GreedFall (5)

Análise – GreedFall

Pela mão do Spiders Studio e edição da Focus Home Interactive, chega-nos mais um RPG de acção, cheio de ganas de ser o maior e o melhor que esta produtora já nos deu. GreedFall é a mais recente aposta da produtora Francesa, muito antecipado neste implacável género tão exigente.

A minha anterior experiência RPG da Spiders, provavelmente também a vossa, foi em The Technomancer. Este foi para mim um jogo “falível com um bom conjunto de boas ideias eventualmente mal implementadas”, como disse na nossa análise. A ideia que me deu na altura é que a produtora Francesa estaria a planear algo grandioso demais para as suas capacidades, indo beber aos melhores RPGs do momento para depois sentir dificuldades na concretização do projecto. Mas, se aprendemos qualquer coisa com os “entrepeneurs” do pensamento positivo, é sempre bom apontar para algo grandioso e consegui-lo apenas em parte, que se ficar pela mediocridade e conseguir pouco mais que isso. GreedFall é novamente um desses projectos de grande dimensão e boas ideias no papel, que a Spiders teima em abordar. Vejamos se foi mais feliz na implementação.

Regressamos ao passado, mais precisamente ao Séc. XVII, numa história fictícia de fantasia. Perante a ameaça de uma misteriosa doença chamada de Praga de Malichor, o/a protagonista De Sardet parte para uma expedição perigosa para investigar uma possível cura na misteriosa ilha Teer Fradee. Acontece que nesta ilha as ameaças são terríveis, desde seres mitológicos e sobrenaturais a monstros gigantescos. Por outro lado, esta porção de terreno por explorar está a braços com um conflito entre os nativos Elfos e os colonizadores que vêm das mais diversas partes do Império. Como devem calcular, a nossa missão é agir como elemento neutro em toda a trama, perseguindo a nossa missão principal, mas com todas as repercussões de decisões maiores ou menos no destino de Teer Fradee.

O vosso interesse neste enredo vai variar muito. Há momentos em que parece que estamos numa montanha-russa de interesse em jogar. A trama arranca de uma forma muito linear e assente numa sequência de eventos relativamente bem construída, entre alguma interacção (incluindo combate em jeito de tutorial) e cenas intermédias. Contudo, esse arranque logo cede lugar a uma série de missões e tarefas francamente aborrecidas. O que vai certamente dispersar a atenção e interesse de muitos. Felizmente, ao contrário da história algo caótica do seu último título, nota-se que a Spiders aprendeu com os erros no ritmo e na narrativa. E também a construção de personagens é francamente mais cuidada, sobretudo no que toca à interacção entre elas.

Nos diálogos, por exemplo, notei uma melhoria significativa na forma como se desenrolam. Não sei bem se esta melhoria assenta só no casting ou também na direcção de actores. O que é certo é que os protagonistas não parecem tanto estar a “ler um texto”, pelo menos. Os diálogos, como sabem, são importantíssimos num RPG. Aqui ajudam a contar a história, mesmo que algumas passagens ou frases nem sempre sejam bem escritas (ou, se calhar, menos bem traduzidas do Francês nativo dos autores). A própria trama também tem algumas inconsistências pelo meio, notando mesmo algumas falhas de continuidade, talvez fruto de algumas decisões tomadas por nós. Mesmo assim, repito, é uma evolução.

Acho mesmo que a Spiders perdeu muito tempo a jogar outros RPGs entre a concepção dos seus jogos. Não considero errada essa abordagem se as suas inspirações são jogos de referência. É inevitável sentir na sua passada e no sistema de companheiros uma “vibe” Dragon Age ou Mass Effect, tendo algumas ideias de mundo aberto, personalização da armadura e no combate da série The Witcher, sem esquecer aquelas inúmeras pequenas outras ideias de interacção de títulos mais intrincados como Pillars of Eternity. Estou atento, Spiders! Vou considerar isto uma homenagem e não um plágio, porque, de facto, a produtora Francesa não parece ter intenções de simplesmente copiar conceitos. Quando estes grandes jogos servem de inspiração, o que pode correr mal?

Bom, quase tudo o resto, na verdade. Começo logo pelo combate, que a Spiders faz questão que abordemos nos primeiros instantes. Temos ataques normais, bloqueios e desvios, como seria de esperar. Podemos atribuir teclas de atalho para ataques secundários ou poções, sem esquecer uma incrivelmente mágica troca de armas (não sei mesmo para onde vão, porque desaparecem quando as guardamos). O combate difere dependendo da classe que escolhemos e da evolução de De Sardet. O Warrior é o típico soldado convencional, mais próximo com espadas e pistolas, Technical é como um engenheiro que prefere armadilhas e armas de distância e Magic, bom, é o responsável pelos feitiços.

Esta fórmula é simples o suficiente para nos dar algumas escolhas e liberdade de abordar o jogo de uma forma única. A interacção assenta completamente na diplomacia, através das escolhas feitas nos diálogos e na acção furtiva e directa. Pelo que o combate deveria ser um dos focos mais aprimorados do jogo. Só que as animações são francamente pouco polidas, as transições nem sempre são fluídas (há mesmo teleportes) e algumas lógicas são algo toscas. Por exemplo, esperem ser empurrados para o chão com um golpe imparável, para depois verem o adversário literalmente a “espadeirar” no ar. Isto acontece várias vezes e em múltiplos encontros. Não tem o “peso” e a profundidade esperada, faltando também o necessário sentimento de recompensa de um bom golpe ou de um desvio no tempo certo.

Nem só no combate há problemas, infelizmente. O jogo possui uma série de bugs e glitches que fui apanhando e que devem preencher uma enorme lista lá pelo estúdio. E a cada novo jogador a entrar no fórum de suporte, logo surge mais uns quantos erros para adicionar. Na versão que testei no PC, por exemplo, tive um bug absurdo que me impediu completamente de jogar. O jogo assumiu um joystick que uso para simuladores de voo como objecto de interacção, o que fez com que os controlos respondessem de forma aleatória. É uma falha de programação do jogo, que devia apenas identificar teclado e rato ou um gamepad como quase todos os outros títulos fazem. Felizmente, o próprio Steam possui uma forma de mitigar este problema. Ainda assim, não me ajudou muito nesta avaliação.

Mas, embora chato, não foi esse o único problema que enfrentei. Desde erros caricatos nas animações com personagens a flutuar de braços abertos, falhas na detecções de colisões de personagens e objectos, inúmeros problemas de modelação e texturas, falhas de sincronismo de lábios (se é que existe sequer), a lista é demasiado vasta. Escutem, eu sei que a Spiders não tem a dimensão ou o orçamento de uma Obsidian ou Bioware. Contudo, a ambição e dimensão do jogo foi imposta pela própria equipa de produção e são eles que prometeram um jogo deste calibre. Tantas falhas são expectáveis, sim, mas também acho que a produtora bem que podia deixar o jogo “no forno” mais um pouco.

Ainda assim, quando o jogo funciona como o pretendido, mostra as tais boas ideias. Já falei da personalização da personagem, que é algo que sempre gostamos neste género. Há muito para escolher nas feições de De Sardet e perde-se muito tempo a escolher armaduras, fatos, chapéus e outros itens. Houve aqui um trabalho interessante para nos dar liberdade para criar um feiticeiro pedante ou um aventureiro de armadura, a escolha é vossa. E também dependente do nível de protecção ou bónus de cada peça, obviamente. Também gostei bastante dos puzzles que apanhamos para resolver ao longo da missões, alguns com algumas ideias bastante engenhosas. Enfim, o jogo tem mesmo bons elementos e quer ser sempre melhor… mas é a própria produção que não consegue entregar.

Quem sabe a questão mais inconsistente que prova isso mesmo, é o seu visual. Paradoxalmente, é um misto de deslumbre e desapontamento. No que toca ao design de edifícios de época, às paisagens inóspitas da ilha e a muitos outros elementos de ambiente e cenários, o motor gráfico Silk Engine proporciona momentos visuais muito bem conseguidos, alguns a roçar o realismo. Mas, depois, observamos as faces e anatomia das personagens (o que devia ser um destaque, para todos os efeitos) e não têm bom aspecto. Já falei das animações falíveis dos movimentos em combate, mas também há falhas nas animações ambientais e na modelação de objectos. O que é uma perda de oportunidade tremenda, sobretudo olhando para as imagens e vídeos promocionais deste jogo.

Veredicto

Se The Technomancer foi uma espécie de exame intermédio, com boas ideias mas com falta de experiência, tempo e/ou financiamento, GreedFall é como uma tese entregue apressadamente para aumentar essa nota. Sim, é de facto um jogo superior, em que o Spiders Studio mostra que sabe fazer algo melhor e evolui na narrativa e dimensão, com ainda melhores ideias na mistura. O problema, novamente, é a implementação. Este género dos Role Play Games é bastante exigente para alguém vingar perante a concorrência. É preciso algo verdadeiramente sólido. E apesar de estar no rumo certo, talvez com actualizações a mitigar os problemas mais graves, ainda não é desta que surpreendem.

  • ProdutoraSpiders Studio
  • EditoraFocus Home Interactive
  • Lançamento10 de Setembro 2019
  • PlataformasPC, PS4, Xbox One
  • GéneroAventura, Role Playing Game
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Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Inúmeros bugs e falhas
  • Visualmente inconsistente
  • Combate não entusiasma
  • Muitos momentos aborrecidos

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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