Análise – Riders Republic
Se pudermos apontar uma especialidade da Ubisoft, será obviamente o género “sandbox”, com actividades de mundo aberto à exploração. Riders Republic explora essa sua “queda” para mundos gigantes com actividades avulsas e uma forte componente social. Na verdade, não há muita coisa nova aqui, apenas uma nova exploração de um conceito de longa data.
A experiência passada da Ubisoft fica bem clara neste jogo. Temos aqui uma óbvia revisão do conceito da série Steep, com a inclusão de mais desportos extremos além da neve, com mecânicas e lógicas de vários outros títulos Ubi, com especial destaque para os elementos sociais de The Crew, aqui, obviamente, sem automóveis. De facto, quase podia dizer que estes dois jogos fundem num só, removendo e adicionando ingredientes para tentar criar algo único. Nem tudo funciona como o pretendido, como irão ver. O que funciona, contudo, consegue entregar um título de desportos radicais, repleto de actividades para ir descobrindo, sendo sempre muito competitivo e dando recompensas para os mais persistentes. Só temos de nos perguntar se queremos mesmo investir em mais um jogo destes.
Para ser sincero, nunca acabei o modo de carreira de Steep. Ou melhor, nunca concluí todas as provas, uma vez que o jogo não tinha propriamente um “fim” anunciado. Simplesmente, nem todos terão a paciência de cumprir todos os desafios, garantindo sempre a melhor prestação num jogo tão vasto. Havia tanto para fazer que aborreceu-me. Penso que o intuito da Ubi foi criar um jogo que durasse, que desse muitas coisas para o jogador “ir fazendo”. A tal ponto que ainda lançou vários DLCs e duas grandes expansões (os Winter X Games e os Jogos Olímpicos de Inverno 2018), num suporte e adição de conteúdo que durou quase 3 anos. Mesmo assim, não encontrei paciência para voltar ao jogo, muito menos para fazer tudo o que oferece.
Por outro lado, sempre achei que esta fórmula “radical” num tom, por vezes, demasiado ligeiro não funciona muito bem em jogo. Bem sei que dificilmente a Ubi conseguiria transmitir a adrenalina criada pelos chamados “desportos radicais”. Mas, sempre achei que a abordagem foi algo descontraída demais, por vezes desconsiderando o potencial de criar algo mais… vá lá, “dramático”. Por mais que a Ubi tentasse, esquiar numa escarpa ou deslizar pelo ar num parapente ou num wingsuit, até pode ser bastante Zen mas não entusiasma ao fim de duas horas a repetir provas e a tentar não cair (muito). Aborreceu-me, sinceramente. Isto, mesmo gostando tanto do seu visual e de outros detalhes. Era um mau presságio para Riders Republic…
Mas, calma! Não pensem que o estúdio Ubisoft Annecy criou aqui apenas um “Steep 2”. Sim, temos novamente os Skis, Snowboard, Parapente e Wingsuit e até temos algumas montanhas geladas para “matarmos saudades” desse jogo. Contudo, logo no arranque fica bem claro que há mais ingredientes na fórmula. O grande destaque aqui são as bicicletas, entre as provas de acrobacia e o BTT com downhill. Aliás, uma boa parte do jogo, especialmente no início, é dedicada a dominar as “biclas” na lama, quase até à exaustão. Só começarão a ser introduzidos aos demais desportos lá mais para a frente, aguardando ainda mais pelos desportos aéreos.
Antes de mais, um paradoxo. Num jogo tão focado na competição, por qualquer motivo a Ubi decidiu juntar um modo mais descontraído chamado de “Zen Mode”. Consiste em explorar o vasto mapa sem qualquer tipo de competição ou progressão e cujo objectivo é recuperar esse elemento “pacífico” de explorar um mapa como actividade de lazer. Seria uma óptima forma de descontrair e socializar, admito… se estivessemos lá! Sendo um videojogo, parece-me perfeitamente desnecessário. Até porque podemos fazer exactamente o mesmo no modo de carreira regular, apenas temos de evitar as zonas de prova ou passar por elas sem as activar. Enfim.
Será no tal modo de carreira que quererão investir. Uma vez mais, a Ubisoft aposta numa espécie de “enredo”, em que somos um tal “super” atleta, com algumas personagens para interagir, numa tentativa de introduzir aqui uma espécie de “Role Play”. Sinceramente, é uma história que não tem grande interesse ou envolvência. Inicialmente, o tutorial é bastante interessante para conhecermos o que o jogo oferece e para perceber como interagir. Contudo, cada personagem e cada cena intermédia são francamente acessórias e não adicionam nada à experiência. Pelo contrário, só interrompem o ritmo. Felizmente, podemos saltar todas estas cenas intermédias. Só precisam saber que cada personagem dará provas para participar ou tem um espaço para visitar. O resto é uma enorme perda de tempo (e recursos da produção).
Quando nos deixam jogar, até corre tudo bem. Como já disse, vamos passar imenso tempo nas bicicletas e ainda bem. Este novo desporto é das melhores experiências em jogo, tendo das melhores provas e interacções. Fazer downhill a “abrir”, para depois subir uma rampa, saltar numa pirueta e aterrar, ao mesmo tempo que navegamos entre passagens estreitas e lamacentas, não tem preço. Para mim, é o desporto mais entusiasmante e divertido de Riders Republic, contendo também algumas corridas lineares que transmitem bem a sensação de velocidade. Notem que é possivel colocar-nos na perpectiva da primeira pessoa, o que aumenta ainda mais essa sensação.
Outro desporto que colocaria logo a seguir nos meus preferidos, é o Ski ou Snowboard. Regressam as provas de descida, assim como as provas de perícia, premiando tanto os mais rápidos, como os maiores malabaristas no ski ou na prancha. Notem que podem escolher dois tipos de controlo nos comandos, um que privilegia os comandos analógicos, outro que privilegia os botões. Podem ainda escolher um modo “legacy” para recuperar os controlos de Steep. Aconselho vivamente a testar qual preferem usar, uma vez que dominando os controlos é a única forma de pontuar alto e mostrar acrobacias espectaculares e, mais importante, controlar as aterragens.
Não se preocupem muito com a perícia, porém. Ao contrário de Steep, a produção esteve mais preocupada com a jogabilidade que com o realismo, devem ter lido a minha análise (ok, duvido). Há neste jogo um claro equilíbrio entre o que é plausível e o que é possível executar num videojogo. O resultado é um pouco “arcade”, diga-se, com uma fricção dúbia, algumas físicas discutíveis e uma sensação de estarmos “em carris” na maior parte do tempo. Podem sempre desligar as ajudas, como as aterragens automáticas mas fiquei sempre com a sensação que esta é uma jogabilidade “domada”. Especialmente quando activamos um “rewind” sempre que caímos ou fazemos respawn sem grande penalização quando saímos da pista (até há penalização, já explico).
Notarão que ainda não falei dos demais desportos, além das bicicletas e ski/snowboard. Tenho motivos para isso. O próprio jogo não faz grande questão de vos colocar no ar muito depressa e penso que há um bom motivo para isso. Num jogo com várias disciplinas, sejam elas mais ou menos elaboradas, há sempre um risco de nenhuma delas ser interessante. Neste caso, só mesmo as provas áreas é que sofreram nesta “dispersão de atenção” da produção. Só temos mesmo uns quantos “circuitos” aéreos para abordar, sem espaço para algo mais. Nos wingsuits sem motor até temos um desafio a planar, obrigando a uma gestão da velocidade. Mas, os motorizados não conseguem entusiasmar de todo, com corridas perfeitamente lineares.
De um modo geral, notem, os controlos em jogo tão algo tardios a responder, dificultando as reacções mais rápidas. Isto fica muito evidente com estes fatos voadores, criando uma dificuldade desnecessária a controlá-los. Por outro lado, nenhuma das provas aéreas possui o mesmo elemento de perícia associado, onde o único desafio é ser mais rápido e passar por algumas “balizas” mais estreitas. Os parapentes também parecem “notas de rodapé” e não merecem grande destaque, continuam tão aborrecidos como em Steep. Enfim, tudo o que é aéreo não teve direito a grande inspiração. Quanto a mim, foram cá deixados porque a produção não quis recuar em conteúdo.
Em termos de provas, encontrarão espalhadas pelo mapa diversas áreas para as abordar. Vão obviamente aparecendo lentamente, consoante avançam na carreira ou terminam um conjunto delas. Terão à escolha provas de perícia para bicicletas ou para ski/snowboard, corridas para bicicletas ou para ski/snowboard e as tais provas aéreas. Além de tentarem concluir cada prova em primeiro lugar (para o “necessário” direito a figurar nas tabelas online), também devem pontuar para evoluir a personagem e angariar provas maiores, temáticas ou mais difíceis. Ao mesmo tempo, ganham estrelas consoante cumprem objectivos especiais, desde pontuar um valor mínimo numa secção, apanhar coleccionáveis ou jogar numa determinada dificuldade.
A cada novo nível, ganham uma espécie de cartas (apenas mais um piscar de olho às microtransacções) que desbloqueiam novos acessos a provas e oferecem divisa de jogo para comprar itens cosméticos. Na conclusão de algumas provas, também ganham equipamento novo que darão alguns boosts importantes, por exemplo de controlo, de velocidade, etc. Convém mesmo escolher a peça de equipamento mais adequado para cada prova. Uma bicicleta de velocidade elevada, por exemplo, não é muito adequada para provas de perícia. O mesmo acontece com skis ou snowboards. De um modo geral, porém, não há muitas diferenças entre elas, quase sempre é uma opção de bónus ou de cosmética que nos faz escolher uma ou outra.
Para navegar neste mundo tão vasto, procurando também coleccionáveis e pontos de interesse, podem sempre pegar numa bicicleta e pedalar. Contudo, ao bom jeito dos jogos Ubi, temos aqui fast-travel. Basicamente, somos teleportados ao lado das provas que escolhermos e, depois sim, conduzimos (ou vamos a pé) até lá. Temos inclusive uma mota-de-neve para que não “percam tempo”. Já falarei um pouco mais da parte técnica mas convém mencionar que, dada a velocidade das drives SSD M.2 das novas consolas PS5 e Xbox Series X (onde testei este jogo), estes “teleportes” acontecem de forma quase instantânea.
A caminho destas provas ou explorando o mundo do jogo, notarão que não estão sozinhos. Há diversos pequenos ícones no mapa, como “formigas” a popular o mapa de jogo. Fora do mapa e em jogo, também notarão vários outros “desportistas” ao vosso redor, algumas vezes a cruzarem-se convosco, mesmo a meio da prova. E é claro que notarão que os vossos adversários nessa prova possuem “nicks”, como se fossem jogadores reais. Isto acontece porque, na verdade, podem muito bem ser jogadores reais. A Ubi implementou uma forma engenhosa de misturar milhares de jogadores nas sessões de cada um, sem realmente enchendo um massivo servidor. Como?
Lembram-se como é que a série Forza analisa e grava as vossas prestações em jogo e cria uma “média” virtual, à qual chama “drivatar” que, depois se torna um elemento da IA para outro jogador? Pois bem, a Ubi não foi tão longe a criar algo tão elaborado mas fez algo parecido. Cada ícone branco e cada atleta virtual que vemos, ou é um jogador real na vossa sessão, ou é um “ghost” de outra sessão, recriado com o nick e aspecto desse jogador. Podem também ser, simplesmente, uma personagem IA criada digitalmente para parecer um jogador. Tudo é misturado sem grandes perdas de performance, o que é fantástico. Desta forma, a produção garante que nunca nos sentimos sozinhos a jogar. Mesmo que seja apenas um “truque”.
Contudo, esta lógica tem algumas questões menos positivas. Por vezes, vemos personagens a aparecer e desaparecer à distância. Noutras vezes, apresentam comportamento errático, como se o jogo estivesse a lutar para interpretar a posição do jogador. O que menos gosto nesta lógica é que, quando caímos e fazemos rewind, só o nosso boneco regressa atrás no tempo, o que nos penaliza bastante por usar este sistema de recuperação. Nas provas massivas com 50 jogadores isto é particularmente penalizador. Também não aprecio jogadores mais agressivos que tentam abalroar-nos para fora de pista mas isso é um “problema” de atitude de alguns jogadores nos jogos online, não tanto do conceito social criado para este jogo.
Tecnicamente, Riders Republic é uma experiência rica em design e em aspecto, como não podia deixar de ser. Já falei, tanto da rapidez no carregamento, como da performance estável perante tantos jogadores e IA ao redor, dois aspectos técnicos relevantes para a experiência de jogo. Também devo dizer que o ambiente visual do seu vasto mundo é visualmente apelativo, com efeitos de iluminação de arregalar o olho, num mundo vasto, entre picos gelados e vales verdejantes credíveis. Diria que está ao nível dos demais jogos da Ubisoft, cheio de atenção aos pormenores. Pelo menos, não compromete visualmente, mesmo que encontrem aqui e ali uns quantos bugs normais de algo nesta escala. A banda-sonora, escolhida a dedo e adequada ao espírito do jogo, como sería de esperar, complementa a experiência.
Infelizmente, há alguns apontamentos menos positivos. Para além de já ter dito o quão acessórias são, as cenas intermédias também não são marcos técnicos para a produção. As animações, expressões faciais e as vozes escolhidas das personagens não jogáveis, especialmente dos comentadores, são todas falíveis. Já agora, faço notar que não podemos omitir completamente estes comentadores, mesmo saltando cenas intermédias, o que é pena porque não contribuem nada para a experiência do jogo. Também vão notar imensas falhas de sincronismo nas provas maiores, com jogadores a “teleportar-se” ao vosso redor, algo particularmente irritante na disputa pelos lugares cimeiros. É um sintoma de que a optimização online pode não chegar para tanta coisa.
Veredicto
Diria que a fórmula de jogos “sandbox” da Ubisoft atinge aqui um novo auge. Riders Republic aproveita a herança de Steep, expandido-a para algo bem maior em escala, com boas ideias e um maior compromisso entre o realismo e a jogabilidade. Continuo a achar, no entanto, a oferta de jogo demasiado vasta e sem um rumo concreto. Também acho a oferta demasiado ambiciosa para o que entre, com muitas das ideias que não funcionam como o pretendido. Mas, como disse no início, quando funciona, diverte, seja a fazer downhill numa bicicleta, seja a fazer acrobacias numa snowboard. Apenas acho que as provas aéreas são dispensáveis, de tão aborrecidas que conseguem ser. Pedalem, deslizem… apenas não voem, portanto.
- ProdutoraUbisoft Annecy
- EditoraUbisoft
- Lançamento28 de Outubro 2021
- PlataformasPC, PS4, PS4 Pro, PS5, Xbox One X, Xbox Series X|S
- GéneroCondução, Desporto
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Momentos visuais arrebatadores
- As velocidade e acrobacias nas bicicletas
- Snowboard/Ski continua exemplar
- Performance nas consolas mais recentes
- Provas aéreas aborrecidas
- Cenas intermédias dispensáveis
- Alguns bugs a precisar de polimento
- Eventualmente, torna-se repetitivo
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.