessiva e visceral mas que não envolva desmembrar (realmente) pessoas? É que, apesar das óbvias semelhanças, olhamos para os zombies como “não humanos” irracionais e, tal como os robots noutros lados, não ficamos de consciência pesada se lhes oferecermos chumbo avulso a alta velocidade. Há também o elemento social, porque jogar este género em companhia é recompensador. Tentar justificar o que me fez investir horas neste Back 4 Blood é complicado. Mas, cá estou eu… outra vez.
Penso que a Beta teve um lado positivo e um lado negativo para este jogo. Por um lado, fez-nos crer que o jogo que aí viria seria interessante mas, por outro, estragou-nos este momento, deixando pouco para descobrir na jogabilidade. De facto, tirando alguns detalhes de polimento e o óbvio conteúdo alargado, o “espírito” do jogo foi explorado até ao limite do que a Beta conferiu. Foram honestos connosco, portanto, dando uma real amostra da jogabilidade para testarmos, algo que não é sequer muito frequente nesta indústria. Não é que seja algo particularmente negativo, porque sempre nos entusiasmou o suficiente para este jogo final. Apenas gostaria que a produção deixasse algum “trunfo” na manga reservado aos “resistentes”.
No rigor, portanto, se leram a minha passagem pela Beta, temos aqui a mesma fórmula de jogo e a minha apreciação não mudou quase nada. Por vezes, senti que este jogo é uma autêntica remasterização de Left 4 Dead, noutras ocasiões notei que a produção faz imenso por se descolar desse rótulo de “pseudo-reedição”. Esse esforço não é em vão, uma vez que resultou em algumas modificações significativas, com novos elementos e adições à acção e, claro, um visual impossível há 12 anos atrás. Para mim, as principais alterações são as novas cartas modificadoras da acção e um sistema de progressão com uma série de pequenas mas importantes adições e lógicas, como o novo esquema de radidade de armas. Pisquem os olhos, e quase não reconhecem Left 4 Dead.
Se jogaram essa clássico de 2008, recordarão com certeza que o jogo convidava a jogar pelo puro elemento de diversão, especialmente se juntassem mais três amigos para concluir uma sessão. Repetia-se bastante, porque não foi concebido para ter uma história progressiva. Aqui a produção “modernizou” a oferta, inspirando-se noutros jogos e géneros para adicionar elementos que convidam a jogar novamente. Agora, além de se divertirem, claro, os jogadores também progridem numa carreira e são recompensados com itens novos a cada conquista, na maioria dos casos itens de cosmética e as tais cartas modificadoras. A ideia é jogar e voltar para jogar mais, nem que seja para obter cartas e ferramentas de destruição únicas.
Estas cartas, na realidade, são engenhosas. Os dois lados da barricada, os humanos chamados Cleaners e os zombies, jogam uma carta modificadora. Uma pode conter um “buff”, outra pode conter uma condição para terminar. Por exemplo, o lado zombie joga uma carta que lhe dá um poder especial para mais capacidade de detecção dos jogadores à horda, enquanto que os humanos jogam uma carta que nos obriga a terminar todos com vida no ponto de extracção. Quanto maior o desafio, mais pontos ganhamos, pelo que saber jogar bem o deck é imperativo. Por outro lado, como devem imaginar, cada partida é única, garantindo imensa variedade. E tanto podemos jogar no lado so “Cleaners” como no lado de um poderoso zombie.
Em troca por essa dedicação a médio/longo prazo, proporcional ao vosso interesse, temos os tais pontos de experiência angariados, que nos permite coleccionar e evoluir as armas. Além disso, também ganhamos moedas de jogo para gastar nas áreas seguras, comprando upgrades e comprimidos de energia. De notar que só podem gastar esta divisa na sessão onde estão, não acumulando para as demais depois da última fase. Na verdade, apenas as cartas de jogo (o deck, portanto), fica convosco. Por isso, não sejam comedidos a gastar essas moedas. Quando nos apercebemos destas mecânicas, estamos definitivamente num jogo diferente, mais a pensar a longo prazo, definitivamente uma oferta diferente do clássico em que se inspira.
Também na jogabilidade há algumas diferenças assinaláveis. Começa pela melhor fidelidade visual e a amplitude de cenários, quantidade de zombies e objectos, além da qualidade dos efeitos visuais, a anos-luz do que se fazia há 12 anos. Mas, no que toca ao “feeling” da interacção, está de volta a acção rápida, baseada em reacções tácticas, sempre a disparar para cobertura, enquanto nos movemos em grupo e fazemos exploração de sectores. Há várias missões diferentes em cada sessão, como salvar outros sobreviventes, encontrar itens perdidos, destruir ninhos de zombies, entre outras tarefas mais ou menos complicadas. De um modo geral, tudo é familiar, mesmo que a produção tente sempre ampliar a escala e dar-lhe um certo “twist”.
Como já deu para notar, este jogo é muito focado no online e dificilmente será tão divertido a solo. A inteligência artificial até é bastante competente mas não tive a mesma experiência ao jogar sozinho. Aliás, deu-me a entender que jogar a solo foi uma “ideia de última hora”, uma vez que a progressão a solo está isolada dos modos online. Ou seja, podem jogar a solo, com companheiros da IA mas, por qualquer motivo, a produção achou por bem não recebermos pontos de evolução, o que impede comprar cartas modificadoras no modo online. Aliás, a solo as cartas são distintas, o que torna este modo completamente irrelevante. É que nem sequer ganhamos troféus/achievements por objectivos traçados em jogo e as sessões não contam para estatísticas. Até que a produção decida melhorá-lo, só serve para treinar algumas lógicas e pouco mais.
Por último, uma nota para a performance técnica do jogo. Back 4 Blood, como já disse, é uma evolução clara do que a produtora já vez em termos visuais. Foi dada prioridade na optimização, pelo que muita da modelação e carga gráfica foi pensada para trabalhar constantemente numa resolução de 4K a 60FPS na versão em que analisei o jogo (PlayStation 5). Não notei grandes quebras de performance e tudo “roda” com rapidez, também fruto do hardware da consola. Gostava apenas que a integração no DualSense fosse um pouco melhor mas nada que interfira na acção em si. De um modo geral, é um jogo tecnicamente bem concebido, com poucos bugs que mereçam alguma distinção. Nesta fase de acesso antecipado antes do lançamento, notei apenas algumas falhas de sincronismo online mas é algo que certamente será aprimorado nos próximos dias.
Veredicto
Merece mesmo que não o tenhamos como uma simples “reedição” de um jogo antigo, especialmente dada a saturação deste género. Contudo, é inevitável que concluamos que Back 4 Blood é mesmo a “reincarnação” moderna de Left 4 Dead. Os Turtle Rock Studios fizeram questão de tentar dar-lhe uma identidade única mas isso não significa que se torne assim tão distinto. Consegue-o apenas quando tenta prolongar a sua longevidade, tornando-se maior e com mais para fazer. O sistema de cartas de jogo é realmente um golpe de génio para dar variedade, sem interferir na jogabilidade que está igualmente divertida. Só não o joguem a solo porque a produção não perdeu muito tempo com esse modo. Até porque este jogo foi criado para quatro jogadores. Pista: olhem para o título…
- ProdutoraTurtle Rock Studios
- EditoraWarner Bros.
- Lançamento12 de Outubro 2021
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One X, Xbox Series X|S
- GéneroAcção
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Volta à boa forma dos Turtle Rock Studios
- Algumas boas ideias, como as cartas modificadoras
- Muita diversão, com muito ADN "Left 4 Dead"
- Modo a solo isolado do resto do jogo
- Repetição demora, mas acaba por aparecer
- Género muito saturado
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.