Análise – Evil Below
Evil Below foi o grande vencedor da 6ª edição dos Prémios PlayStation Talents. Tivemos a oportunidade de experimentar esta aventura criada pelos Fire Raven Studios, de Fábio Barbosa e José Ortega.
Foi em 2020 que Evil Below se destacou no PlayStation Talents ao levar o prémio para Jogo mais Inovador, Melhor Utilização das Plataformas PlayStation e claro, o grande prémio de Melhor Jogo dessa edição. A premissa de Evil Below é interessante, trata-se de um jogo de aventura na primeira pessoa com elementos de terror, tendo ainda a particularidade de utilizar o microfone do comando DualShock como elemento de interacção, bem ao estilo de Alien Isolation. Contudo, na prática, este é um sério caso de estudo, uma prova que nem sempre um conceito chega de melhor forma ao produto final. Vou explicar porquê.
Evil Below, conta-nos a história de uma mãe à procura do seu filho num local desconhecido onde acordou depois de ter um acidente de automóvel. Este local tenebroso é uma área assustadora, cheia de florestas, pântanos, cavernas claustrofóbicas e claro, muito mistério para desvendar. Todas as criaturas que aqui vivem, fizeram destas terras o seu território e nós somos vistos como uma ameaça, um invasor que é preciso eliminar a todo o custo.
Como este género de títulos nos tem vindo a habituar, começamos sem nada na nossa posse. Depois, tudo gira em torno do que podemos apanhar pelo caminho, sendo que quase tudo o que encontramos pode ser útil, como um simples martelo para nos defendermos, por exemplo. No entanto, rapidamente percebemos que nem para partir caixas este martelo serve, quando mais para proteger a nossa vida. A busca de respostas e de uma nova arma, começa de imediato.
Eventualmente, também será melhor explicado o nosso papel neste mundo macabro. Mas, não quero estragar a experiência a quem queira jogá-lo até ao seu fim. Digamos apenas que a jogabilidade consiste em vários elementos misturados, entre um jogo de sobrevivência e de terror. O que poderia funcionar bem, como já vimos em muitos outros títulos do género. Porém, nenhuma das opções criativas da produção consegue realmente entusiasmar. Agrupar ideias, tem de ser feito de forma ponderada e optimizada, não apenas lançá-las “para cima da mesa”.
Dou-vos um exemplo. Logo no início do jogo é explicado como podemos usar o microfone para abrir umas “portas”. Para as abrir, é necessário fazer um som alto e durante algum tempo usando o microfone do comando DS4. Apesar no papel parecer uma ideia engraçada, a implementação precisa de ser melhorada. Além do ruído demasiado elevado que é necessário produzir, nem sempre faz sentido. Parece mais uma “inovação” de funcionalidade (quem nem é novidade) forçada num contexto. Felizmente há uma opção que permite automatizar isto. Revela que é preciso estudar e experimentar como aplicar ideias de uma forma que seja intuitiva e lógica. Não é o caso.
Com um enorme mapa aberto à exploração, custou-me a acreditar que este título não possui um simples mapa ou um bússola para nos guiar. Pelo menos, não encontrei com nenhuma destas opções, pelo que admito que o jogador comum também não as vai encontrar. Esta ausência de ajudas, aliada ao facto de que existe uma névoa constante que não permite ver muitos metros à nossa frente, causa uma desorientação notória e a dada altura já nem temos vontade de explorar, afinal o ponto fulcral do jogo.
Compreendo que a falta de orientação pode aumentar ainda mais a sensação de vulnerabilidade do jogador. Esta é uma fórmula muito usada noutros títulos, acrescentando mais um elemento para causar uma sensação de ansiedade e de tensão à acção. Contudo, como já disse, a conjugação de opções de design, tornou toda a exploração uma tarefa difícil e confusa. É mais uma demonstração que não basta empilhar conceitos sem um bom planeamento.
Além da orientação, outro dos pontos importantes num survival horror é a gestão do nosso inventário. Muitas vezes é limitado, para que tenhamos de fazer escolhas difíceis, por exemplo, entre levar mais munição ou levar itens curativos. Em Evil Below, o inventário tem apenas quatro espaços e foi inevitável sentir alguma frustração. Podia ser assim limitado mas coerente nessa limitação. É impossível saber se alguns objectos que fui apanhando ao longo do caminho seriam necessários ou não durante a minha jornada. Descartá-los é a opção mais lógica mas como é que criamos um critério?
Fui fazendo as minhas escolhas, sempre com a esperança de encontrar alguma forma de aumentar o meu inventário mas nunca aconteceu. Passei boa parte com uma maçã, munições e uma lamparina. A meu ver, dado que é um jogo virado para a exploração, faria algum sentido termos a possibilidade de expandir o inventário. Infelizmente, este inventário acaba por se tornar uma barreira técnica para a lógica de jogo. Forçando-nos a manter sempre os mesmos itens disponíveis.
Felizmente as armas em si não contam para o inventário… mas, adivinhem… só podem levar uma de cada vez. Existe uma boa variedade para enfrentar todas as criaturas do jogo, entre armas melee e de fogo, mas a escolha é, mais uma vez, limitadora. Felizmente (ou infelizmente), os inimigos tem uma Inteligência Artificial bastante básica, ficando várias vezes presos nos obstáculos do cenário ou a correr desalmadamente contra uma rocha, alvos fáceis a criar momentos bastante caricatos.
Por outro lado, estes inimigos possuem um alcance de ataque mais amplo que o nosso, criando situações injustas. Ao fim de algum tempo, acabei por usar mais o ambiente para conseguir fugir aos inimigos, que a enfrentá-los com as minhas poucas armas. Reparei ainda que, se conseguir levar os inimigos para fora da sua área, eles deixam de nos atacar… mas também não morrem. Simplesmente reagem aos impactos que desferimos mas não registam nenhum dano aparente.
No geral, pelas imagens aqui colocadas, os ambientes podem parecer visualmente impressionantes mas não foi isso que constatei. Estes ambientes tão cuidados para as capturas promocionais não reflectem a qualidade visual geral. O jogo acaba por não brilhar muito a nível técnico. Algumas texturas estão bem detalhadas mas, mesmo na PlayStation 5 (plataforma de análise), há momentos em que as texturas demoram a carregar ou não são carregadas de todo. Este é um claro problema de optimização mal executada.
Por outro lado, as criaturas tem um bom design na sua maioria mas não impressionam. Também as personagens com que interagimos têm uma clara falta de expressão com animações bastante básicas. Também no áudio o jogo não consegue impressionar, com os seus repetitivos sons arrepiantes rapidamente a tornarem-se irritantes ao fim de uns minutos. Aliás, aquela tensão e mistério iniciais para as quais o áudio contribui, desvanecem-se quando percebemos que o jogo só nos quer provocar “jump scares”.
Veredicto
O programa PlayStation Talents tenta captar as melhores mentes criativas e projectos ambiciosos em Portugal. Contudo, fica bem claro que receber o prémio de “Melhor Jogo” nem sempre significa que no final será realmente algo memorável. É só uma escolha de um júri que escolheu um conceito. Evil Below é um projecto nacional muito ambicioso, não tenho dúvidas. Infelizmente, é também uma prova que um conjunto de boas ideias, precisam de ser bem planeadas e ainda melhor executadas. A alternativa é que simplesmente não passem de uma “lista de intenções”.
Não posso deixar uma palavra de apreço à equipa que tentou o seu melhor com o orçamento que tinha à disposição. Pode não ser um jogo perfeito, mas é claramente um primeiro passo. Se continuarem com boas ideias e conseguirem aplicar de forma mais correcta poderão, em breve, estar a lutar com outros “gigantes”.
- ProdutoraFire Raven Studios
- EditoraGammera Nest
- Lançamento17 de Fevereiro 2023
- PlataformasPC, PS4
- GéneroAcção, FPS, Terror
Não podemos aconselhar este jogo, os detalhes positivos não chegam para esquecer onde falha.
Mais sobre a nossa pontuação- Atmosfera
- Design de algumas criaturas
- Muitos erros técnicos, apenas aceitável para um jogo ainda em desenvolvimento
- Desenho do mapa confuso, falta algum elemento de orientação
- Torna-se monótono rapidamente
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.