Análise – Call of Duty: Modern Warfare III
Indiscutivelmente, a oferta de qualquer Call of Duty moderno divide-se em quatro partes: A campanha a solo, um modo cooperativo, um modo competitivo e uma contribuição para Warzone. Call of Duty: Modern Warfare III faz tudo isso, mas…
Todos temos um modo preferido de jogo nesta franquia. E é normal que sejam os frenéticos modos competitivos ou a acção “battle royale” de Warzone. Dificilmente a campanha a solo ou os zombies serão o motivo para gostarem de jogar Call of Duty, mas haverão, obviamente, adeptos destes modos. O que não é discutível, porém, é que comprar um destes jogos a cada ano exige uma óbvia justificação. Nos últimos tempos, pelo menos a sub-série Modern Warfare deu óptimos motivos para o fazer. Os dois primeiros títulos foram enormes sucessos nas suas quatro porções de oferta, até mesmo as porções menos populares da franquia. As campanhas foram entusiasmantes, o modo cooperativo, embora menos concorrido, trouxe desafio, os modos competitivos foram bem disputados e, claro, Warzone tornou-se no cerne da oferta desta marca de sucesso. Veio esta terceira entrada na série e só queríamos a mesma oferta para justificar o investimento… certo?
Se nos seguem regularmente, sabem que o jogo foi alvo de sérias críticas, mesmo antes do lançamento. Em causa estavam acusações de um lançamento apressado, tornado “evidente” por uma campanha curta e algumas decisões mais controversas no seu design. Isto aconteceu durante o acesso antecipado, em que quem pré-comprou o jogo pôde jogar toda a campanha livremente. Contudo, durante o fim de semana, os jogadores continuaram a manifestar o seu desagrado, dando voz a outras preocupações durante a promoção pré-jogo, como o facto dos modos competitivos usarem mapas “reciclados” de títulos anteriores e de ter um modo cooperativo com zombies que, honestamente, também eu já não consigo apreciar.
Obviamente, não posso simplesmente ouvir estes comentários e ignorá-los. Mas, também não posso entrar no jogo com algum preconceito. Por esse motivo, como acontece em todos os jogos desta série, mantive o meu entusiasmo para voltar a este excelente conteúdo sazonal mas com as devidas expectativas moderadas. É que este não é o meu primeiro novo Call of Duty. Também tenho noção que esta não é uma produção da Infinity Ward, tendo boa memória do que a Sledgehammer Games fez no passado. Ou seja, inicio este jogo com um misto de vontade que seja um bom pedaço de entretenimento, ao mesmo tempo que espero “mais do mesmo”, agora numa versão que já esperava ser algo apressada. Mas, não assim tanto.
Se foi verdade que a Sledgehammer teve apenas 18 meses para conceber este jogo (com o devido apoio das demais produtoras da franquia sob alçada da Activision), isso nota-se particularmente na sua campanha. Por causa do que li por aí, que houve quem acabasse toda a campanha em cerca de 3 horas totais, decidi iniciar esta campanha no modo mais difícil de dificuldade. A ideia não era “aumentar artificialmente” a duração da campanha, porque bem sei que os inimigos seriam “esponjas de balas” com uma mira demasiado infalível. O que queria, isso sim, era estender o mais possível a experiência e não passar tudo a correr. Porque, de facto, 3 horas é muito escasso para apreciarmos qualquer produção, muito mais com o que temos sido habituados.
A grande “muleta” narrativa desta história é Vladimir Makarov, um dos maiores vilões de sempre de Call of Duty, habilmente criado para o primeiro Modern Warfare 2 (2009), eliminado com uma missão épica em Modern Warfare 3 (2011) e que é antecipado no final do enredo da campanha principal de Modern Warfare II (2022). Para quem não o conhece, Makarov é o génio maquiavélico que é introduzido na infame missão “No Russian” onde aniquila centenas de civis no aeroporto de Moscovo, uma missão que levou o jogo a ser banido em vários países. Makarov é como que um vírus que se infiltra no mundo criminoso e terrorista em jogo, gerando o “antídoto” que é a Task Force 141 do Capitão Price e companhia.
Sem querer falar muito do enredo si, a Sledgehammer tentou (outra vez) reescrever a história de uma personagem principal do lore. Como o fez com Price, “Soap” ou “Ghost”, como o fez também com o infame General Shepard que tanto gostámos de enfrentar no final de Modern Warfare 2 (2009). Aqui, Makarov continua a ser o mesmo tipo de herói cerebral que conhecemos, apenas a sua introdução é muito diferente, assim como a nova trama é como um “recontar” dos seus planos gerais. Entendo que haja aqui um intuito de trazer algo novo, com coisas familiares mas não totalmente iguais. Nesse aspecto, a história de Makarov é empolgante, muito embora, infelizmente, acabe com o cliché do “cliff-hanger” pouco desejado.
O problema da campanha é que quase tudo é contado a correr e sem grande profundidade. Temos alguns desenvolvimentos na história contados através daquelas fantásticas cenas intermédias dignas de Hollywood, com excelentes prestações do elenco de actores e momentos verdadeiramente brilhantes da trama. Mas, muitos destes desenvolvimentos serão também contados… via rádio, entre as várias comunicações entre membros. Há uma regra que sempre gostei nesta e noutras séries de jogos reputadas, que é a de “mostrar e não contar”. Aqui, parece que se reverteu um pouco a coisa, contando mais o que aconteceu, ao invés de realmente mostrar esses eventos.
Por outro lado, nem todas as missões desta campanha são bem construídas. É discutível se as missões perfeitamente lineares das campanhas anteriores são suficientemente empolgantes, já que muitas foram demasiado orquestradas ou focadas nos seus objectivos fixos. Gostos à parte, aqui temos o mesmo tipo de missões focadas, sim, mas infelizmente, não são todas assim. Algumas possuem um carácter de “mundo semi-aberto” para serem concluídas, uma novidade que, honestamente, me deu saudades da tal coreografia. É óbvio que os jogadores escolherão os caminhos mais rápidos, por isso, criando missões que podemos terminar em poucos minutos. Não é de admirar que consigamos concluir numas 4 horas.
Esta não é uma daquelas fantásticas campanhas cinematográficas de Call of Duty. Isto é… Warzone… Sim, é mesmo isso. É uma missão de Warzone só com “bots”, onde até apanhamos armas e equipamento pelo mapa, através de caixas lançadas de pára-quedas. A única diferença é que não temos outros a jogadores a interferir com a nossa acção. Isto, para mim, é francamente redutor do que uma campanha pode trazer e faz-me pensar no tal pouco tempo que a Sledgehammer teve para criar algo significativo. É que se removêssemos estas missões “Warzone” glorificadas, adicionadas para “encher”, a real campanha mais linear tradicional era ainda menor em duração.
Então, lá andei eu no modo mais elevado de dificuldade a “esticar” o mais possível o meu tempo em jogo. E, de facto, há aqui conteúdo de excelente qualidade e possível impacto. Uma das missões “lineares” leva-nos a uma revisão do contexto da infame missão “No Russian”. Ao invés de jogarmos no ponto de vista dos terroristas a matar civis, pelo contrário, entramos com a Task Force 141 numa final de um jogo de futebol, cheio de adeptos a fugir do perigo. O nosso objectivo é eliminar os terroristas e prender Makarov, evitando os civis. Há aqui um momento de redenção para a série, numa missão com notório cuidado e detalhe. Não sei se terá o mesmo impacto que “No Russian” mas é um sinal de esforço da produtora.
Todavia, há também missões desnecessariamente grandes, especialmente as tais de mundo semi-aberto. Numa delas, temos de desactivar quatro bombas, duas em locais confinados, uma debaixo de água e outra montada num veículo. Mesmo no modo mais difícil, só demorei mais tempo porque tive de percorrer uma vasta distância, sendo possível desactivar as bombas com o mínimo de tiros, especialmente com tiro furtivo e usando a água para transitar entre secções. Numa segunda passagem, consegui fazer tudo isto ainda mais rápido já sabendo onde estavam as bombas. A dimensão do mapa é a verdadeira dificuldade que, sem coreografia, usando paraquedas e o gancho com corda, torna-se só um empecilho.
De um modo geral, de facto, esta campanha não deixa grandes memórias, não tem uma mensagem muito vincada. Até porque, se só jogaram as campanhas desta franquia, ficarão com muitas mais dúvidas sobre a validade das histórias dos dois primeiros Modern Warfare, com regressos pouco explicados de personagens (terão de jogar as épocas dos modos online para entenderem). O próprio Makarov, inicialmente tão carismático, pouco aparece realmente, tornando-se um espectro na trama total, para dar lugar a uma vilificação algo batida do terrorismo global, envolvendo muitos clichés.
Por outro lado, fica no ar uma sensação que o argumento foi escrito à pressa, com desenvolvimentos sem profundidade ou sem grandes explicações, tendo alguns diálogos um tanto toscos. Também há muita justaposição e só posso imaginar os talentosos actores a sentirem-se menosprezados por algumas frases que proferem. Enfim, se calhar por esta altura já estava saturado desta campanha com missões “coladas” numa sequência fastidiosa, com quase tudo explicado por diálogos via rádio. Até é bom que a campanha seja curta, porque assim colocamo-la de lado rapidamente para “atacar” o resto da oferta.
Antes passar ao “tutano” da oferta, que são os modos online competitivos, temos de forçosamente falar do modo zombies. E… bem, o salto qualitativo para este outro modo menos popular, também não é muito maior. Quem gosta deste modo de jogo cooperativo já imagina o que estará à sua espera em mais uma entrada na já longa série de histórias que a Treyarch tenta contar com os monstros desmiolados. Contudo, há uma nuance. Também aqui há alguma falta de originalidade a tentar mudar paradigmas, já que este é, para todos os efeitos, o já conhecido modo DMZ… mas com zombies. A sério, ame-se ou odeie-se, o modo DMZ foi uma das inovações mais recentes de Warzone. Aqui foi literalmente colada uma “skin” com zombies.
Temos um mapa gigante, várias equipas e o objectivo de sobreviver. A diferença é que as equipas não estão aqui para angariar recursos, apenas desancar zombies às centenas. Até o mapa é o mesmo de Warzone, perdendo-se aqueles mapas clássicos confinados que foram criados em modos anteriores de Zombies. Não, não funciona nada bem em mundo aberto, dando-nos pouca vontade de matar os zombies e simplesmente evitá-los. Mesmo que a fórmula clássica seja repetitiva (e é), mesmo esteja já muito desgastada (e está), fazer este projecto de “colagem” de dois modos num só, depois do que foi tentado também na carreira a solo, não me deixou nenhuma vontade de voltar a jogar. É uma formalidade, talvez porque o tempo faltou para um novo modo Spec Ops.
Agora sim, os modos competitivos. Felizmente, para mim e para muitos que preferem este modo de jogo ao restante da oferta, a jogabilidade é capaz de ser das melhores tivemos nos últimos tempos. OK! Não deverá agradar a todos, especialmente os que preferiam ter algo semelhante ao ano passado mas os veteranos terão outra avaliação. A Sledgehammer foi ao “baú de paradigmas” da série Call of Duty e foi buscar duas funcionalidades que se perderam no tempo, o cancelamento de recarregamento da arma e o cancelamento dos deslizes. Também decidiu aumentar o tempo para matar (Time to Kill) e o ritmo geral de todas as animações. Ou seja, apertem o cinto, porque o “run’n’gun” está de volta.
Poderão achar um retrocesso, estou certo que muitos acharão que é mas esta foi uma “imagem de marca” na série durante anos, brevemente quebrada por uma visão mais “realista” que a Infinity Ward quis passar nos dois títulos Modrn Warfare. Pura ilusão. Ninguém realmente quer “realismo” em Call of Duty, toda a gente quer aquela acção frenética e tão rápida que tivemos nos jogos clássicos. Poder cancelar um carregamento a meio para disparar contra um adversário que nos surpreendeu, ou cancelar um deslize pelos mesmos motivos, necessitar de disparar mais balas para abater adversários, ao mesmo tempo que tudo o que fazemos é mais rápido, sinceramente, fez-me recuperar o meu apreço pela jogabilidade desta franquia.
Tudo bem, na maioria dos casos, terão uma notória reciclagem de mapas dos jogos anteriores, obviamente revitalizados graças ao motor gráfico que proporciona técnicas de modelação e texturas mais modernas. É um claro apelo à nostalgia, com mapas como “Rust” de Modern Warfare 2 (2009) a trazerem óptimas memória de muitas horas a jogar 1vs1 neste curto espaço. Se mais nada fizer, é uma óptima viagem ao passado, agora com um “filtro” moderno. O que, juntamente com a já mencionada jogabilidade mais “clássica”, parece quase trazer COD aos seus tempos áureos. Não é um remake de MW2 mas quase, quase parece.
Ainda assim, não posso deixar de assinalar que não há aqui um único mapa novo para adicionar à oferta. O que é, de facto, mais uma demonstração de uma pressa em trazer este jogo cá para fora. Tudo bem, não são cópias directas dos mapas ou algum port para o motor gráfico moderno. São recriações, deram trabalho a recriar e até sofreram alguns ajustes para os tornar compatíveis com algumas lógicas e técnicas modernas. Mas, não deixa de soar a algo relativamente simplista, para não dizer algo “preguiçoso” para criar um novo jogo com uma audiência tão vasta. A comunidade veterana agradece mas já vimos isto antes.
Outro elemento meio preguiçoso da produção, talvez não seja bem culpa da Sledgehammer. Não temos nenhum novo modo de jogo, tendo apenas como diferença deste o jogo do ano passado, o modo War que nos lança numa jogabilidade faseada, algo no tipo Overwatch (que provavelmente ninguém pediu), apenas num único mapa que se torna repetitivo ao fim de umas poucas sessões. Talvez tivéssemos chegado a uma era em que criar um modo de jogo realmente novo se torne complicado, até porque já se experimentou de tudo um pouco. Mesmo assim, há aqui uma sensação inevitável de “dejá vú”. Mesmo que a maioria jogue mais Team Deathmatch que outra coisa, há que entusiasmar para justificar uma nova carreira online.
Infelizmente, talvez demore algum tempo até que a Activision se aperceba do poucos favores que estas decisões fazem à franquia. Isto, porque, claramente, estava mais atenta ao lucro provável que poderia receber com mais um jogo novo. É perfeitamente discutível se os Modern Warfare são os mais populares da marca, há quem jure que a sub-série Black Ops foi a mais disputada. O que não é nada discutível é que estes três jogos estão claramente entre o mais lucráveis. E é por isso que nesta nova entrada temos de conviver com uma nova era do infame Call of Duty HQ. Não, não é só um launcher mais robusto como é dado a entender, é o ápice de uma complicação que não precisávamos.
Basicamente, o interface de jogo deste Modern Warfare III complicou-se muito, muito mais que nos jogos anteriores onde também já não era um bom exemplo de interacção intuitiva. Para começar, implica um espaço incrivelmente exagerado em disco para instalar todos os modos disponíveis e, se não tiverem cuidado com o que escolhem, ainda instalam também Modern Warfare II e até Warzone 2.0, um jogo que, para todos os efeitos, é um “stand-alone” que não deveria fazer parte da oferta original. Mas, pior que a dimensão exagerada é esta constante publicidade a micro-transacções com que somos bombardeados constantemente.
Agora, poderão dizer “mas foi sempre assim, certo?” Sim, de facto, o grande chamariz destes jogos do ponto de vista comercial foram sempre as suas centenas de pacotes de skins de equipamento e armas de compra opcional, que os jogadores mais ávidos querem sempre adquirir para mostrar aos demais. Todavia, enquanto que em jogos anteriores tudo era meio guardado nas secções próprias, agora é trazido para a frente, numa constante recordação que, por vezes, soa a impingimento. Nada disto chocará ninguém, o problema é que torna a navegação em jogo muito mais complexa. Pior, de cada vez que querem mudar de modo, terão de reiniciar o jogo em si. Não consigo ver quem é que achou isto prático, sinceramente.
Veredicto
O que poderia ser uma parte de uma trilogia de sucesso, acabou por ser uma “repetição para ênfase”. Já sabíamos que Call of Duty: Modern Warfare III tinha sido algo apressado, já sabíamos que os seu mapas seriam reciclados. Mas, não esperávamos que esta série de sucesso chegasse a este ponto, claramente a tentar facturar o mais possível com algo já visto, ao mesmo tempo que não quer minimamente correr grandes riscos, esperando que a reacção seja exactamente a mesma. O que é pena, porque a jogabilidade online é claramente beneficiada pela sua revisão mais clássica na velocidade e lógicas. Assim sendo, justifica-se apenas pelo viciante online, mesmo que só tenha mapas “reciclados”. Não chega para justificar o preço do investimento, muito menos “atrelado” a um Call of Duty HQ que não tem razão de existir.
- ProdutoraSledgehammer Games
- EditoraActivision
- Lançamento10 de Novembro 2023
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox Series X|S
- GéneroAcção, Shooter
Podia ser melhor mas tem alguns pormenores positivos que podem agradar a muitos jogadores.
Mais sobre a nossa pontuação- Jogabilidade dos modos competitivos
- Regressar aos mapas clássicos de MW2
- Alguns (poucos) momentos do modo de história
- Campanha curta e desinspirada
- Modo Zombies esquecível
- Dimensão da instalação total
- Call of Duty HQ
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.