Análise – Forza Motorsport
No momento em que o realismo parece ser a maior das apostas neste género, a Turn 10 quer fazer de Forza Motorsport uma nova era na simulação de condução. A questão é que, para fazer isso, é preciso octanas.
Embora tenhamos muitos jogos de condução recentes, inclusive na condução de carros de circuitos, alguns títulos são incontestáveis. Uns mais virados para a simulação em si, como Assetto Corsa, outros mais virados para impressionar visualmente, como Gran Turismo 7. Diria que a série Forza Motorsport sempre se situou no meio destes dois mundos, numa espécie de compromisso entre a performance credível e o visual bonito. Contudo, nesta era de maior exigência técnica e com uma selecção de hardware capaz de feitos visuais muito interessantes, os argumentos de Forza Motorsport começam a ser pouco entusiasmantes.
A palavra de ordem deste jogo é: suavidade. Tudo parece e sente-se suave, com imensa atenção ao design e à performance dos carros. Isto cria uma óptima experiência de condução na Xbox Series X|S e no PC, ambas versões que testámos para esta análise. Ainda assim, nota-se que nesta edição a aposta foi claramente no grafismo, com impressionantes momentos provocados pelos novos efeitos de meteorologia dinâmica e ciclos de dia e noite. Conduzir à chuva, por exemplo, é qualquer coisa de impressionante, aliado a uma condução muito acessível, devidamente reactiva, por vezes veloz mas sempre, sempre suave.
Só que esta fórmula é também francamente aborrecida. Comparado com a outra marca desta franquia, Forza Horizon, este é um jogo de condução focada em circuito, logo, não é tão virado para a espectacularidade dos mega-eventos, por vezes “over-the-top” que temos em Horizon. Ainda assim, poder ser bem mais entusiasmante. Aqui o intuito é ser o mais rápido em cada curva e cada sector, ganhando segundos preciosos para vencer corridas. Também temos a personalização e tuning dos carros mas na maior parte destes upgrades visam mais a performance que o aspecto.
A oferta nesta edição também me parece muito mais simplificada. O modo de carreira é agrupado por tipos de carros ou disciplinas, novamente nivelados por níveis de performance como nas edições anteriores. Contudo, agora a evolução de cada carro está confinada à nossa persistência com cada modelo, desbloqueando peças para um carro quanto mais o conduzimos. O que significa que só poderemos chegar às melhores competições, se completarmos as anteriores, repetidamente usando os mesmos carros. É uma lógica interessante mas tem os seus problemas.
É que o nível de dificuldade é agora proporcional ao que ganhamos. Optando por algo mais fácil, com uma IA mais acessível, o que ganhamos é menos em termos de créditos e pontos de experiência. Mas, com níveis de dificuldade mais altos, precisamos de carros mais competentes. Por outro lado, agora estamos também limitados aos Car Points, créditos que nos limitam no número de peças que podemos melhorar entre cada sessão. O que pressupõe que tenhamos de correr com o mesmo carro por várias provas menores até que façamos real diferença em classes mais exigentes.
Se isto vos soa a grind, estão certos. Em Forzas anteriores, a maior das críticas era que os jogadores tinham de fazer muito pouco para ganhar créditos ou até mesmo carros. Quase tudo era “dado”, sem que tivéssemos realmente de desembolsar muito para progredir. Agora, de facto, há mais “merecimento” por cada novo nível mas isto torna tudo muito mais moroso de alcançar. Quem quiser levar o modo de carreira mais devagar, tem aqui uma óptima fórmula. Quem quiser algo mais imediato, como é óbvio, ficará desiludido com esta nova lógica.
Felizmente, há simplificações. Na personalização e upgrades, temos um simples botão para fazer um upgrade automático. Este upgrade terá sempre em atenção o nível de performance máximo da prova actual e procurará as peças mais optimizadas para a melhor velocidade, travagem, aceleração e direcção. E ainda poderemos mexer na mecânica para espremer mais performance do carro em questão. Todavia, não é preciso enveredar pela engenharia se não se sentirem à vontade, é perfeitamente opcional.
Outra simplificação que é um tanto controversa mas que pode ajudar no início é que podemos escolher o nosso lugar na grelha de partida, eliminando a necessidade de uma sessão de qualificação. Quanto mais alto na grelha, obviamente menos pontos e créditos ganhamos. Mas, descendo nela aumenta também a dificuldade, com mais carros para ultrapassar e, dada a estreiteza de algumas pistas neste jogo, pode não ser tão simples chegar ao pódio. O jogo dá-nos mesmo uma previsão da posição em que terminaremos conforme o nível de performance de carro e piloto.
Embora neste jogo as penalizações sejam bastante presentes, por embates ou saídas de pista, podemos também desligá-las. Honestamente, senti necessidade de o fazer, já que o jogo não é muito consistente, penalizando, por exemplo, muitas das simples saídas de pista que não alteram a posição. Outras opções desligáveis são as do consumo de combustível, desgaste dos pneus e danos sofridos, tendo ainda várias ajudas diversas de acessibilidade. Claro que tudo isto pesa no realismo e se começamos a simplificar tudo, acabamos com algo mais arcade.
Piloto virtual que se preze, no entanto, quer o máximo de realismo. E, de facto, com todas as ajudas desligadas e a IA no nível máximo, Forza Motorsport quase roça o realismo. Infelizmente, a palavra de ordem neste jogo é o “quase”. A Inteligência Artificial, os chamados Drivatars, até são desafiantes se lhes dermos a devida margem. Contudo, algo que já víamos em edições anteriores, alguns veículos escolhidos como rivais ganham súbita velocidade e destreza quando estamos na frente, perdendo-a quando nos deixamos ultrapassar.
Numa determinada prova, o meu rival isolou-se dos demais carros da IA. Escolhi um lugar a meio da grelha mas rapidamente cheguei à sua esteira em poucas voltas. Então, o drivatar rival pouco fez para fechar trajectórias ou defender-se, permitindo-me ultrapassá-lo numa recta em velocidade de ponta. Subitamente, o drivatar ganhou ainda mais velocidade, obrigando-me a defender a posição até ao final. Eu adoro uma disputa até ao final, mas não desta forma tão sintética. Parecia que tinha “acordado” na segunda posição ou que o carro ganhou Nitro na última fase.
Se este nível de dificuldade fosse universal numa corrida com 24 carros, eu daria o devido crédito. Acontece que este nível de ataque e defesa, para mim só é mesmo evidente nos dois lugares cimeiros. Inicialmente pensei que era impressão minha mas vi isto repetir-se “n” vezes. Por outro lado, antes de atingir o topo da tabela, somos demasiadas vezes abalroados sem que o jogo pareça dar penalizações aos adversários da IA da mesma forma que nos dá a nós. O que me fez muitas vezes optar por posições de grelha mais altas para evitar os “pile-ups” tão frequentes em cada prova.
E, então, abate-se a monotonia. Tudo o que descrevi em cima no modo de carreira a solo repete-se, repete-se e… repete-se, nunca criando real sentimento de algo significativo a cada nível. As pistas são sobejamente diferentes e cada uma possui uma personalidade própria. Mas, o desafio é praticamente o mesmo, com os mesmos carros que somos obrigados a pilotar até à exaustão para termos alguma margem de sucesso, a mesma IA previsível e este grind constante que não faz qualquer jus ao jogo dinâmico que se pretendia que fosse.
Outro elemento que torna tudo monótono é que o jogo busca que sejamos sempre condutores perfeitos. Em cada secção, passagens limpas (sem colisões ou penalizações), ápices ou recuperações perfeitas, etc, dão mais pontos de experiência para piloto e carro. Lembra-me bastante um certo Need for Speed: Shift, um jogo que muitos consideram “careta” exactamente porque também premiava os jogadores “limpos”. Não estamos aqui para jogar em “carrinhos-de-choque“, bem sei, mas a audácia e o risco não são muito encorajados por causa desta lógica de pontuação.
Sim, é verdade que os pilotos reais ganham reputação negativa se não cumprirem as regras do fair play. Mas, não estamos propriamente num simulador “puro e duro” de condução e devia haver alguma margem para “emoção”. Aliado ao tal grind e à IA tão desinspirada, não temos aqui o entusiasmo latente de outros jogos rivais, mesmo os que já premeiam condução limpa. Aliás, as próprias edições anteriores de Forza Motorsport pareciam bem mais entusiasmantes neste aspecto.
Resta-nos apostar no online, onde outros pilotos virtuais nos desafiam. Tive aqui uma “lufada de ar fresco” da aborrecida campanha a solo. Os eventos online são muito bem disputados, com tempos de treino, qualificação (que não existe no modo de carreira a solo, como já disse) e depois a corrida em si. Curiosamente, aqui as penalizações são também um pouco drásticas mas não são tão injustas. Podemos mesmo descer de classe por causa dos erros, mas estes “castigos” fazem parte de uma dinâmica menos “robótica”, com uma notória intenção de afastar os que não sabem “estar”.
Se não querem partilhar a pista com outros pilotos, podem ainda apostar no modo Time Attack em que tentam bater o tempo de outros pilotos correndo contra o seu “ghost”. É óptimo ver outro piloto humano a abordar cada curva, tentando superá-lo e alcançar um melhor tempo. Para mim, foi a melhor das ofertas para ir melhorando de prestações. E, lá está, nem sempre as linhas perfeitas ou os ápices mais apurados são atingíveis, dando-nos margem para uma condução mais excitante em busca do melhor tempo.
Mas, infelizmente, não há nada mais neste título para nos ocupar ou até para nos cativar. Temos a opção de comprar carros e individualizá-los na nossa garagem e ainda correr livremente com eles para testar a sua performance. Mas, é tudo. Entendo que a Turn 10 quisesse simplificar as coisas porque os títulos anteriores já tinham demasiadas actividades. Mas, assim desta forma, ficamos com um jogo algo insípido, como um “cumprimento” de calendário. Não é o pior jogo do seu género no geral mas, em oferta, parece-me um tanto básico.
Onde Forza Motorsport tanto tenta puxar pela nossa atenção é no visual. Como já disse, há momentos verdadeiramente espectaculares, resultado dos tais efeitos de meteorologia e dia/noite. Mas, há também uma certa inconsistência no grafismo, a nível de reflexos, efeitos de luz e numa série de outros pormenores visuais menos apurados. Um bom exemplo é como os plásticos são tão baços ou como os reflexos do meio ambiente são por vezes tão irrealistas. Pensei que fosse uma questão de optimização na Xbox Series X mas observei o mesmo também no PC. Não será bem uma questão de polimento, acho que é mesmo uma falta de interesse em deslumbrar.
Veredicto
Enquanto que esta série sempre esteve no topo das minhas preferências neste género de condução, esta nova era de Forza Motorsport parece um retrocesso, uma simplificação em todos os níveis. A revisão feita à progressão a solo deverá dividir os habituais fãs, o upgrade visual tem algumas inconsistências notórias e a oferta geral não consegue dar algo verdadeiramente novo ou entusiasmante. Parece-me uma redução de investimento e interesse, talvez porque a concorrência é tão forte. E penso que a própria Microsoft e Turn 10 perceberam isso mesmo por não publicitar assim tanto jogo… notaram?
- ProdutoraTurn 10 Studios
- EditoraMicrosoft Game Studios
- Lançamento10 de Outubro 2023
- PlataformasPC, Xbox Series X|S
- GéneroCondução
Podia ser melhor mas tem alguns pormenores positivos que podem agradar a muitos jogadores.
Mais sobre a nossa pontuação- Mais carros, mais pistas
- Jogo suave, com uma condução acessível
- Modo online tem enorme potencial
- Alguns momentos deslumbrantes
- Algumas inconsistências no visual
- Oferta pouco variada, básica mesmo
- Inteligência Artificial algo desequilibrada
- Penalizações são por vezes algo injustas
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.