Análise – Octopath Traveler II
O tempo que passámos com Octopath Traveler 2 revela que o jogo melhorou praticamente em todos os aspectos. No entanto, se não gostaram do primeiro, será que suficiente para mudar a vossa opinião?
Quando dizemos que um jogo é “mais do mesmo”, geralmente fazemo-lo com algum desdém. Muitas vezes não aconselhamos a compra de um título por ser muito semelhante ao seu antecessor, por não evoluir na oferta ou simplesmente porque soa a repetição. Contudo, no rigor da expressão, “mais do mesmo” não significa forçosamente algo negativo. Há vários casos de jogos que repetem a fórmula porque pretendem oferecer mais aos jogadores sem mudar paradigmas. Entre isso e alterar profundamente as coisas, por vezes mais vale a repetição.
No caso de Octopath Traveler II, a sequela do emblemático JRPG lançado em 2018 é um bom exemplo de como se pode aplicar positivamente esta expressão. Se gostaram do primeiro jogo, não vão perder o segundo capítulo. Se houver alguns aspectos que não apreciaram, desta vez pode ser diferente. Na nossa análise, vamos explicar como isso pode acontece e, muitas vezes, com comparações com o primeiro jogo. Isto porque… bem, é “mais do mesmo”, como uma segunda oportunidade.
Tendo em mente que nem todos jogaram o primeiro Octopath Traveler, vamos começar por explicar que se trata de um JRPG deliberadamente antiquado, caracterizado por uma peculiar arte de píxel que mistura 2D e 3D, tem combate aleatório por turnos (como nos antigos Final Fantasy) e oito histórias que se cruzam apenas no final. Seria assim que descreveríamos o primeiro Octopath Traveler mas, na verdade, estamos a falar da sua sequela. E não ficamos por aqui nas semelhanças.
Octopath Traveler 2 é idêntico ao seu antecessor em todos os aspectos. E isso também se aplica à questionável escolha de contar oito histórias centradas em muitos protagonistas que idealmente viajam juntos, mas que na verdade quase nunca estão juntos. Excepto no tal epílogo, o final comum mencionado acima que, desta vez, não envolve uma missão secundária. Numa das poucas diferenças, já agora, essas missões secundárias são mais longas e articuladas e envolvem dois viajantes, mais próximas da nossa ideia tradicional de missões paralelas num RPG japonês.
A maior interacção entre os oito viajantes não revoluciona a narrativa. No entanto, foi melhorada devido ao simples facto das oito histórias, em média, terem sido escritas com mais cuidado. Mesmo a personagem menos marcante, a aspirante a diva Agnea, acaba por ter o seu próprio enredo. Os novos viajantes podem parecer uma remodelação dos oito que os precederam (de certa forma são) mas as suas histórias são cativantes e variam entre vários géneros, com um índice narrativo significativamente mais adulto. Os amantes de literatura certamente reconhecerão as inspirações em Sherlock Holmes ou Conde de Monte Cristo.
Reconhecendo que as histórias dos viajantes permanecem principalmente autónomas, também notamos uma melhoria geral no ritmo das várias narrativas. Aqui as histórias tendem a ser menos fragmentadas, muito por causa da estrutura aberta de exploração. Mais uma vez, a formula repete-se, com um protagonista ou personagem principal a ser escolhido e, tendo completado o seu capítulo inicial, vai recrutando os outros viajantes na ordem que o jogador preferir.
Esta parte da jogabilidade não sofreu mudanças significativas. O jogador é livre de ordem dos companheiros, mas essa liberdade perde valor diante da força bruta dos inimigos que separam os capítulos das histórias. O nível recomendado dos vários capítulos, na verdade, sugere a ordem em que devem ser jogados. Ao seguir essa ordem, porém, percebi que a narrativa tem um ritmo muito preciso. Alguns detalhes ajudam a reforçar a ideia de que as oito histórias ocorrem todas no mesmo novo mundo, Solistia, que permite abordar a aventura mesmo sem ter jogado o primeiro título.
Felizmente, não é a sua estrutura particular que diminui o ritmo da narrativa. Mas, a própria jogabilidade é agora a culpada. A produtora melhorou o mecanismo de Travel Actions, as habilidades especiais que os viajantes podem usar para interagir com NPCs. Agora estão duplicadas, já que cada viajante tem uma para o dia e outra para a noite. O ciclo dia/noite não influencia a jogabilidade, limita-se apenas a redistribuir os personagens não jogáveis nos cenários, por vezes estando ligado à resolução de alguns quebra-cabeças ou missões secundárias.
No entanto, para mim estas Travel Actions pareceram demasiado redundantes. Já vimos a maioria delas no primeiro Octopath Traveler, mas as outras são simplesmente variações do mesmo mecanismo. A título de exemplo, Osvald pode examinar personagens para conhecer as suas histórias durante o dia, enquanto à noite Hikari pode fazer o mesmo subornando-os com dinheiro. Osvald também pode lutar contra outras personagens à noite: se vencer, extorquirá objectos valiosos deles. Hikari pode enfrentá-los num duelo, mesmo durante o dia, para aprender até um máximo de cinco técnicas de combate. Enfim, redundante, como disse.
No geral, este exemplo serve para vos passar a ideia que as Travel Actions são todas um pouco semelhantes e, em certas formações, correm o risco de se sobreporem umas às outras. De certa forma, isso faz sentido porque o jogador não pode levar os oito viajantes consigo o tempo todo, mas apenas quatro. Mas, por outro lado, isto quebra imenso o fio condutor de uma história que ser quer corrida, com eventos reciclados com apenas certas nuances e contribuindo bastante para o factor “repetição”.
Sim, as Travel Actions são mais interessantes do que no primeiro jogo. São objectivamente mais variadas e articuladas e resolver missões secundárias ou angariar consumíveis, armas ou armaduras que teriam um preço alto nas lojas. Na prática, senti-me quase obrigado a vasculhar cada personagem em cada cenário com todas as Travel Actions possíveis, primeiro durante o dia e depois à noite, o que pode ser uma tarefa fastidiosa. Embora seja fácil alternar entre eles (um botão) essa dinâmica tende a prender-nos numa espécie de “transtorno obsessivo-compulsivo” que acaba por desacelerar drásticamente a exploração.
Apesar desta crítica, Octopath Traveler 2 continua a ser um título repleto de segredos e oportunidades para os mais curiosos e persistentes, numa boa parte devido as estas novas dinâmicas de jogabilidade. Cada cenário esconde algo, muitas vezes por trás de jogos de perspectiva habilidosos, por exemplo. Assim, a exploração nunca termina realmente, havendo sempre coleccionáveis ou bónus para descobrir ou talvez uma técnica secreta ou um NPC especialmente poderoso para recrutar e levar para a batalha.
O ciclo de dia e noite tem um aspecto ainda mais interessante em termos de jogabilidade. À noite, os inimigos são mais agressivos e poderosos mas também concedem muito mais pontos de experiência. Esta lógica simples pode ser usada por jogadores que gostam de acção e não se importam de lutar a cada dois passos. Por outro lado, aqueles que preferem uma experiência mais relaxada, podem fazê-lo durante o dia… talvez equipando a habilidade de Manobras Evasivas de Sage, fica a dica.
O sistema de classes foi mantido quase intacto desde o primeiro jogo, com muitos pontos para acumular e gastar em novas habilidades e classes secundárias para serem atribuídas a experimentar, tendo muitas estratégias e combinações possíveis. As novidades limitam-se essencialmente às habilidades EX e às quatro novas classes adicionais, que são desbloqueadas muito mais cedo do que no passado e… de uma maneira muito particular. Prefiro não detalhar para não estragar a surpresa.
No combate, o foco é agora nas condições de Domination e Power. A primeira ocorre quando o jogador acerta no ponto fraco do inimigo usando as armas corretas ou a magia elemental e, ao fazê-lo, reinicia os seus escudos. Nesse momento, o inimigo perde um turno e sofre muito mais danos. A mecânica de Domination não só é usada para concluir batalhas mais rapidamente mas também para interromper ataques devastadores. Lutas contra bosses giram em torno desta dinâmica de jogo.
Quanto a Power, por outro lado, é uma condição em que o viajante entra quando consome um ou mais Pontos de Poder acumulados, turno após turno. É um sistema que me lembra bastante de Bravely Default, na verdade. Na prática, permite realizar ataques várias vezes no mesmo turno ou, em contrapartida, melhorar uma habilidade específica.
Aprender a aproveitar Domination e Power é imperativo. Posso já avisar que Octopath Traveler II não é tão exigente, como o seu antecessor, mas continua a ser um JRPG japonês mais desafiante no geral, com algumas lutas contra bosses particularmente brutais. Como habitual, o conhecimento do jogo, uma boa estratégia na formação da equipa e alguns níveis de experiência adicionais podem fazer toda a diferença.
As lutas, no entanto, não duram tanto tempo como no primeiro jogo. Contra bosses parecem ser muito menos exaustivas e, em geral, a curva de dificuldade parece estar melhor equilibrada, com uma distribuição justa de inimigos tanto de dia como de noite, tendo também uma maior variedade de armas, habilidades e magias que ajudam a induzir a condição de Domination com mais frequência.
Também gostei da introdução dos Latent Powers. São verdadeiros super-movimentos que se aprendem muito rapidamente, tendo um curto cooldown. Em vez de ser uma habilidade especial para usar no momento certo, foi projectada para ser usada frequentemente. Mas, nem todos estes ataques me convenceram, como o de Throné, que lhe dá apenas uma acção extra no mesmo turno. Outros, no entanto, são muito mais interessantes na sua simplicidade, como a capacidade de Osvald de concentrar os seus feitiços de múltiplos alvos num só com combinações devastadoras.
Em suma, o sistema de combate e personalização da jogabilidade foi amplamente inspirado na experiência do primeiro jogo Octopath Traveler, mas a Acquire limou algumas arestas e ouviu as críticas sobre o equilíbrio do primeiro jogo. Assim, suavizou a curva de dificuldade e introduziu pequenas nuances que tornam o combate por turnos mais articulado. Aqueles que apreciaram o predecessor pela sua brutalidade, no entanto, podem ficar descansados. Entre masmorras e bosses secretos, este continua a ser um título capaz de vos derrotar sem piedade.
“Mais do mesmo”, repito, mas bem feito e melhor, portanto. Esta filosofia é ainda mais refletida na forma como o jogo é apresentado visualmente. Joguei Octopath Traveler 2 na PlayStation 5 e chamá-lo de sublime parece ser um eufemismo. A pixel art é um verdadeiro triunfo, com cada cenário a transbordar detalhes e até mesmo os pequenos mapas que separam os centros habitados parecem desenhados de um maneira mais cuidada, linear e nada trivial, sobretudo se compararmos com os muitos becos sem saída do primeiro jogo. Tudo graças ao Unreal Engine 4.
Veredicto
A equipa da Acquire conseguiu melhorar a fórmula, mesmo sem inovar quase nada. No entanto, na ânsia de corrigir tudo o que estava errado, Octopath Traveler 2 acabou por reproduzir as dinâmicas e as soluções em excesso do primeiro jogo, começando pela narrativa pouco inspirada que ainda afastará aqueles que preferem histórias mais sérias. Isto, apesar da trama estar inquestionavelmente bem escrita. É difícil aconselhar este jogo a quem não jogou o primeiro ou a quem o jogou e queria algo novo aqui. Agora, quem quiser repetir a “dose” com algumas nuances, tem já a devida justificação para este investimento.
- ProdutoraAcquire
- EditoraSquare Enix
- Lançamento24 de Fevereiro 2023
- Plataformas
- GéneroRole Playing Game
Este título ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Histórias melhores e mais envolventes
- Jogabilidade mais equiibrada que no primeiro titulo
- Grafismo em Pixel Art
- Travel Actions parecem desorganizadas
- Em muitos aspectos é quase idêntico ao primeiro titulo
- Por vezes muito difícil
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.