Análise – Call of Duty: Vanguard
A oferta de três frentes de Call of Duty está de regresso. Por vezes, basta dizer isto e temos garantido um bom jogo para nos divertir nos próximos meses. Com Call of Duty: Vanguard, porém, há uma certa aura de conservadorismo que não faz grandes favores, nem ao jogo, nem à própria franquia.
Não é fácil reinventar uma receita a cada ano, mesmo com vários estúdios que pegam na franquia de capítulo em capítulo. Esta rotação está nas mãos da Sledgehammer Games que, uma vez mais, regressa à Segunda Guerra Mundial, sendo parte do ciclo temático onde também se inclui a guerra moderna de Modern Warfare e a guerra fria de Black Ops. O tema pode, de facto, mudar a cada ano, assim como o estúdio. Mas, a base de CoD é comum. Os três modos de jogo oferecem o mesmo (carreira, multi-jogador competitivo e cooperativo com zombies), com Warzone a fazer a ponte entre os vários jogos. O novo launcher não deixa dúvidas desta fórmula partilhada. Os três jogos possuem o mesmo ADN, apenas a “cara” foi lavada. O que tem tanto de positivo, como de negativo, como irão ver.
Quando temos três frentes que não queremos mudar muito, invariavelmente acaba sempre por haver necessidade de alterar qualquer coisa a bem do refrescamento. Ou seja, por mais conservadora que seja esta franquia, para que não caiam no erro da repetição, é preciso mexer nos ingredientes. O que nem sempre funciona muito bem para a oferta geral, como bem sabemos. Modern Warfare foi para mim uma muito necessária “pedra no charco” para a franquia, na altura a braços com alguma banalidade. Black Ops – Cold War foi igualmente um jogo sólido criando uma identidade muito própria. Vanguard só tinha de continuar nesse caminho trilhado.
É preciso notar, porém, que a Sledgehammer é a produtora com menos sucessos na franquia. Não me entendam mal, adorei Call of Duty: WWII, sem dúvida os dos títulos mais sonantes da franquia. Mas, nada me faz esquecer a sensação agridoce de Call of Duty: Advanced Warfare. Desde que entrou no rol de estúdios dedicados a Call of Duty, aliás, a Sledgehammer tem feito mais trabalho de suporte com os demais estúdios que outra coisa. E isso nota-se bem nos seus produtos finais. Embora também este seja um jogo resultante da colaboração de vários estúdios, fica bem patente alguma prudência na sua concepção.
Esta realidade é particularmente notória no desnível de produção e qualidade entre os três modos de jogo. Diria que, dos três modos, um deles é a maior vítima do conservadorismo latente que já mencionei, que é o modo de carreira. O outro modo menos interessante é o cooperativo com zombies. Como irão ver, achei-o simplesmente desinspirado. Não significa que sejam maus modos de jogo, que não divirtam na sua oferta básica ou que não tenham certos elementos de interesse e que certamente atrairão os jogadores. Simplesmente já tivemos melhor oferta em ambos os casos. Mas, já me estou a adiantar. Vamos, como sempre, por partes.
No que toca ao modo de carreira a solo, temos mais uma história bem composta de um punhado de heróis improváveis que, na história do jogo, são a origem das futuras Operações Especiais. Com tácticas de infiltração e de guerrilha, cada herói junta-se para combater a ameaça Nazi, bem no seu centro político, em plena Alemanha. Embora Hitler tenha falecido, o “quarto Reich” pode ser uma realidade, uma vez que há planos para erguer um novo chanceler. O enredo é contado lentamente, com o grupo a ser capturado à sua chegada a Hamburgo. Contudo, nem tudo é o que parece. Se calhar serem presos pela infame Waffen SS até faz parte dos planos.
Durante o modo de carreira, além deste enredo principal, vamos também regressar ao passado para conhecer a história pessoal de cada um dos heróis Kingsley, Petrova, Riggs e Jackson. Gostei bastante de todas as secções, desde uma patrulha de paraquedistas no “Dia D” com a tarefa heróica de destruir baterias marítimas nazis, até uma missão de fuga e combate furtivo na lendária Estalinegrado em estado de sítio. Além de nos darem um vislumbre das personalidades vincadas e motivações de cada elemento, são também excelentes “quebras de ritmo”, dando-nos outro tipo de jogabilidade a cada capítulo.
Claro que tudo é contado com um rigor narrativo e técnico arrebatador. Destaque para o excelente casting de actores, com um evidente ponto positivo para o actor Dominic Monaghan (Lord of the Rings, Lost) no papel de um improvável agente de inteligência das SS, Jannick Richter. Embora o desfecho deste argumento seja francamente previsível e tente, de alguma forma, alterar um pouco o rumo da História, baseia-se em alguns factos reais, criando uma narrativa credível e empolgante. A haver algo a apontar, somente algumas missões mais aborrecidas que “desaceleram” a passada.
Considero esta campanha, como já disse, muito conservadora. Faltam um pouco da experimentação dos jogos anteriores, também lhe falta a ambiguidade e rumos distintos que, em particular, o último Cold War nos trouxe. A sua linearidade podia ser compensada com momentos mais memorávei mas fica-se por alguns clichés e bastantes momentos em que pedíamos mais da acção. Basicamente, transitamos de arena em arena para desancar inimigos usando as habilidades únicas de cada herói. No fundo, o que esperamos destas campanhas. O caminho entre estes sectores é que podia ser um pouco mais ambicioso. Cumpre a ” checklist” e pronto.
O que também cumpre a “checklist” mas de uma forma completamente desinspirada, é o modo cooperativo com zombies. Desenhado pela Treyarch, seria de esperar uma continuação da vasta oferta deste modo em Cold War. Mas, não foi isso que aconteceu. A lógica de mundo aberto com missões localizadas foi posta de lado, para criar algo que é tão linear, que nos lembra os primeiros zombies de “World At War”. Começamos numa zona confinada e vamos “abrindo” caminho cumprindo objectos. Consigo ver aqui um intuito de criar algo “roguelike”, com uns zombies mais robustos a agir como bosses pelo meio, mas fica-se pelo intuito.
Este modo é bem mais virado para o sobrenatural, angariando poderes especiais para desancar ainda mais zombies. Também é bastante mais rápido, obrigando a muitos momentos “run-n-gun” em muitas secções frenéticas. Há mini-jogos pelo meio, como a escolta de objectos mágicos e outras ideias já vistas noutros lados. Divertido, é com certeza. A evolução da personagem faz-nos querer jogar mais e desbloquear mais armas e equipamento. Mas, é inevitável notar que tudo é mais confinado, mais genérico e não se tenta aqui fazer nada de novo. De facto, pergunto-me se este é ainda um modo assim tão popular para se repetir tanto e ainda reunir interesse. Sem algo realmente novo, é complicado justificá-lo.
Felizmente, temos sempre o modo competitivo multi-jogador. Online, este é o Call of Duty que todos os anos esperam. A revolução que foi Modern Warfare neste modo é também a base inspiradora para este jogo, herdando quase todas as ideias desse jogo e também de Cold War. De facto, estamos a jogar “o mesmo jogo, com outra cara”, mas ninguém se importa com isso se a jogabilidade é tão positiva. E não apenas a jogabilidade merece destaque, também a personalização de armas via Gunsmith é do melhor que se faz por aí. De um modo geral, é provável que comprem este jogo a pensar no online e, devo dizer, não ficarão desapontados se for esse o caso.
O maior destaque desta edição é a nova opção Combat Pacing. Basicamente, permite personalizar alguns aspectos da jogabilidade, como o número de jogadores e tipo de jogo (Kill Confirmed, Domination, etc). Em Blitz, entramos em sessões mais rápidas, que favorecem caçadeiras e reacções rápidas. Tactical coloca-nos em sessões mais longas, a apostar em fazer mira à distância. Assault é o modo mais clássico que favorece um misto entre os dois tipos. No rigor, é como um atalho rápido para personalizar a experiência de jogo com um ou dois cliques. Favorece bem quem procura aquela “dose certa” de modos de jogo. Longe vai o tempo em que só escolhíamos um modo de jogo até à exaustão.
Vanguard também estreia dois novos modos de jogo. Champion Hill é o grande destaque, oferecendo uma espécie de evolução do lendário modo Gunfight e onde várias equipas lutam no que poderia definir como um torneio em pequena escala. É bastante divertido, embora considere mais adequado para equipas organizadas que para grupos de casuais. Patrol também é um novo modo, inspirado no clássico Hardpoint mas, neste caso, o ponto de conquista ou de protecção move-se pelo mapa. Nenhum destes modos é realmente novo, já os vimos com outros nomes em outros jogos. Contudo, parecem-me bem implementados em Vanguard.
Para concluir, vamos falar do elemento técnico. Tive a oportunidade de testar este jogo no seu dia de arranque numa PlayStation 5. Devo dizer, logo à partida, que o jogo é deslumbrante, com alguns momentos ricos em conteúdo de arregalar o olho, transversal aos três modos de jogo. Era impossível um novo Call of Duty não ser um deslumbre técnico nesta geração de consolas ou com o hardware mais recente no PC. Graças aos efeitos visuais e de iluminação, em conjunto com os planos bastante cinematográficos, dão-nos momentos dignos das melhores películas de Hollywood. Como sempre acontece, certo?
Contudo, devo dizer que algumas opções técnicas devem ser desligadas no menu. Falo do efeito de profundidade de campo ou do “blur” de movimento. Não beneficiam em nada o visual do jogo e, pior, podem mesmo prejudicar a performance online. Também devem desligar uma opção de descarregar texturas de alta-definição “on demand”, uma vez que notei que “rouba” um pouco da largura de banda quando está activa. Enfim, são apenas alguns “soluços” que parecem premiar mais o visual, mas não foram pensados para o aspecto competitivo. Ficam avisados, especialmente se notarem “lag” ou um tempo de resposta inconstante.
Veredicto
Com três ofertas tão diferentes, Call of Duty: Vanguard devia também ter três diferentes avaliações. Por um lado, é uma proeza técnica de grande qualidade, por outro, peca por uma oferta desequilibrada nas suas três frentes. Com um modo de carreira algo “insosso” e um modo cooperativo com zombies a precisar de se reencontrar, resta-nos o online competitivo que continua a ser do melhor que irão encontrar neste género. Infelizmente, isso pode não apelar a todo o tipo de jogadores mas é, sem dúvida, uma “jogada no seguro” para a produção.
- ProdutoraSledgehammer Games
- EditoraActivision
- Lançamento5 de Novembro 2021
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
- GéneroAcção, FPS
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Visual deslumbrante
- Prestação dos actores no modo de carreira
- Multi-jogador continua fantástico
- Modo de carreira a solo não surpreende
- Modo cooperativo com zombies desapontante
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.