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Análise – Dead Space (Remake)

Quando em 2017 a Electronic Arts encerrou o estúdio Visceral Games, todos pensámos que Dead Space estava condenado. Felizmente, a EA Motive esteve à altura desta autêntica ressurreição de um legado.

É preciso dizer que, apesar do sucesso e da qualidade reconhecida do primeiro jogo, o segundo título não foi tão bem sucedido em termos de receitas. Nem vou sequer falar do terceiro jogo, porque… vamos só fingir que não aconteceu, ok? Mesmo assim, há alguns elementos de Dead Space 2 que claramente vieram melhorar a jogabilidade e a imersão. Além do aspecto visual aprimorado para a actual geração de hardware, este remake foi buscar vários desses elementos positivos do segundo jogo e outras novidades, de modo a criar um profundo trabalho de recuperação para a actual geração. O resultado, adianto, é bastante positivo.

Embora seja remoto que se digam spoilers de um jogo tão popular de 2008 agora reeditado, porque acredito que a história de Dead Space é um dos seus melhores destaques, prefiro falar dela de uma forma superficial. Para aqueles que nunca jogaram nenhum dos títulos da franquia, lanço apenas um necessário ponto de partida e alguns pedaços da trama.

O engenheiro Isaac Clarke e a sua equipa são lançados numa missão de investigação a bordo da nave USG Ishimura. Esta nave mineira ficou silenciosa enquanto minerava um planeta e é preciso descobrir o que se passa. Clarke está também preocupado, já que a sua namorada Nicole está também a bordo. Ao chegarem, porém, descobrem que algo não está bem.

Além da tripulação não estar no seu posto, tudo parece deixado ao abandono, semi-destruído e os sistemas a bordo parecem todos descontrolados. Inesperadamente, a nossa própria nave perde o controlo e acaba a despenhar-se no hangar da Ishimura. A equipa escapa ao pior mas ao entrarem no deck da nave mineira, descobrem que esse “pior” ainda está para vir.

Daqui para frente, já sabem mais ou menos o que esperar. A Ishimura está invadida por uma estranha ameaça monstruosa, os “necromorphs”. Estes são seres grotescos que, inicialmente pensamos ser uma espécie de extraterrestres, mas rapidamente descobrimos tratarem-se de humanos contagiados. Mas, não se preocupem, também há ETs, embora também não sejam muito simpáticos. Isaac terá de sobreviver a bordo da Ishimura, não apenas contra estes monstros, notem. Há também uma outra estranha ameaça, uma conspiração e uma sabotagem de alguns sobreviventes.

Fiquemos por aqui em termos de enredo. Fiquei particularmente agradado que a produção não tentasse “reinventar” as desventuras do protagonista e os vários desenlaces deste enredo. Sim, há algumas mudanças, na maioria subtis e francamente inócuas no seu desenvolvimento. Nas promoções do jogo, ficámos apreensivos com o facto de Isaac falar, quando no jogo original pouco ou nada dizia. Não é forçado, afinal. Só fala mesmo quando é necessário, nas cenas intermédias ou nas comunicações com a equipa, nunca alterando, de facto, o tom do jogo.

Como já disse, a EA Motive quis trazer alguns elementos do segundo título de 2011, não apenas porque fazem sentido na melhoria da jogabilidade e da interação mas também para fechar o fosso que havia entre os dois jogos. Não sei se a EA tenciona criar um remake também para Dead Space 2, seria interessante. Seja quais forem os planos, porém, agora os dois jogos estão mais semelhantes, não só porque Clarke fala, mas também porque outros elementos foram claramente polidos para haver uma semelhança entre as duas aventuras.

Como já deu para perceber, este é um jogo de acção na terceira pessoa, com elementos de sobrevivência e terror sci-fi. É uma receita francamente apelativa e que gerou por aí alguma inspiração para outros jogos. Contudo, só há um Dead Space e penso que o estúdio Canadiano estava bem ciente disso mesmo, não querendo destratar o legado deixado pela ida Visceral Games. Também não quis enraivecer os fãs do clássico, que colocam este jogo num pedestal intocável, como um dos melhores do seu género.

Por causa desse interesse em preservar, notarão que, de facto, a jogabilidade é muito, muito parecida, as interacções também e até o design de níveis e a estrutura do jogo pouco diferem do original. A principal melhoria é claramente no visual, sobre o qual já irei falar. O resto, é como um trabalho cuidado em restaurar uma peça de arte, sem nunca desrespeitar a obra. E, sim, continua a não esconder a sua real fonte de inspiração, System Shock, outro dos “grandes” neste género.

Assim sendo, já saberão como é a acção. Isaac possui um considerável arsenal de armas que vai apanhando a bordo da Ishimura, na maior parte ferramenta de trabalho, de minagem, adaptadas a armas mortíferas. Lembram-se quando pegavam numa pistola de pregos e alguém vos dizia para terem cuidado para onde a apontavam? Pois bem, Isaac tem mais ou menos o mesmo tipo de “utensílio”, com o mesmo nível de perigo.

Começamos com uma humilde pistola, passamos por uma espécie de metralhadora mas iremos apanhar lança-chamas, moto-serras, armas de energia e até uma arma que dispara um mini-buraco negro. Neste remake, as armas, têm agora interessantes modos secundários de tiro, o que torna as menos usadas no original bem mais apelativas. A título de exemplo, o lança-chamas podia ser frustrante porque faz pouco dano comparado com as outras armas mas o seu tiro secundário é uma parede de fogo protectora que consome inimigos que avançam.

A ideia é… desmembrar. Os necromorphs já não são pessoas. Por isso, dar tiros avulsos neles não é particularmente eficaz. Mesmo decapitados, não param de avançar para nós, uma vez que não são o vosso típico “zombie”. É preciso arrancar-lhes membros para que finalmente se imobilizem. Esta mecânica foi um dos aprimoramentos neste remake de algo fulcral na acção do original. Não só cria momentos ainda mais grotescos, como nos dá um combate mais… cirúrgico, em vez do desmiolado “tiro neles”.

Tratando-se de um jogo de sobrevivência, é claro que a munição é escassa, a energia também e a força que permite a Isaac usar telecinésia para mover objectos, também precisa de recarregar ocasionalmente. Mas, não pensem que basta correr pelo mapa em busca de munição ou de estações de restauro. É que o inventário também é limitado e exige algum controlo (já lá vamos). Em muitas situações, dei por mim sem munições, a correr pelo mapa a fugir de monstros e a usar a força cinética para os imobilizar ou lançar objectos na sua direcção.

Essa tal força cinética, já agora, tem aqui um uso mais intensivo, tornando-se mais como uma “segunda arma”, uma das claras inspirações do segundo Dead Space. Permite-nos imobilizar adversários ou, como já disse, pegar em objectos para arremessar contra eles. Além disso, é amplamente usada para limpar obstáculos de percursos que temos de seguir, para criar escudos com objectos e até é usada em puzzles de diversas escalas. Das “alterações” mais evidentes na jogabilidade deste remake, esta é uma excelente melhoria.

Na Ishimura, porém, nada joga a favor de Isaac. Os necromorphs adoram pregar sustos a Isaac, surgindo dos túneis de ventilação nas piores ocasiões. Há também momentos em que áreas de jogo se fecham para criar uma arena em que temos de os matar todos para progredir. Na maior parte dos encontros, bastam tiros certeiros na pernas dos monstros para os desmembrar e depois mais uns tiros no que resta para os eliminar. Mas, há monstros bem mais avançados lá mais para a frente, havendo até uns com armadura.

Dos “truques” mais sujos destes necromorphs é fingirem que estão mortos, causando alguns dos mais notórios “jump scares” do jogo. Confesso que ao fim de umas horas jogar, já não confiava no seu “soninho” e, quando entrava numa sala, a arma “falava” primeiro com eles. Outros sustos são causados mais pela sugestão de “segurança” que algumas secções criam, saltando um famigerado monstro da ventilação. Não são muitos, acreditem, senão tornavam-se demasiado “baratos” para surtirem efeito.

Não sendo, portanto, um jogo de muitos sustos, é um de tensão, muita tensão. Quando Isaac encontra um monstro ou tenta fugir dele, a música muda, ouve-se a batida do coração do protagonista e as suas vocalizações de esforço, abafadas pelo capacete. Há algumas secções do jogo em que somos perseguidos e não podemos propriamente retaliar, causando imensa aflição por esperar que uma simples porta abra. Depois é a constante aura terrível de suspiros, gritos, lamentos e até de canções de embalar tenebrosas. Tudo cria um nervosismo latente que não é para todos.

Mas, a EA Motive não se limitou a polir tudo numa remasterização glorificada. Há mesmo um trabalho de reedição profunda, também na jogabilidade. Alguns níveis, digamos, menos consensuais no original, foram revistos, como as célebres sequências em gravidade zero com os canhões da nave. Como já disse, as alterações são como nuances na oferta, só particularmente notórias para os que jogaram o original de 2008. Os demais encontrarão um jogo moderno, com uma construção sólida, mas com pequenas questões de antiguidade no conceito, nada graves.

Uma delas é das mais estressantes em jogo: os savegames. Só podemos guardar mesmo o progresso em pontos de salvamento, o que torna tudo ainda mais tenso. O jogo adiciona alguns checkpoints aleatórios para facilitar um pouco caso morram. Mas, não confiem muito neles. Salvem, muito e frequentemente. Aliás, memorizem bem onde estão os pontos de salvamento, até voltando atrás se não tiverem nenhum adiante. É terrível ter de repetir uma secção inteira de jogo porque ignoramos uma estação.

Outro dos elementos “à antiga” é a estrutura linear dos níveis, que nos obrigam a revisitar várias vezes o mesmo local, mas com acesso a novas áreas. É algo que já não se usa muito e que poderá aborrecer esta geração de jogadores pouco pacientes e que não gostam de uma passada mais metódica. Dá a entender que o jogo é moroso, repetitivo até. Mas, não é bem esse o caso. Regressamos muitas vezes ao mesmo local, é certo, mas não com a mesma arma, experiência ou os mesmos inimigos. Evoluímos, assim como a Ishimura evolui connosco.

Falando de evolução, Isaac terá de ir melhorando o fato e as armas consoante a acção se vai tornando mais exigente. A tal limitação de inventário é dos elementos mais complicados de gerir, exigindo cada vez mais armas, munições, consumíveis e até coleccionáveis. Os nodes, são peças de evolução para evoluir o equipamento, mas são raros e caros se os pretendermos comprar numa das lojas em jogo. A evolução só se pode fazer numa bancada própria e, sim, os tais nodes são comuns para fato e armas. É decidir o que se pretende: mais danos ou mais protecção.

De um modo geral, o jogo vai-se tornando mais e mais difícil, pelo que esta decisão terá um peso considerável na forma como o vão apreciar lá mais para a frente. Especialmente na última secção, convém termos o fato maximizado em potencial e convém também ter armas evoluídas na medida do possível. Esta será uma das melhores características deste jogo, a sua dificuldade adaptativa, num crescendo notório e que é preciso acompanhar. Ficam avisados, não se acomodem e gastem esses créditos.

A nível técnico, é óbvio que a EA não iria deixar que se fizesse aqui um mero polimento de texturas. Além de imensas melhorias nos modelos e animações das personagens, há também um profundo trabalho de iluminação, sombras e efeitos visuais. Quando as luzes se apagam por causa uma emergência, quando um corredor é iluminado apenas por pequenos focos de luz, contribui para o suspense. Tudo tem um aspecto muito bom, com imensos detalhes de qualidade, tornados deslumbrantes (ou tenebrosos) por puxar pelo hardware da versão analisada (PS5).

Como já disse, o áudio é dos elementos mais importantes deste jogo, com uma atmosfera aterradora em torno do jogador, usando habilmente o som 3D disponível nesta consola em que testámos. A banda-sonora é também um elemento forte com um tom igualmente tenebroso a cada momento. E, sim, a voz de Isaac Clarke, emprestada pelo actor Gunner Wright dos jogos originais, encaixa bem, apesar de todos os receios que seria algo forçado neste remake. Pelo contrário, dá personalidade a Isaac, algo que claramente lhe faltava em alguns momentos-chave.

Veredicto

Este é um remake que respeita (e bem) o material original de 2008 e ainda traz alguns bons elementos do segundo jogo de 2011. O remake de Dead Space é um trabalho cuidado de restauro, que não tenta reinventar nada, apenas polir de forma consciente o que era mesmo necessário modernizar. Ainda tem uns quanto detalhes de antiguidade mas que só contribuem para o seu “charme”. É absolutamente essencial que visitem a USG Ishimura. Não tenham medo, Isaac Clarke está convosco e é um excelente engenheiro que… hey, ouviram aquilo?

  • ProdutoraEA Motive
  • EditoraElectronic Arts
  • Lançamento26 de Janeiro 2023
  • PlataformasPC, PS5, Xbox Series X|S
  • GéneroAcção, Survival Horror
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Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Alguns elementos de jogabilidade datados
  • Um pouco repetitivo

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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