STALKER2 (3)

Análise – S.T.A.L.K.E.R. 2 – Heart of Chornobyl

Durante anos, esta série foi um marco na história dos “shooters” hardcore na primeira pessoa. S.T.A.L.K.E.R. 2 – Heart of Chornobyl passa a ser um marco de resistência e integridade de um país inteiro.

Não é que STALKER 2 venha a ganhar uma guerra ou a libertar um país inteiro dos horrores de invasão que dura há três causando milhares de mortos. Também não é este jogo que irá dar à equipa Ucraniana uma recompensa por tudo o que perdeu, por tudo o que teve de adaptar, muito menos por todos os que perdeu. O jogo não é perfeito como irão ver, aquilo que pretende fazer é dar-nos uma história empolgante, num género algo batido mas em que esta série sempre sempre deu cartas por ser tão diferente. Contudo, sabendo como e em que circunstâncias foi concebido, olhando para o que oferece, é capaz de ser o jogo mais importante dos últimos tempos. E, sim, está lá o mesmo jogo de acção hardcore que tanta gente aprecia.

Estamos no mesmo ponto de partida que Skif, o novo protagonista desta história. Tal como ele, também nós entramos nesta desconhecida terra irradiada, chamada simplesmente de “Zona”, para puramente sobrevivermos. Este é um mundo pós-apocalíptico em que um evento trágico tornou Chornobyl (nome correcto da região Ucraniana) um palco de violência, desespero e radiação. Teremos de tomar variadas decisões no trajecto, quem tentamos ajudar, quem evitaremos, quem perseguimos e, inevitavelmente, quem alvejamos. E tudo o que poderemos fazer aqui terá repercussões, não só na nossa vida mas também nos destinos de muita gente.

Talvez esta descrição seja algo vaga para quem não conhece o enredo geral da franquia STALKER. Contudo, notarão que esse enredo principal apenas lá está como alicerce de tudo, dando-nos completa liberdade para simplesmente explorar ao nosso ritmo. E não se preocupem. Mesmo que entrem na “Zona” pela primeira vez, não precisam de ter um “passado” para começar por aqui. Talvez não seja a melhor opção, uma vez que irão estranhar a brutalidade, violência e a rudeza de tudo o que aqui se passa. A “Zona” quer matar-nos a todo o momentos, seja por tiros, seja por monstros mutantes, seja pela simples radiação e as muitas anomalias que pairam por quase todo o lado. É um jogo que vai punir os mais impacientes. Sempre foi assim nesta franquia.

Mas, esta também é a história de Skif. Apesar do seu propósito ser desvendar uma trama de longa data, descobrindo os segredos da “Zona”, também ele está curioso por visitar este mundo cruel e irradiado em busca de segredos. Também ele tem uma curiosidade (quase mórbida) de se colocar em risco só para ver o que esconde mais um ponto de interesse. E morrer é o que Skif fará inúmeras vezes ao tentar satisfazer a nossa própria curiosidade. Isto cria uma tensão incrível, sendo estes jogos dos poucos que conseguem mesmo criar um clima de “medo” constante, quase de morte súbita, que nos faz pensar muito antes de agir.

De facto, a precipitação e a falta de preparação são meio caminho andado para a frustração. Não podemos correr em direcção às coisas, não podemos abrir fogo contra tudo o que mexe e fugir pode muito bem ser uma das melhores opções em certos momentos. No início há muita tentação de “entrar a matar”, talvez porque estamos habituados a outros jogos de acção e sobrevivência. De facto, mesmo para mim, jogador dos anteriores títulos (mais concretamente duas expansões do primeiro STALKER), inicialmente também tive dificuldade em abrandar o passo para redescobrir a fórmula essencial para jogar estes títulos: pensar duas vezes, agir apenas uma.

Esta tensão é ainda maior porque… tudo tem um preço. Andar sem fim desgasta energia, é preciso comer com alguma regularidade, as munições não são infinitas, assim como o equipamento, que precisa ser regularmente reparado. Não é propriamente um simulador de combate, obviamente, mas dá-nos uma ideia do que é (teoricamenrte) preciso para viver num mundo tão violento com o mínimo de realismo e uma constante sensação de urgência, valorizando cada passo dado. O mundo irradiado é uma ameaça constante, escondendo imensos perigos que também na realidade quereríamos evitar. A questão é que evitando tudo também não conseguimos cumprir missões, primárias ou secundárias, para ganhar os preciosos cupões. Portanto, a audácia é importante aqui e o jogo tem um óptimo equilíbrio neste ponto.

É que não teremos apenas ameaças passivas. Além dos tais monstros mutantes que vamos encontrar, há fenómenos destrutivos e também há outros humanos oportunistas na “Zona”, obviamente armados. Isto faz com que os tiroteios possam ser absolutamente letais mas também podem ser muito recompensadores pela sua velocidade e realismo resultantes de um bom balanceamento de armas e seus efeitos. Apenas acho que algumas lutas com mutantes podiam ser menos fastidiosas, chegando a ser frustrantes em algumas mecânicas se não tivermos armas e munições em quantidade. Notem apenas que as armas degragam-se e a munição de baixa qualidade pode não fazer tanto dano como a de boa qualidade, criando situações irritantes.

Por outro lado, o jogo “prega-nos partidas” que nem todos conseguirão apreciar. Por momentos, podemos ficar deslumbrados com algo belo no meio do caos ou ficamos curiosos para ver que equipamento poderá ser encontrado numas ruínas “à mercê”. Baixamos a guarda e o jogo “oferece” uma morte inesperada. Acontece várias vezes, como uma punição quase sádica da produção a rir-se das nossas tentativas. Um bom exemplo é como podem gastar muito dinheiro em equipamento e ficamos com uma sensação de “invulnerabilidade” temporária, até percebermos que também os inimigos começam a ser mais resistentes ou melhor armados. Depois de tanto trabalho a angariar bom equipamento, percebemos que de pouco vale para os novos inimigos.

Mas, em nada, o jogo está a descaracterizar esta série. Pelo contrário, esta franquia STALKER sempre foi assim e é por isso que tem a sua legião de fãs dedicados. Obviamente, esta não é uma fórmula para todos os jogadores. Diria que muita da experiência que possam ter em jogos de acção genéricos, até de sobrevivência, é um tanto irrelevante aqui. Não temos muitas ajudas visuais, muitos ícones ou marcadores comuns em jogos populares. Na “Zona” ganha quem ver o adversário primeiro, o que só adiciona ainda mais prudência ao que fazemos. A IA não é realmente assim tão implacável e os tiroteios são realmente justos. Por outro lado, nem tudo envolve andar aos tiros aleatoriamente, havendo algumas missões mais lineares de combate para “desenjoar” do constante receio de andar neste mundo.

Como já devem saber, a produção deste jogo foi assolada por inúmeros problemas. Anunciado originalmente em 2010, foi uma produção inicialmente apenas lenta, com o estúdio sediado em Kiev a explorar outros projectos em paralelo e a fazer algumas restruturas internas. Contudo, a produção acelerou novamente no final de 2021… meses antes da Rússia invadir a Ucrânia na realidade. O resto, já sabem. A produção teve de sair do país, o jogo foi parcialmente congelado, voltou ao activo, a GSC foi atacada várias vezes por piratas informáticos (alegadamente Russos) e o seu escritório até sofreu um incêndio. Por isso, pegar neste jogo hoje em dia, é um feito. Um verdadeiro acto de coragem desta equipa.

Por esse motivo, ver como este jogo foi construído com tanta atenção ao detalhe e à beleza visual no Unreal Engine 5 deixa-me positivamente perplexo. O cuidado desta equipa em criar este mundo a nível de locais, personagens, animações e efeitos visuais é de louvar. Aliás, faz parte deste deslumbre ilusório que o jogo oferece que nos percamos na sua “beleza” até sermos emboscados e morrermos em segundos. Há uma notória demonstração de qualidade e interesse em arrebatar, contendo momentos dignos de “postais” ilustrados, que só não são melhores, porque, de facto mostram uma Ucrânia destruída. Quase um “retrato” fiel do que se passa realmente naquele país nestes dias.

Por isso, estou complementa disposto a desculpar os muitos, mesmo muitos, problemas técnicos que este lançamento teve. Tantos bugs que adiaram esta minha análise para que a produção pudesse tentar resolver alguns problemas maiores. Desde inúmeros bugs relacionados com a IA, com inimigos que por vezes ficam estagnados no mapa, muitas falhas de detecção de colisões, muitos problemas com o áudio do jogo e muitas outras situações que denotam falta de polimento (ou resultado de tantas “distrações” com a realidade), fazem com que a imersão se perca demasiadas vezes. E quando morremos por causa de um bug, então, ficamos ainda mais frustrados quando este jogo é já tão difícil quando corre bem.

Convenhamos que a série em si também não é um marco de polimento. Longas já eram as listas de problemas dos demais STALKER. Aliás esta IA parece aprender bastante com os seus “antepassados”. É impossível não lembrar missões inteiras que ficavam bloqueadas por causa de um só bug. Confesso que não encontrei nenhuma missão realmente bloqueada mas tive de voltar atrás umas vezes para, por exemplo, deixar a IA “desemburrar”. Talvez seja um problema crónico na programação da GSC Game World, talvez seja apenas uma necessidade de (ainda mais) tempo para polir o jogo com actualizações. Para mim, que vivi muitos bugs nos jogos anteriores, prefiro pensar que já fazem parte do “charme” desta série.

Quanto à sua mensagem mais política, além dos óbvios paralelismo coincidentes com o país onde se desenrola esta trama, confesso que não a achei assim tão presente como esperava. Obviamente, há uma noção de patriotismo e resistência Ucraniana que é impossível não relativizar. Há vários paralelismos com a realidade, uns mais subtis que outros. Ninguém esperava que o jogo fosse uma afirmação política mas também não era possível escamotear a realidade depois de tantas dificuldades que esta equipa teve. Não concordo que vejam este jogo como um “apoio” à Ucrânia. É uma peça de entretenimento, afinal. Contudo, se acharem que por jogá-lo estão a fazer algum formato de activismo, talvez o mais evidente é que os tiros deviam apenas ser dados em videojogos. E aí penso que concordamos todos.

Veredicto

Penso que será a primeira vez vou dizer que gosto tanto de um jogo que não o posso aconselhar a todos. Se chegarem a S.T.A.L.K.E.R. 2 – Heart of Chornobyl a pensar que é mais um jogo de acção e sobrevivência como tantos outros, vão passar um mau bocado a reclamar pela sua rudeza e elevada dificuldade. Talvez fiquem deslumbrados pelo seu visual, conseguindo mesmo ultrapassar os seu inúmeros problemas técnicos mas, eventualmente, ficarão frustrados por ver que Chornobyl vos quer matar a cada passo. Os fãs do “Cheeki-Breeki” (vocês sabem quem são), porém, não precisam de explicações ou conselhos. Este é o melhor título desta série, sendo também um dos melhores jogos de acção e sobrevivência hardcore dos últimos tempos, em que nem os bugs o ofuscam.

  • ProdutoraGSC Game World
  • EditoraGSC Worldwide
  • Lançamento20 de Novembro 2024
  • PlataformasPC, PS5, Xbox Series X|S
  • GéneroAcção
r
Recomendado

Óptimo, aconselhamos a apreciar ao máximo.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • Bugs, bugs e mais bugs
  • Alguns combates com monstros podem ser só chatos

Esta análise foi realizada com uma cópia adquirida pela redacção.

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