Análise – Dying Light 2: Stay Human
O que faz de Dying Light 2: Stay Human tão desejável, não é bem o seu saturado tema de sobrevivência contra zombies. Temos boas memórias do primeiro jogo e queríamos mesmo que este novo mundo aberto trouxesse algo interessante. A Techland bem que se esforçou.
Olhando para trás, o primeiro Dying Light foi uma revolução positiva. Das mentes por detrás da franquia Dead Island, ninguém esperava que a equipa pudesse criar algo tão entusiasmante num género tão desgastado. A ideia até foi simples: todos os clichés de sobrevivência, armas desgastáveis, combates brutais com classes diferentes de zombies e, o grande trunfo da produção: parkour. Mais que a vulgar perícia de fazer headshots avulsos, um salto pela parede ou uma pirueta para uma espadeirada certeira, criavam momentos recompensadores tão diferentes dos demais títulos deste tipo. É normal o entusiasmo por uma sequela que demorou quase sete anos a chegar.
Ok, não tanto sete anos mas uns três ou quatro de produção, pelo menos desde que soubemos que estava realmente na forja em meados de 2018. Adiamentos sucessivos minaram as nossas expectativas, com a Techland a tentar manter a atenção com vídeos e detalhes constantes a mostrar algo muito ambicioso. Embora o primeiro jogo tivesse mapas vastíssimos no jogo base e nas expansões, esta era uma aposta num mundo aberto repleto de perigos, nem só provocados pelos zombies. O que a produtora aprendeu nestes anos tinha de resultar em algo grandioso.
Mas, fazer uma sequela que viva à altura da primeira oferta é complicado. Mais complicado ainda é manter a nossa atenção em géneros tão saturados como são o de mundo aberto à exploração, sobrevivência e, claro, combate com zombies. Mantendo-se a fórmula original, há sempre quem reclame de “repetição”. Inovando demasiado, perde-se a receita que atraiu os jogadores na primeira instância. Ironicamente, a aposta da Techland é um misto. Quis dar saltos gigantes, sim, mas na sua prudência em não estragar a fórmula, criou algo surpreendentemente conservador.
A ameaça zombie de Harran que serve de base para a história do primeiro jogo, foi contida quando todos os cidadãos foram aniquilados sem sobreviventes reportados. O mundo festejou mesmo vitória contra o vírus de Harran (THV) quando a Global Relief Effort criou uma vacina eficaz. O futuro da Humanidade parecia seguro… mas a GRE tinha outras ideias. Na sua avidez, continuou a trabalhar no vírus para tentar criar uma bio-arma. É claro que, eventualmente, uma versão mutante do THV fogiu ao controlo e uma segunda vaga pandémica varre a Humanidade, desta vez sem restrições e sem cura à vista.
A história de Dying Light 2 passa-se 15 anos depois desses eventos catastróficos, naquela que é conhecida como “a Queda”. Entretanto, o THV espalhou-se pelo mundo, convertendo quase toda a humanidade em zombies. Os poucos que lhe resistem, ficaram reduzidos a pequenos povoados e à última cidade fortificada conhecida, Villedor, algures no centro da Europa. Esta cidade é controlada por várias facções, nem todas com fins pacíficos, numa luta pela sobrevivência do que resta da Humanidade, mesmo que nem todos mereçam realmente sobreviver.
O nosso herói neste enredo é Aiden Caldwell, um indivíduo cuja tarefa é servir de mensageiro e guia entre povoados, um Pilgrim. É uma tarefa complicada, já que tem de navegar pelas terras ermas e cheias de zombies e outros perigos, como um pária da sociedade, de quem ninguém quer saber, mas eventualmente precisa. Os Pilgrim são hábeis colectores de recursos e são dotados de uma agilidade impressionante. Agilidade, essa, que é absolutamente essencial dominar de modo a lutar contra os mortos-vivos (e não só).
Paralelamente, Aiden tem também um passado sombrio que, a par do resto do enredo, se vai desenrolando conforme jogamos. Quando travamos conhecimento com o protagonista, percebemos que está no encalço da sua irmã Mia de quem se separou em criança. Aiden e Mia estariam cativos de um tal de Waltz quando se separaram depois de um incêndio numa estranha habitação. E é mesmo aí que quer começar a sua busca. Ao que parece, há alguém na cidade de Villedor que o pode ajudar a encontrar o antagonista e, por consequência, a sua irmã.
A história tem ganas de ser algo grandioso e com imensas ramificações, mas acaba por “morrer na praia”. Aliás, durante as promoções do jogo pré-lançamento, fiquei sempre com a sensação que, desta feita, haviam mais decisões com repercussões modificadoras da narrativa. O resultado final em mãos, porém, não é assim tão profundo. Tirando umas áreas de jogo que se alteram e um dos finais do jogo ser dependente de algumas escolhas que vamos fazendo com as facções, não achei que as decisões tomadas fossem, de um modo geral, assim tão impactantes. Até mesmo a maior decisão final na história é mais uma inevitabilidade que uma escolha… nada de spoilers.
Por outro lado, nas mesmas promoções sempre fiquei com a ideia que as personagens com que nos cruzamos seriam bem mais memoráveis que no antecessor. Tirando uma ou outra personagem mais preponderante, como é o caso de Lawan, interpretada pela famosa actriz Rosario Dawson, nenhuma merece mesmo a nossa especial atenção, além de umas poucas cenas intermédias ou linhas de diálogo. Com tantas interacções com os sobreviventes, porque nenhum é verdadeiramente marcante, perde-se o interesse em conhecer as suas histórias pessoais.
De um modo geral, notem, até gostei desta maior base narrativa desta sequela. Pelo menos, há aqui uma história corrida, com algumas reviravoltas relativamente bem engendradas, mesmo que preveja que o final não seja propriamente do agrado de todos. Consigo desculpar alguns buracos na narrativa ou até os imensos diálogos estranhos ou mal escritos. Elaborar esta história tão complexa foi um bom esforço da Techland em gerar um lore mais premente, que não fosse apenas uma mera introdução descartável. Só que não vive, de facto, à altura das expectativas.
Se a narrativa é falível, portanto, é bom que a jogabilidade compense. E, aí, não há muito para criticar. Quem gostou da fluidez e velocidade dos confrontos do primeiro jogo, sem dúvida vai adorá-los neste outro título. Embora o jogo leve algum tempo a “acelerar”, doseando as mecânicas com secções específicas que servem de tutorial, quando finalmente entramos no ritmo, a fórmula de combate melee com parkour é absolutamente viciante. Mesmo fora de combate, atravessar Villedor com a fluidez de movimento de Aidan é qualquer coisa de recompensador.
A Techland esforçou-se para tornar os mapas de jogo ainda mais interactivos, criando um autêntico “parque de diversões” do tamanho de uma cidade para explorar. Nesta sequela, notem, não contam só com a ligeireza do protagonista, há também novos parapentes e o já conhecido gancho e corda para chegar aos locais mais difíceis. Por causa disto, embora possam terminar todo o enredo em menos de 40 horas, é mesmo possível gastar várias centenas de horas neste mundo cheio de missões, tarefas, curiosidades, coleccionáveis e pequenos segredos.
No que toca ao combate, temos de volta aquela lógica visceral de combate próximo no género melee. Neste universo, as armas de fogo são coisa do passado. Aqui o arsenal é improvisado entre tacos, lâminas, martelos ou outros objectos do género. Uma vez mais, estas armas estão sujeitas a desgaste, pelo que não devem afeiçoar-se muito a esse “espadalhão” feito com lâminas de corta-relva. Pela sua raridade, upgrades e modificadores, algumas armas duram mais tempo ou fazem mais dano, pelo que devem estudar os prós e contras de cada uma.
Há aqui um incentivo para o combate furtivo, beneficiando bastante o jogador de se movimentar silenciosamente para atacar os incautos ou simplesmente evitar os confrontos. Mas, onde está a piada de fazer isso? Quando chegamos a “vias de facto” contra meliantes que ousem meter-se connosco nas nossas actividade, misturamos a agilidade no movimento com desvios ou bloqueios, aplicando golpes furtuitos leves ou intencionalmente pesados. Há também uma lógica de contra-golpe depois de um bloqueio no tempo certo que é importante dominar.
Contra os zombies, já sabem que aqui há duas fases de jogo. Durante o dia os desmiolados são poucos e algo lentos. Como não se desviam ou bloqueiam, só temos de os golpear no momento certo e desviar dos seus ataques precipitados. À noite, porém, os zombies ganham outra vida. É nesta altura que surgem os zombies especiais, com poderes sobrenaturais e que realmente nos desafiam. Este variam de capacidades, com o primeiro, por exemplo, a saltar largas distâncias e a correr na nossa direcção num “dash”, obrigando-nos a desviar no tempo certo.
Talvez porque já sabia o que esperar desde o primeiro jogo, achei que a produção reduziu um pouco a dificuldade nestas secções nocturnas. Se no primeiro jogo, corríamos desalmadamente na direcção das luzes roxas com receio pela “vida”, neste jogo, embora sejam sequências desafiantes, algumas a puxar pela adrenalina, achei tudo mais acessível, com mais opções de fuga, pelo menos. Como algumas missões (e recompensas) que só podem ser encontradas à noite, talvez a Techland tenha “baixado o lume” para permitir que os jogadores terminem o enredo de forma mais acessível.
E vão mesmo querer apostar na noite (não, não é para os copos, calma). A maior aposta numa lógica RPG, faz com que os pontos de experiência seja ainda mais importantes. À noite estes pontos são mais generosos por cada tarefa, compensando o risco. Especialmente, se quiserem evoluir para atacar as missões mais exigentes, isto exige alguma dedicação a fazer missões e tarefas. Já agora, achei que a árvore de evolução é um tanto exigente demais para desbloquear todos os movimentos, numa clara “muleta” técnica da produção para obrigar a jogar mais.
Com excepção do prólogo, a história pode ser passada em modo cooperativo até quatro jogadores. De facto, matar zombies ou meliantes armados é sempre mais divertido com companhia. Quanto joguei com amigos, deu tempo para descontrair mais entre missões, não tanto preocupado com o perigo de ficar rodeado. Obviamente, nas secções mais difíceis, também deu imenso jeito ter alguém para ajudar. Ainda assim, não me parece que jogando com mais pessoas a experiência seja mais ou menos memorável que jogando a solo.
Resta-me falar da componente técnica. O primeiro jogo não foi propriamente um “colosso visual” mas até apresentou uma imagem competente e um grafismo adequado para a acção. Neste jogo, obviamente a Techland quis apostar num boost visual, também para tirar proveito do hardware mais potente. Tive a oportunidade de experimentar o jogo num PC que excede todas as recomendações e não fiquei propriamente desapontado com a performance ou com o aspecto geral. Apenas achei que a optimização deixa um pouco a desejar ao longo do jogo, criando oscilações de FPS que não deviam acontecer.
E depois, os bugs. Modelar este mundo tão grande e ambicioso, exige muito controlo de qualidade. O que vi nas minhas várias horas de jogo, porém, foram erros de sincronismo, falhas nas animações, objectos e personagens suspensos no ar ou em poses estranhas, efeitos visuais estranhos, enfim, nota-se porque é que a Techland pediu para ninguém jogar antes do lançamento. A actualização dia 1 vem resolver uma série de problemas, mas não todas. Este é um jogo a precisar de polimento nas próximas semanas, o que ao fim de tanto tempo em espera e de alguns adiamentos não é fácil de justificar.
Veredicto
A fórmula dos “zombies com parkour” tem aqui uma continuação digna da oferta original. Contudo, Dying Light 2: Stay Human não segue propriamente um novo rumo. A Techland só quis só dar continuidade ao que já conhecemos, com a intenção de expandir essa experiência. Os bugs encontrados, o enredo e personagens algo superficiais são evidentes. Por outro lado, a falta de reais novidades (só mesmo o parapente e outros poucos elementos), cria um título mais conservador do que estava à espera. É fácil recomendar este jogo a quem gostou do primeiro. Até mesmo quem só quer um jogo de aventura e acção com zombies o apreciará, especialmente a jogar com amigos. Só que, infelizmente, não consegue deixar a mesma marca indelével que tivemos com o primeiro Dying Light.
- ProdutoraTechland
- EditoraTechland
- Lançamento4 de Fevereiro 2022
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
- GéneroAcção, Survival Horror
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Combate continua a ser fantástico
- Percorrer o mapa com parkour
- O novo parapente
- Novos elementos RPG
- História pouco profunda
- Personagens esquecíveis
- Não precisava de ser tão vasto em dimensão
- Bugs e glitches gráficos em demasia
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.