Análise – Microsoft Flight Simulator – Parte 1
Bem vindos a bordo, àquela que pode muito bem ser uma das maiores análises que jamais fizemos no WASD, pelo menos, ao nível de simuladores. A chegada do Microsoft Flight Simulator exige que falemos dele de uma forma mais completa. Daí que tenhamos dividido esta análise em três partes. Nesta primeira parte, vamos falar da oferta e conteúdo, abordando também um pouco de história.
Acompanhem também a segunda parte que fala sobre a componente de realismo no que toca à simulação de voo. E também falamos na terceira parte da componente visual.
A história do Microsoft Flight Simulator não é apenas composta por um singelo simulador lançado em 2020, produzido por um estúdio nada habituado aos simuladores de voo. De facto, o Asobo Studio herdou uma longa história que começou nos idos anos 80. Na verdade, a primeira “centelha” desta franquia nasceu em 1977, quando o lendário Bob Carson começou a produzir um tal de “Flight Simulator”, bem humilde em conteúdo. Só em 1982 é que a Microsoft negociou com Carson para produzir o primeiro Microsoft Flight Simulator 1.00 para o IBM PC. O resto foi, de facto, História, com uma série de simuladores que se tornaram referência ao nível amador e até profissional. O maior destaque vai para o FS2004: A Century of Flight de 2004 que comemorou os emblemáticos 100 anos da aviação e, claro, o venerável Flight Simulator X de 2006.
Infelizmente, em 2009 os simuladores da Microsoft pareciam confinados ao esquecimento com o encerramento do lendário ACES Studio. Ainda houve um “flop” comercial pelo meio, uma tentativa de “reboot” desta franquia com o “esquecível” Microsoft Flight (2012). O venerável FSX, estava destinado a ser o último grande simulador da série, tendo ainda hoje bastantes adeptos. Embora a Dovetail Games tenha adquirido os direitos de publicação do FSX: Gold Edition no Steam, limitou-se a reeditar o mesmo título de 2006 com muito poucas melhorias. O lançamento do Windows 10, infelizmente, começou a ditar o fim do icónico FSX por questões de incompatibilidade, mesmo na versão da Dovetail. No lado profissional, menos mal, a versão do FSX dedicada a profissionais do meio foi adquirida e modificado pela Lockheed Martin, tornando-se depois no famoso Prepar3D.
A história desta franquia é, portanto, vastíssima. Embora diversos outros simuladores tenham surgido por aí, de facto, os simuladores da Microsoft sempre tiveram enorme sucesso ao longos dos anos, gerando uma multidão de “simmers” a nível mundial. Foi só mesmo quando a produção do FSX terminou, que outras franquias surgiram em força para aproveitar o vazio. O já mencionado P3D e o X-Plane da Laminar Research são dois óptimos exemplos desta realidade. Ou seja, o Asobo Studio tinha três grandes desafios pela frente: Provar que, como estúdio de videojogos convencionais, era capaz de produzir um simulador de voo credível, tinha de honrar o legado vasto desta franquia e ainda tinha de lutar contra a concorrência, que não parou no tempo e tem vindo a trazer grandes produtos.
Devo dizer-vos que a minha análise ao novo Microsoft Flight Simulator começou há vários meses, durante as primeiras Alphas Fechadas no início deste ano e nas posteriores Betas exclusivas. Nestas várias fases, vi dois padrões distintos na produção da equipa do Asobo Studio: Um padrão era o do deslumbre técnico, sobretudo visual. É algo que, sinceramente, cheguei a duvidar que fosse possível executar com o nível de rigor visual que a produção apontava. O outro padrão essencial era o do rigor técnico que se exige de um simulador de voo. Este não é bem um jogo, embora possamos usá-lo como entretenimento. Que o digam os pilotos que usam simuladores para o seu treino pessoal. São, de facto, dois padrões importantes para ganhar de volta os fãs. Mas, há algo igualmente importante.
Uma das maiores falhas do já mencionado Microsoft Flight estava no conteúdo. Ou melhor, na falta dele. Embora visualmente apresentasse alguns passos em frente, apostou no conceito “free to play”, limitando-se a uma só região, a Big Island no Hawaii e um único avião, o anfíbio Icon A5, curiosamente também incluído nesta mais recente edição do MSFS. Tudo o resto que havia planeado para ser lançado neste simulador seria pago à parte, como blocos de conteúdo adicional. É uma fórmula que até funcionou em alguns simuladores militares e em vários jogos, mas que não caiu bem neste segmento em particular da simulação de voo civil. Ninguém pretende um simulador de voo limitado neste sentido. Se os demais simuladores civis apresentam todo o mundo e com vários tipos de aeronave, fomentando uma autêntica indústria de add-ons em redor, este modelo comercial do MS Flight claramente não funcionou.
Felizmente, o Asobo Studio e a Microsoft perceberam o que havia a fazer. Era preciso lançar um novo simulador, sim, mas com a mesma base de sucesso desta série. No entanto, também era preciso dar-lhe algo realmente inovador para justificar o regresso da franquia, agora que os rivais estão cheios de força. Era preciso pensar em grande, dar-lhe algo que todos os outros simuladores passassem a lutar para equivaler, uma nova fasquia de qualidade. Desde o início da sua produção que este simulador apostou sempre alto ao nível de cenário, físicas, meteorologia e até de efeitos visuais, tentando surpreender a cada novo vídeo ou imagem de promoção. Considerando que hoje em dia há tantos produtores de add-ons a fazer cenários, aviões e até meterologia e handling, havia muito para fazer.
Com toda a boa vontade da produção de voltar “às origens”, não quer dizer que não possa haver um modelo comercial mais “moderno”. Se hoje quiserem comprar o Microsoft Flight Simulator, já sabem, terão de optar por uma de três versões com três listas de conteúdo e três preços diferentes. A versão Standard inclui todo o simulador-base, adicionando 20 aeronaves que vão desde o icónico Cessna 152 ao gigante Boeing 747-8, além de 30 aeroportos detalhados. A edição Deluxe acrescenta mais 5 aviões e outros 5 aeroportos. Por último, a mais desejada edição Premium, soma 30 aviões e 40 aeroportos totais. Notem que falei apenas em aviões, uma vez que não está incluído, pelo menos para já, nenhum outro tipo de aeronave (embora no menu haja um separador para “outros”).
Contudo, estas não serão as únicas opções de extras para o novo simulador por muito tempo. Em jogo, temos já uma “Marketplace”, uma loja onde teremos no futuro mais módulos e extras para adquirir. E não serão apenas aeronaves e aeroportos de produção interna a chegar a esta loja digital. Empresas como a Aerosoft, PMDG, Orbx e tantas outras, já anunciaram estar a produzir novos DLC para este simulador. Ainda não é bem claro se os novos addons serão inteiramente comercializados nesta “Marketplace”, mas é bem possível que um bom punhado seja, havendo possivelmente algum espaço para as lojas digitais paralelas de terceiros. Ou seja, o futuro deste simulador já parece bastante rico em expansões previstas. Mas, fiquemos, para já, no presente.
Uma das principais diferenças que irão notar ao entrar no simulador é que os menus são agora bem mais modernos, fáceis de navegar e directos ao assunto. O enorme menu de voo é o principal destaque. É aqui que escolhemos a aeronave, o aeroporto de partida, a meteorologia e hora do dia do voo que queremos realizar. Só que o conceito é bem mais ergonómico e intuitivo. Temos agora um mapa do mundo, renderizado em tempo real com a meteorologia apresentada, hora do dia com fuso horário e até tráfego na região. Sim, podemos ver o tráfego de outros pilotos virtuais, mas também é possível ver o tráfego de aeronaves reais, a meteorologia de acordo com o estado do tempo mundial e até os painéis de partidas e chegadas dos vários aeroportos.
É também aqui que podemos criar um plano de voo. E, felizmente, este processo é agora francamente mais fácil e intuitivo. Basta escolher uma partida, um destino e, consoante o aparelho, rotas de alta altitude, baixa altitude ou até via GPS. O planeador é bastante robusto, dando-nos a opção de criar rotas com SIDs (procedimentos de partida por instrumentos), STARs (procedimentos de chegada por instrumentos), mas também RNAV, VOR-DME e outros procedimentos, desde que suportados pelos aeródromos. A informação de navegação é actualizada pelo próprio simulador, assim como a meteorologia que é injectada em tempo real e até possui capacidade de previsão por algorítmo. Tudo é depois compilado para o piloto num NavLog e até podemos seguir ponto a ponto com marcadores.
Criar um plano de voo para desfrutar do simulador, porém, pode ser um passo algo largo para muitos. Para muitos, basta apenas escolher um avião e um aeroporto de partida, seguindo daí para a aventura. Ainda me recordo das muitas vezes que fiz isto, partindo no velhinho Cessna 172 do extinto Aeroporto Meigs Field em Chicago no velhinho FS4. E a produção pensou nestes pilotos mais descontraídos. Para este tipo de voo, temos uma série de desafios para abordar. Podemos escolher fazer um simples voo de baixa altitude, estritamente visual ou testar a nossa perícia a aterrar em alguns dos aeroportos mais icónicos, mais espectaculares ou… mais difíceis do mundo. Uma das aproximações que recomendo é ao lendário aeródromo de Lukla no Nepal, com a sua pista em declive.
Contudo, um simulador também pode ser uma ferramenta de aprendizagem. E lá está uma importante e detalhada escola de voo, com missões interactivas. Estas lições de voo abordam várias etapas importantes para aprender a voar, desde os simples controlos de superfícies até às importantes noções de navegação por instrumentos. Achei estas lições francamente bem feitas e sempre com ênfase na acessibilidade, sem nunca serem realmente exaustivas. Considerem-nas a ponta de um “iceberg” gigante que, caso seja este o vosso primeiro simulador, será muito importante considerar. Claro que muitos vão saltar logo para os grandes jactos e ignorar estes pequenos passos iniciais. Mas, se quiserem aprender a fazer as coisas como deve ser, não se vão arrepender.
Porque muita da paixão pela aviação passa pelo apreço pelos próprios aviões, a produção também adicionou uma importante secção dedicada às aeronaves. No menu, há um enorme hangar onde podemos escolher colocar uma aeronave em destaque, podendo explorar cada pormenor da fuselagem ou do cockpit, além de ser também possível ler um pouco acerca do histórico operacional desta aeronave em questão. Alternativamente, quando escolhemos um avião para voar no menu de voo, também é possível personalizá-lo, colocando matrícula e prefixo de voo e tudo. Nesta fase, não temos pinturas adicionais nos aviões além das “default” mas também será possível escolher as pinturas de companhias aéreas no futuro.
De resto, o simulador apresenta-se bastante linear. Há uma secção que regista todas as nossas prestações, incluindo horas de voo, aterragens e outros registos. Há uma certa componente de progressão, permitindo-nos até ganhar alguns troféus por cada objectivo atingido. Esta progressão, já agora, contabiliza todas as horas de voo num logbook detalhado e ainda nos dá patentes por cada patamar atingido. Certamente que não será algo essencial para muitos mas é interessante acumular horas e ver que servem para alguma coisa. Estes simuladores de voo tendem a ser bastante directos ao assunto, evitando estes elementos de “jogo”. Neste caso, porém, houve outra abordagem.
Gostarão de saber que os menus são bastante sóbrios para consultar, dividindo-se bem entre parte técnica, acessibilidade e controlos. A primeira visa dar-nos as mais diversas opções de personalização técnica. Ou seja, é aqui que controlam as opções do visual, inclusive efeitos gráficos, o som, as preferências de uso, enfim, tudo o que esperam desta secção mais técnica. A parte da acessibilidade é para aqueles que precisam de ajuda no que toca ao controlo do avião, com diversas opções de simplificação e diminuição da dificuldade. A parte tão importante dos controlos é também bastante intuitiva, dando-nos a opção de atribuir teclas e eixos aos diversos equipamentos de controlo disponíveis, entre joysticks, pedais, controlos de potência, etc.
Uma muito importante secção no menu técnico, permite-nos também controlar a informação descarregada. Sabendo que este jogo possui uma forte componente online, meteorologia carregada em tempo real e também uma importante parte da renderização do cenário feita pela “cloud”, em várias horas, passando de região em região, o simulador deverá descarregar muitos GBs de informação dessa nuvem. Isto pode, não só limitar a largura de banda dos utilizadores, como exceder algum plano de dados que possuam.
Saibam que é possível limitar os downloads e até descarregar um ficheiro único de cache para evitar downloads constantes, sobretudo se voarem sempre na mesma área. Como devem calcular, há sempre um senão. Se optarem por descarregar um ficheiro de cache, convém que o renovem com alguma frequência. Por outro lado, limitar a largura de banda nos downloads, também pode criar alguns artefactos com menor resolução em cenários mais complexos.
Falarei na segunda parte sobre outras questões relacionadas com o visual. O novo MSFS não aparenta ser muito exigente com o vosso PC, de facto. Mas, no que toca a largura de banda, é um título exigente da vossa internet. Voar com meteorologia real, com outros aviões gerados online e ainda transitar por áreas densas em objectos (por exemplo, Nova Iorque), pode criar algumas questões de largura de banda. Recomendo vivamente que deixem os outros downloads parados quando voarem por aqui.
Este é, sem dúvida, um simulador de voo moderno. Não tenta propriamente reinventar o conteúdo, nem o interface. O Microsoft Flight Simulator quer, isso sim, dar tudo o que é preciso para que os pilotos virtuais sintam o prazer de voar, ao mesmo tempo que fornece as ferramentas intuitivas para quem quer levar as coisas um pouco mais a sério. É certo que muitos dos módulos de terceiros ou addons serão o verdadeiro foco dos utilizadores daqui a uns tempos. No entanto, o que já traz de raiz nas suas três edições é francamente rico. Arrisco dizer que esta é uma das melhores evoluções de sempre na franquia, a alvejar já o futuro deste segmento tão distinto.
Contudo, ainda nem sequer falei da simulação em si. E também me falta falar do visual do jogo. São duas importantes componentes num simulador de voo.
Para isso, sigam a Parte Dois e a Parte Três!
- ProdutoraAsobo Studio
- EditoraMicrosoft Game Studios
- Lançamento18 de Agosto 2020
- PlataformasPC
- GéneroSimulação
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Interface bem mais sóbrio e intuitivo
- Oferta para descontrair ou levar "mais a sério"
- Acessibilidade para novos pilotos
- Bastante conteúdo base, ainda sem addons
- O preço algo elevado dos pacotes especiais
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.