João Pinto, Publicado a 25 de Novembro 2021Comentários
Tratar de uma quinta é trabalho árduo. Provavelmente, muitos dos que estão a ler jamais equacionaram este tipo de trabalho como alvo de carreira. Mas, virtualmente tudo parece mais acessível. Farming Simulator 22 é daquele tipo de simuladores que continua a atrair audiência de forma algo inexplicável.
Talvez porque é um trabalho incrivelmente técnico com a maquinaria moderna (longe vão os tempos de usar enxadas e pás). Talvez porque a Giants Software criou uma interessante dinâmica de mundo aberto e livre. Talvez porque este seja um dos jogos de simulação que leva bem a sério o seu papel. Seja qual for o motivo, certamente não é a sua “acção explosiva” ou a sua complexidade que atrai os jogadores. Como sempre digo a cada nova edição, para mim o efeito “zen” destes jogos é o que me leva a passar horas a conduzir tractores. Poderão dizer que é fastidioso, que é “parado” ou até que nem se interessam pelo assunto. Mas, todos deverão indagar porque é que tanta gente na vossa lista de amigos estará a jogar Farming Simulator neste momento.
Cada um terá os seus motivos, claro. Mas, arrisco dizer que a principal “culpa” do sucesso desta franquia é mesmo a ambição e dedicação inabalável da produção. Nunca desistiu de criar algo único em cada jogo, não só vindo a modificar a jogabilidade para algo cada vez mais abrangente nesta área, como também vindo a expandir a oferta de máquinas e lógicas. Isto, cria uma franquia francamente vasta para quem quiser explorar tudo. Mas também pode ser um jogo simplificado para quem só pretende operar os tractores ou até fazer apenas a gestão geral da quinta. Existem três níveis de dificuldade e realismo para esse efeito, já agora.
Antes de falar da oferta deste jogo, tenho de mencionar um aspecto muito importante que é também um elemento que prova a popularidade desta franquia. Esta foi a primeira vez que a Alemã Giants produziu e publicou este jogo, reunindo ainda a maior quantidade de licenças de marcas reais de sempre. É também um ponto de viragem importante ao nível da jogabilidade, já que oferece sessões multi-jogador entre plataformas (cross play). Se o online é assim tão popular, é discutível. Mas, há imenso mérito para a Giants fazer esta implementação, até porque algumas operações beneficiam bastante de jogar em grupo ou com amigos.
Como nas demais entradas desta série, este é um jogo que assenta em dois elementos básicos: A produção e a economia. Mas, aqui este último elemento tem muito mais preponderância (já lá vamos). Temos de gerir a produção de uma quinta, cultivando ou criando animais, reunir os produtos dessa produção e processá-los ou reuni-los para a venda. Mesmo a venda tem de ser bem feita, buscando no mercado quem compre ao melhor preço. Conforme já disse, há três níveis de dificuldade que proporcionam diferentes níveis de desafio. A ideia é ir reunindo verba para comprar mais e melhor maquinaria, além de novos campos para alargar a produção da quinta.
Embora possamos fazer todo o processo, desde arar a terra, fertilizar, semear, apanhar a safra ou criar o animais e extrair o seu produto e depois transportar tudo para vender, todo o processo é simplificado. Como sempre, a palavra “simulador” é apenas um cliché, já que tanto a condução, como a operação das máquinas é muito, mesmo muito simplificada. Como cenário, temos três mapas fictícios, inspirados nos campos de cultivo no sul de França, nas montanhas da Suíça e no interior dos EUA. Cada mapa tem também os seus próprios desafios e características para lidar.
Como novidades nesta edição, a lógica comercial foi revista, permitindo agora criar cadeias de fornecimento que poderão atingir dimensões industriais. É possível construir fábricas para processar os bens que produzimos, permitindo expandir ainda mais o aspecto da gestão das quintas. A título de exemplo, podemos criar um campo de cultivo de uvas, que depois são processadas como vinho e este é depois vendido ao mercado de consumo. O mesmo acontece com o leite produzido das nossas vacas, que podemos processar para o vender ao público ou produzir queijo que pode também ser um ingrediente para vender pizzas, por exemplo.
Há uma grande quantidade de exemplos do que poderão fazer desde uma simples semente até chegar a um produto final para venda directa. O que nos dá uma perspectiva muito interessante de como tudo se processa na vida real, com as devidas ressalvas de ser um jogo, claro. Nesta edição, temos a novidade das já mencionadas uvas, assim como azeitonas e até podemos construir colmeias para produzir mel. Gostei bastante da dinâmica das estufas que, embora tragam ao de cima a polémica actual da chamada “agricultura intensiva”, permite-nos continuar a produção além das estações do ano (outra novidade presente).
Também temos agora novas actividades paralelas, como tapar o solo arado para o pousio ou limpar o campo de pedras para o preparar para cultivo. Há também uma maior ênfase no planeamento, cuidando que as colheitas sejam feitas na altura certa do ano, de modo a preparar o campo para o próximo cultivo também na altura certa. Isto, sem esquecer os intervalos necessários para o campo recuperar os nutrientes (o tal pousio). Notem que estes pormenores apenas afectam a eficiência, já que o jogo é muito tolerante a erros ou ao mau planeamento. E se não quiserem enfrentar nenhuma destas condições, até podem desligar estas opções de realismo.
Como não podia deixar de ser, temos ao dispor mais de 400 máquinas e ferramentas, contando com mais de 100 marcas agrícolas reais como a Fendt, John Deere, Valtra, entre outras. Temos novas máquinas disponíveis dedicadas aos novos formatos de cultivo, cada uma com uma operação única. Não são particularmente difíceis de operar, já que, como já disse, há muita simplificação nos controlos. De um modo geral não é difícil perceber como as conduzir, havendo mesmo um tutorial simples para explicar os traços gerais. Penso que é isto mesmo que a maioria quer fazer: conduzir ceifeiras!
Contudo, com tanto para fazer além dos campos, parece-me que a escala do jogo aumenta demais para quem gosta mais de pegar no volante. Se ligarem todos os aspectos do realismo e enveredarem pelas novas mecânicas de produção em escala, em breve estarão a erguer um autêntico império agrícola. Mas, esta dimensão não faz grandes favores ao aspecto de simulador de condução. A dada altura, somos mais empresários, que propriamente agricultores. Aliás, quando estiverem com uma certa dimensão, muito do trabalho passa a ser feito por trabalhadores da IA ou por subcontratados. Simplesmente não temos tempo para o trabalho mais “muscular”.
Por causa disto, toda a passada deste Farming Simulator 22 sofre um pouco. Demora imenso tempo a chegar a um patamar de produção aceitável, especialmente porque inicialmente não temos muitos fundos para mais equipamento ou para alguns automatismos. O jogo também não tem uma lógica de saltar tempo, o que nos obriga a (quase literalmente) olhar para as plantas crescer. Podemos sempre pedir empréstimos bancários para “acelerar” um pouco as coisas, mas nem essa é uma boa fórmula, porque não vamos ter lucro tão depressa para algo mais substancial.
No entanto, este não é um jogo para se ter pressa. Há uma certa sensação de conquista quando conseguimos uma quantidade de dinheiro suficiente para, finalmente, comprar um simples camião maior para transportar mais produto e facturar mais numa assentada. Ou, então, quando finalmente compramos um campo adicional para cultivar em maior escala. Não é que tenhamos suado muito para esta consquistas, mas tomaram-nos tempo e deram algum trabalho. Sentimos mesmo a recompensa pelas horas gastas. E, como na vida real, chegar ao tal império agricola tem de levar o seu tempo ou não há real desafio para enfrentar.Tecnicamente, este é um título ambicioso. A Giants apostou bem numa melhoria da qualidade gráfica, embora não seja ainda desta que vão ficar deslumbrados com um visual hiper-realista. Muitos dos efeitos visuais são simplificados, embora se note uma tentativa honesta da produção de chegar mais próximo da realidade. Gostei do cuidado a modelar tudo, especialmente dos pequenos detalhes simpáticos de animação que dão mais vida aos vastos mapas. Jogando na versão PC, não notei que alguma vez o meu computador fosse “puxado” além dos limites, mesmo em presets de qualidade mais altos. O que é também um bom atestado de optimização geral.
Uma nota muito positiva é o regresso do suporte para modificações da comunidade, disponível desde o primeiro dia. Estes mods podem facilmente ser consultados e instalados no menu do próprio jogo. Melhor, são geridos pela própria produção, garantindo a sua funcionalidade e qualidade. Em paralelo com as adições pontuais de novo conteúdo oficial, os novos veículos, ferramentas e outras lógicas que este mods trarão, farão toda a diferença no que toca à longevidade. Alguns mods até poderão ajudar nas primeiras horas, como um “empréstimo estatal” para aquele boost financeiro simpático no início do jogo.
Veredicto
Sem dúvida, Farming Simulator 22 é o maior, mais ambicioso e mais abrangente título de sempre desta franquia. A possibilidade de passar por todo o processo de produção até ao produto final, vai atrair bastante quem gosta do aspecto da gestão. Infelizmente, isto faz com que, ao fim de umas horas, conduzir as mais de 400 máquinas e ferramentas licenciadas passe a ser algo secundário. É uma mudança de rumo, para uma nova vida da Giants Software, agora também a sua própria editora. E, como sempre, uma mudança de paradigma pode ser tão complicada como fazer bom vinho. Eu que o diga, porque ainda não acertei uma safra neste jogo.
ProdutoraGiants Software
EditoraGiants Software
Lançamento22 de Novembro 2021
PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
GéneroGestão, Simulação
?
Sem pontuação
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.