Crysis (9)

Análise – Crysis Remastered

Há uns anos atrás, mais precisamente em 2007, um tal de Crysis foi lançado pela Crytek. Poderia ser apenas mais um “shooter” de acção, com imensos clichés dentro deste género, mas tinhas algo que o diferenciava dos demais: uma enorme ambição da sua produtora em criar algo inédito e… exigente. 13 anos depois, regressa como Crysis Remastered.

Com a nova versão do motor-gráfico CryEngine 2, a Crytek puxou pelo hardware dos PCs em 2007, quase, quase no limite. Pode ser mito urbano (se calhar é), mas houve mesmo quem falasse de PCs a sobreaquecer, se os jogadores tentassem correr o jogo na qualidade máxima. O meme “Can it run Crysis?” nasceu daí, qual “benchmark” improvisado. Crysis também implementou imensos pormenores interessantes na acção, alguns fruto da experiência da Crytek no primeiro “Far Cry”. A história era relativamente interessante e, bom, pode dizer-se que marcou uma geração, bem além dos tais memes de PCs a arder. Esta remasterização tem uma curiosa abordagem. Nas palavras de James Franco no filme “The Interview”: este regresso é “same-same, but different.. But still same!”

Como quase sempre acontece nas remasterizações e remakes, porém, há certos títulos que, por serem tão icónicos, desapontam no seu regresso. Nem tanto porque são maus jogos ou porque o trabalho de restauro não é bem feito. Tem mais a ver com a forma como o jogo foi gravado na nossa memória. Apesar de o meu PC em 2007 não conseguir aguentar Crysis na sua plenitude visual, recordava-o com saudade por ser um bom título de acção e por ter algumas notas interessantes de “poderes” especiais dados pelos nano-fatos. Tive oportunidade de o jogar de novo na PS3 (2011) e gostei bastante as sequelas Crysis 2 (também em 2011) e Crysis 3 (2013). Tinha-o como um “must play” da geração anterior à actual, pelo que um potencial regresso era algo que via com bons olhos.

Mas, não propriamente como uma remasterização. Talvez um Crysis 4 ou um spin-off ou algo que pudesse recuperar o ADN da série, sem necessariamente manter a base de tudo intacta. É que Crysis é um jogo de 2007, uma altura em que os jogos eram algo diferente e esse título veio revolucionar muita coisa. Contudo, em 2020, Crysis Remastered não vem revolucionar quase nada. Perguntarão: “e depois?” Bom, os jogos evoluíram muito, sobretudo os shooters e já não se aceitam algumas convenções da altura. Como recuperação de um ícone, uma remasterização do visual faz maravilhas, de facto. Mas aquilo que mais gostei no jogo há cerca de 13 anos, a sua jogabilidade, já não tem o mesmo impacto. Mas, já me estou a adiantar, claramente.

A “joint venture” entre a (agora) editora Crytek e a Saber Interactive, foi uma interessante junção de talento., que fazia antever um bom regresso. Contudo, desde cedo fiquei apreensivo com a palavra “remastered”. Já vou falar mais do visual, mas não é bem esse o problema do jogo. Polir um título visualmente é já um processo relativamente “banal”. Notem, não estou a dizer que é fácil fazê-lo, ainda por cima adicionando tecnologias de ponta, como o Ray Tracing ou alguns efeitos visuais de deslumbrar. Apenas digo que já não será a primeira remasterização a receber visuais deslumbrantes. E, também como sempre digo, não é só isso que conta… mas é mesmo isso que se destaca sempre.

Quando falamos de “shooters” ou qualquer título de acção, há mecânicas que evoluem com o género. Mecânicas, essas, que nos fazem tornar cada vez mais exigentes no que toca à interacção. Pelos motivos óbvios, diga-se, já que cada novo jogo de acção parece dar importantes passos na direcção do realismo dos tiroteios, dos movimentos ou das interacções com o meio. Ora, Crysis foi lançado numa altura em que os jogos começavam a dar os primeiros passos na direcção desse realismo. E este jogo impressionava bastante graças à inclusão de veículos, armas pesadas, cenário destrutível e, claro, o nano-fato e a sua capacidade de saltar mais alto, correr mais rápido, ficar invisível ou dar um escudo especial ao protagonista.

No que toca ao enredo, o jogo era também impressionante por apostar numa narrativa de intriga, uma história que acaba por ser um tanto previsível, mas que nos dava algo que realmente queríamos investigar. Uma vez mais, diria que houve alguma influência do primeiro Far Cry neste enredo, pelo menos na sua essência mais “fantástica”. Recordemos a história:

Um grupo de comandos da Delta Force, nome de código Nomad, Psycho, Prophet, Jester e Aztec são enviados para a ilha de Lingshan. A missão é investigar um pedido de ajuda de uma arqueologista que afirma que descobriu algo poderoso. Ah! E os Norte-Coreanos estão a invadir este local paradisíaco. A histórica demora um pouco a desenrolar, mas a missão de salvamento torna-se rapidamente numa de sobrevivência. E a ameaça não vem só de Pyongyang… há algo do outro mundo nesta ilha.

Eventualmente, o enredo leva-nos para uma intriga tripartida, entre as intenções do governo dos EUA, uma agenda sombria dos norte-coreanos e, claro, os extraterrestres Ceph. Pelas razões óbvias, não vou relevar mais deste enredo. Apenas digo que até merece ser desvendado, mesmo que tenhamos tantos clichés e muitas cenas intermédias cheias de explosões que agradariam a Michael Bay e companhia.

Estes dois trunfos do jogo original, porém, acusam o peso da idade nesta remasterização. A jogabilidade podia ser interessante e inovadora em 2007, mas agora torna-se enfadonha muito rapidamente. Usar os poderes dos nano-fatos é ainda uma excelente modificação da acção, mas os cool-downs já não são assim muito justificáveis. Lembro-me que Crysis 2 e 3 alteraram ligeiramente estas lógicas (para melhor, se bem me lembro) mas nesta reedição a Saber preferiu uma réplica fiel do jogo original. Uma réplica que, nos dias de hoje, precisava de uma reforma. Por outro lado, os movimentos e interacções de Nomad são algo sintéticos, com muitas acções demasiado lineares, sem o devido “peso” e o tal realismo que os jogos modernos nos habituaram.

Também a história sofre um pouco, com cenas intermédias e diálogos que acusam o peso da idade, sobretudo nos planos usados e nas prestações dos actores. Aqui, entendo que a produção tivesse de trabalhar com o material original. E entendo que, apesar de tudo, a trama até encaixa bem no género de “tiros”, com pouca coisa para “mexer o miolo” e uma ou outra reviravolta um tanto previsível. Em muitas ocasiões os diálogos são “enchimento” enquanto tentamos chegar a um ponto verde ou amarelo no mapa. Já conhecem a forma como analiso os jogos e já devem ter percebido que dou imenso valor ao enredo e diálogos. Em 2007 adorei cada momento, em 2020 nem tanto.

E é claro que tenho de falar do visual. E sim, o jogo até possui um modo “Can it run Crysis?” no PC para gozar com o seu legado. Com tudo ligado, inclusive o tal Ray Tracing e outros efeitos visuais de ponta, o jogo está realmente melhor que nunca. Pelo menos no PC. Não fossem algumas animações toscas ou alguns efeitos menos polidos e passaria facilmente por um título moderno. Infelizmente, acho apenas que a Saber introduziu todos os efeitos possíveis e texturas na máxima resolução, só para perpetuar o tal meme de “queimar” PCs. Apesar do deslumbre visual, não acho que haja nada realmente fenomenal para o hardware moderno. É apenas Crysis com um polimento visual, apenas e só.

Curiosamente, se bem se lembram, Crysis Remastered foi adiado, acabando apenas a versão Nintendo Switch a cumprir calendário. Este adiamento foi despoletado por uma péssima recepção de um vídeo e imagens que mostravam o estado de produção do jogo em Junho. O efeito foi tal que a Crytek e a Saber Interactive o adiaram um dia antes da revelação, sendo lançado só agora. Trabalharam extra para evitar lançar aquele jogo que mostraram então e, infelizmente, esse esforço extra parece ter sido inteiramente focado no visual. Queria muito que este empenho em nos deslumbrar fosse doseado no restante jogo. Uns meses mais tarde que o previsto, devo dizer que o visual não chega. Pelo contrário, chega a ser excessivamente exigente, mesmo em hardware de topo no PC.

Antes de terminar, devo informar que duas importantes componentes do título original foram removidas. Acredito que um qualquer modo multi-jogador poderia não entusiasmar o suficiente, sobretudo com tanta oferta no género na actualidade (só se incluísse Battle Royale). A sua remoção parece lógica e deu para a produção focar-se no modo de carreira. A outra remoção vem por acrescento, o lendário editor de mapas (ainda outra herança de Far Cry) também foi removido. Um vivia do outro e durante algum tempo, lembro-me de criar alguns mapas para jogar com os amigos. Perde-se este elemento, infelizmente. O que é só mais um golpe para os fãs.

Veredicto

Os primeiros instantes após aterrar de pára-quedas na ilha, a ouvir “Maximum Armor” e a disparar avulsamente contra inimigos a gritar em Coreano, fizeram-me regressar no tempo. Em 2007, o meu PC não corria o jogo original no máximo, mas adorei cada momento. Em 2020, o meu PC finalmente correu Crysis Remastered em todo o seu esplendor, mas os tempos são outros. O visual é realmente interessante mas acho-o excessivamente exigente para depois não conseguir impressionar assim tanto. A jogabilidade e a história, infelizmente, é que ficaram paradas no tempo. Num todo, serve o propósito de fazer renascer um “meme”. Mas, ser um showcase de capacidades já não é bem o papel deste lendário jogo de acção.

  • ProdutoraCrytek / Saber Interactive
  • EditoraCrytek
  • Lançamento18 de Setembro 2020
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAcção
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Mecânicas acusam o peso da idade
  • Animações e cenas intermédias menos polidas
  • Remoção do Multi-jogador e editor de mapas

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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