Análise – Returnal [Actualização: PC]
Este foi um momento especial para mim, revisitar Returnal, agora no PC. Isto porque, se lerem a análise original em baixo, notarão que foi (e ainda é) um óptimo jogo da PlayStation 5, um autêntico desafio a ultrapassar.
Depois desta análise, voltei ao jogo várias vezes, metade numa atitude algo masoquista de “sofrer” novamente pelos seus implacáveis bosses, outra metade porque, de facto, esta é a essência deste roguelike: temos de o jogar novamente, terminá-lo várias vezes, para descobrir as sua verdadeira oferta. É, aliás, curioso que a história não se conclui na primeira vez que chegamos ao pretenso (primeiro) fim. Tal como a sua jogabilidade que serve de base, também há um ciclo na trama geral. Confesso que não me surpreendeu muito o que acabamos por descobrir mas, o primeiro impacto foi mesmo impressionante.
Esta constatação leva-me a uma sensação interessante. Agora que revisito novamente este título no PC, não sinto que tenha o mesmo impacto que na versão original na PS5, mesmo quando o repeti. Tirando as diferenças que já mencionarei entre as versões, os principais privilegiados deste port serão mesmo o que jogarão Returnal sem o conhecer, que o descobrem pela primeira vez e que passarão a sua história empolgados com os mistérios de Atropos e o que reserva para a protagonista Selene.
É óbvio que é para eles que este jogo irá servir, os que não sabem o que os espera. Porque, quem jogou na PS5, a não ser queira voltar tudo atrás e começar do zero só mesmo pelo desafio, não sentirá grande apelo a reviver todos os momentos menos positivos do jogo, como a sua dificuldade extrema em alguns sectores e os seus incrivelmente espaçados “ciclos” de jogo. Como já disse, é preciso também equacionar a atitude “masoquista” e o puro desejo de jogar novamente um óptimo desafio noutra plataforma. Talvez essa justificação chegue para alguns.
É preciso dizer que meses depois de inúmeros “soluços” técnicos e falhas de conceito frustrantes, a Housemarque batalhou sériamente para polir o que era necessário no jogo. E este título beneficiou bastante dos vários ajustes e correcções introduzidas, por exemplo, um muito solicitado sistema de salvamento de progresso na actualização 2.0, que permite salvar o jogo a meio de um ciclo e voltar mais tarde. Não será bem o que estão à espera. Só há um slot para usar e é reciclado a cada reinício de um ciclo. Serve só mesmo para “ir ao café” e não ter de deixar o jogo na pausa.
Estou profundamente convicto que, agora no PC, a comunidade de modding haverá de, pelo menos, pensar num mod para salvar o progresso do jogo. Não sei até que ponto a acção e a jogabilidade seriam beneficiadas por salvar frequentemente, honestamente. A produção não irá, com quase toda a certeza alterar, nem a dificuldade, nem o esquema de saves. Como disse em baixo, este é um jogo divisor, não é, de facto, para todos os gostos. Returnal é intencionalmente um jogo difícil, que recompensa pela persistência e pela melhoria na forma de jogar.
A nível de conteúdo, terão nesta nova vida do jogo tudo o que foi lançado originalmente, incluindo o modo cooperativo (agora também jogável entre PC e PS5) e a infame Torre de Sísifo. O modo cooperativo adiciona uma nova dimensão ao jogo, podendo juntar-nos a um amigo ou desconhecido para partilhar a aventura (e a tortura). A Torre em si é um modo infinito que explora bem os contornos do combate do jogo, numa espécie de desafio escalado em vários níveis. São curiosas alternativas para jogar.
Ao chegar ao PC, o já mencionado trabalho de polimento nas lógicas e na própria interacção, criam um jogo francamente sólido nesses aspectos. O port também obrigou a uma série de ajustes e adições, estes de carácter mais técnico. Sim, o jogo é agora compatível com monitores ultrawide suporte para Nvidia DLSS e DIS ou AMD FSR 2 para melhor optimização e ainda várias opções de ajuste e optimização para melhor tirar proveito do hardware. A versão PS5 era já um marco de qualidade, no PC brilha ainda mais, inclusive com o recurso ao comando DualSense.
Graficamente, este é, de facto, um daqueles jogos que quase podemos chamar de “obrigatórios”, isto sabendo que já na PS5 era um óptimo showcase das capacidades da consola. Há determinados momentos em que a iluminação e sombras proporcionadas pela tecnologia Ray Trace criam cenas arrebatadoras. Os tons permanentemente escuros do jogo, contrastam muito bem com os efeitos de luz das armas alienígenas, especialmente em bons monitores, como o que pude testar este jogo.
Contudo… tanto brilho tem um revés. Mesmo usando um PC que ultrapassa o hardware recomendado, há uma certa inconsistência na performance. Especialmente antes de entrar em novas áreas, notei alguns “stutters” que quebram bastante o ritmo fluido que o jogo tenta sempre manter. Tive também uma série de crashes, algo que num jogo sem savegames só adiciona mais frustração. Escusado será dizer que os PCs não são consolas e as diferentes configurações de hardware não são fáceis de prever. Mas, aquela “run” perfeita… perdeu-se!
Veredicto da versão PC
Este foi um jogo que marcou um ponto importante de afirmação da PlayStation 5 como hardware capaz de criar momentos visualmente fantásticos. No PC, não seria de esperar que Returnal fosse uma experiência inferior, pelo contrário. De facto, este visual deslumbrante, graças ao hardware (ainda mais) capaz, aliado a já reconhecida qualidade na interação e narrativa, criam um jogo fantástico, também no PC. Só tenho a lamentar alguma necessidade de polimento que, certamente, será abordada em futuras actualizações. O jogo merece a vossa paciência.
[Análise original PS5 de 29 de Abril de 2021]
De vez em quando, surge um ou outro jogo que nos desafia. Ao ponto em que achamos que, afinal, precisamos de “treinar” mais. Até há pouco tempo, achei que os títulos Souls seriam o pináculo da dificuldade, dando-nos o verdadeiro desafio de melhorar a cada morte inusitada. O tal infame “kit de unhas”. Returnal, porém, acabou por distorcer completamente essa minha percepção.
O estúdio Finlandês Housemarque já me tinha surpreendido com outros jogos em que nos desafia. Lembram-se de Super Stardust? Ou de Resogun ou Dead Nation? Eu recordo-me muito bem do desafio tantas vezes frustrante de Matterfall. À sua maneira, a Housemarque gostou sempre de “torturar” os jogadores com desafios peculiares, não necessariamente impossíveis ou extremos mas, ainda assim, suficientes para nos fazer suspirar a cada nível passado. Não podemos comparar Returnal a mais nada que a produtora tenha feito, porém. Arrisco dizer que é o seu primeiro grande jogo, especialmente porque se estreia como título exclusivo da PlayStation 5. Contudo, se conhecermos bem o ADN da produtora, já sabemos onde isto vai parar.
A exploradora espacial Selene tem um problema. Não, não é o facto da sua nave se ter despenhado num planeta Alienígena. Só por si, seria já uma questão grave para resolver. Também não são os estranhos residentes ou a fauna extremamente agressiva e pouco dada a conversar que a atormentam. A questão principal que prende a atenção da protagonista (e dos jogadores) é o enorme mistério que se desenrola logo no primeiro minuto de jogo. Após sair dos escombros da sua nave, Selene descobre o corpo de um outro astronauta com marcas de violência. E é… ela própria. Quando tenta fazer sentido disto tudo, é atacada pela tal fauna hostil e acaba por (eventualmente) morrer. Fim do jogo? Não! Acordamos novamente praticamente no mesmo sítio e o ciclo repete-se… Bem vindos à realidade cíclica de Atropos.
Recuando um pouco atrás, na verdade Selene está na órbita deste planeta para estudar um estranho sinal que está a ser emitido algures da superfície, o chamado “White Shadow”. Para tentar perceber a sua origem, Selene entra em espaço aéreo proibido e é por isso que acaba por ver a nave danificada, obrigando-a a fazer uma aterragem forçada. Depois de perceber que há um ciclo que a prende “no momento” após a queda, Selene parte pelo planeta em busca desse sinal misterioso. Pelo caminho, porém, faz descobertas sobre si própria, entendendo que esta jornada é bem mais profunda que uma simples investigação científica. Mais não digo, para não vos estragar a história que se vai desenrolando.
Já deu para perceber que este jogo pretende ser uma variante do género “Rogue Like” ou “Roguelite”. Todos os níveis possuem uma componente aleatória, fazendo com que cada passagem seja diferente, mesmo que algumas secções sejam francamente familiares. Aqui e ali, há alterações subtis nas jogabilidade, seja na arma que empunhamos, a posição dos inimigos ou de armadilhas ou até a quantidade e posição de segredos e bónus do jogo. Por outro lado, há uma clara inspiração nas lógicas de ritmo de títulos como Dark Souls. Também aqui temos de estudar nesse ritmo único e tentar não cometer erros que nos custem a vida… ou enfrentam a infame permadeath e o reinício de… bom, o reinício de tudo.
Este é, no rigor, um jogo de acção na terceira pessoa (Third Person Shooter). Tal como em muitos outros jogos deste género, temos pistolas, carabinas, caçadeiras e outras armas que irão apanhando em determinados baús de bónus que, incrivelmente, os extraterrestres deixaram para trás. (Atenciosos). O que determina a qualidade e efectividade das armas é a sua proficiência, uma das barras que se vão preenchendo e que, a cada nível, aumentam danos, tiros especiais ou outras características das armas. O manuseio destas armas é perfeitamente linear, de encontro ao que já viram em qualquer outro TPS que se preze. Convém disparar e acertar nos imensos perigos que se cruzarão connosco, sim, mas não é só aí que precisam ser eficientes.
Para ajudar Selene a sobreviver a este mundo hostil, temos algumas habilidades importantes para dominar. Muitos dos níveis são verticais, pelo que o seu jetpack permite saltar por elevações, além de poder usar o “dash” para rapidamente se desviar. Também aqui achei que a cambalhota de Dark Souls foi homenageada. Enfim, quantos jogos já não possuem desvios “glorificados”? Na maior parte do tempo, saltar, correr e desviar é a principal estratégia entre cada disparo. Nos primeiros minutos, aliás, Returnal parece um shooter perfeitamente banal, sem recarregamento das armas (há apenas um cooldown) e uma acção perfeitamente linear. Vamos de A para B, podemos mudar de biomas aqui e ali, morrendo pelo meio, regressando ao início, melhorando de prosseguindo adiante. Rebobinar, repetir.
Aliás, se o jogo fosse apenas isso, seria profundamente aborrecido, mesmo com os mapas em constante mutação e algumas surpresas pelo meio. A fórmula dos roguelite precisa compensar os jogadores pela sua persistência mas não sei se a produção está perfeitamente ciente disso. Já lá vamos. Quando percebermos que temos vários bónus para desbloquear, bem além das já mencionadas armas, é que começamos a descobrir a verdadeira essência de Returnal. Afinal, este jogo não depende tanto assim da nossa perícia no gatilho, por que iremos morrer na mesma sem uma boa estratégia e alguma ajuda adicional. Como o jogo vai evoluindo na sua dificuldade, também depende de ir melhorando estratégias, desbloqueando bónus fixos e temporários, jogando com algumas cedências em alguns deles.
Os bónus fixos tem de ser “comprados” reunindo cristais chamados “Obolites” que são recuperados de inimigos caídos, formações rochosas e outros locais. Depois, é preciso “bancar” esta divisa em conversores disponíveis em algumas secções dos mapas. É essencial estudar bem qual bónus escolher num destes “fabricators”, uma vez que há alguns que farão mais falta que outros, como bónus de danos em armas ou menos danos sofridos por Selene. Achei que alguns são residualmente eficazes, preferindo mais os bónus temporários a curto prazo. Ainda assim, porque acumulam em cada ciclo, é mesmo recomendando que invistam Obolites de forma consciente.
Os bónus temporários, porém, são isso mesmo… temporários. Morremos e perdemo-los, inevitavelmente. Temos também outros bónus “consumíveis” mas esses são de uso único e ainda mais voláteis porque temos poucos slots (até três, um apenas ao início) para os carregar. E ainda temos alguns itens e parasitas “corrompidos”, chamados de “malignant”, que conferem bónus interessantes mas também penalizações chatas. Por exemplo, um parasita que nos dá um boost maior no jetpack, passa a conferir danos nas quedas maiores. Notem que também aqui há uma elevada dose aleatória nos bónus e nenhum estará onde o viram na última passagem.
Infelizmente, esta lógica de bónus aleatórios parece-me um tanto desequilibrada. Selene tem uma barra de vida muito curta e os danos sofridos são devastadores, especialmente com inimigos mais fortes. Não há uma regeneração de energia propriamente dita, algo que gostaria de ver, nem que fosse em algumas transições de secção. Alternativamente, como uma opção na dificuldade do jogo. No final de cada bioma, há um boss fortíssimo, uma grande “esponja de balas”, que temos de estudar para aprender cada movimento com atenção. Sem nenhuma mecânica de recuperação de energia (além de um escasso medpack consumível), podemos chegar a esse Boss com menos energia ou bónus. Nesse caso, o desafio será bastante mais difícil (senão impossível).
Comentarão os puristas que adoram desafios difíceis que, se calhar, é só preciso melhorar a forma como jogamos. De facto, considero que o jogo possui secções que, com a devida perícia, até são relativamente fáceis. Mas, fruto de uma oscilação de dificuldade que achei também muito aleatória, podemos morrer logo a seguir com duas ou três falhas não forçadas. Não há margem para fugir sempre, até porque algumas secções são “seladas” até matarmos todos os inimigos. E nem me façam falar em algumas salas secretas que tanto podem ter bónus interessantes, como um inimigo absurdamente poderoso. Aquilo que concluo ao fim de umas horas de jogo, é que se não fizerem uma run “perfeita” até ao boss, ganhando adrenalina (o equivalente a Stamina noutros lados), proficiência de armas alta, energia completa e alguma sorte, nem vale a pena visitar o sujeito.
Gosto de um bom desafio, adoro mesmo melhorar como jogo, para finalmente derrotar o famigerado boss que me matou “n” vezes. No entanto, não gosto de jogos que punem sem justificação. Prefiro sentir que cada novo nível me recompensa por jogar e não me mata porque “não tive sorte” no “sorteio” de níveis aleatórios. E voltar à nave depois de morrer, parece-me “preenchimento” para justificar mais uma horas de jogo. Podemos sempre teleportar-nos em algumas secções, evitando vastas porções dos mapas. Mas, quando transitamos entre os vários biomas e temos de voltar atrás para onde já passámos inúmeras vezes, é inevitável ficar um tanto aborrecido com a repetição. Isto, repito, mesmo com o elemento aleatório das secções dos mapas. Se estes mapas fossem fixos e lineares, então, ainda mais aborrecido seria transitar tudo, vez após vez.
Para isto, nada contribui a sensação de evolução lenta que o jogo tem. Demasiado lenta, pouco compensadora e só fixada em tornar a vida difícil à protagonista. Não há recompensa nenhuma em matar os alienígenas, por exemplo, nem mesmo os poucos Obolites que largam. Não há um powerup espectável, como um bónus de energia ou escudo recarregável, que evite que morramos tantas vezes. Há momentos em que me senti frustrado com esta incerteza do que esperar, especialmente na parte final do jogo. Nem sequer o modo de jogo opcional, disponível no computador na nave, que nos desafia a entrar num quadro de liderança mundial com desafios de pontos ou de tempo me entusiasmou muito. Honestamente, ignorei, igualmente pela falta de bónus tangíveis e apetecíveis.
Se não se sentirem frustrados pela sua dificuldade desequilibrada ou falta de incentivo a progredir, talvez parem um pouco para apreciar as proezas técnicas que tiram proveito do potente hardware da PlayStation 5. Returnal é um jogo deslumbrante, tecnicamente exemplar, cheio de pormenores técnicos de excelência que se enquadram muito bem no seu ambiente de mistério e no género Sci-fi. Confesso que alguns modelos dos alienígenas me impressionaram pela escala, pelo design ou pelas animações. Atropos é também um protagonista, com os seus vários biomas e mapas em constante mudança. Tudo emana qualidade, sem que notasse grandes falhas de conceito ou algo mais assinalável neste plano técnico.
Tenho ainda de destacar dois pormenores que me surpreenderam e que são só possíveis na PlayStation 5. Adorei o Áudio 3D que nos faz literalmente mergulhar nos estranhos sons de um planeta alienígena, aliado a uma banda sonora que confere o “stress” perfeito do que se passa no ecrã. Acreditem, joguem com auscultadores e entenderão o que digo. Num excelente complemento desta imersão, está a perfeita integração com comando DualSense, arriscando dizer que é mais um dos melhores aproveitamentos das suas capacidades. Sejam os gatilhos adaptativos muito bem calibrados ou o feedback háptico excepcional, o comando é também um destaque. Desde os pingos da chuva sentidos na vibração, ao pressionar sensível do gatilho das armas, este é um dos melhores showcases das capacidades deste comando.
Veredicto
Tenho a certeza absoluta que Returnal será um jogo divisor. Estou certo que muitos adorarão a sua dificuldade aleatória, enquanto outros não ultrapassarão a frustração de morrer em catadupa sem grande justificação. Considero que essa dificuldade precisava de um balanceamento, nem que fosse algumas opções para facilitar um pouco ou, pelo menos, umas lógicas mais acessíveis para quem não tem “aquela” paciência. Entendo o alcance de um jogo difícil, gosto mesmo desse desafio dos tais jogos que “não nos levam ao colo”. Mas, há limites na nossa paciência quando o jogo recompensa o perfeccionismo e não tanto a persistência. Por causa disso, muitos pousarão o comando bem cedo, mesmo depois de verem como é tecnicamente deslumbrante, em especial pela sua integração de Áudio 3D e do DualSense. Ainda assim, persistam…
- ProdutoraHousemarque
- EditoraSony Interactive Entertainment
- Lançamento30 de Abril 2021
- PlataformasPS5
- GéneroAcção, Roguelike
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Graficamente deslumbrante
- Integração excepcional do DualSense
- Áudio 3D espectacular
- Dificuldade um pouco desequilibrada
- Progressão demasiado lenta
- Alguma repetição, mesmo com tantos elementos aleatórios
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.