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Análise: Syberia 3

Anunciado há cerca de 8 anos, Syberia 3 foi um trabalho de dedicação do criador Benoît Sokal e da produtora Microïds. Muito se passou desde o anúncio. A tecnologia evoluiu, os géneros transformaram-se e surgiram novas audiências. Há lugar para este regresso de uma série de culto?

Convenhamos que a última vez que o anterior jogo da série foi lançado em 2004. Na altura Syberia 2 até foi aclamado pelos avanços visuais e de interacção, mas foi também amplamente criticado pela sua dimensão reduzida. O primeiro jogo da série, originalmente lançado em 2002, continua a ser um título de culto, conseguindo na altura fazer regressar o género da aventura gráfica dos anos 90, embora com uma forte aposta num grafismo mais realista. Syberia 3 só tinha de não cometer os mesmos erros e ser mais um sucesso. Contudo, apesar de anunciado em 2009, só agora foi lançado, isto depois de uma série de desenvolvimentos na produção e alguns adiamentos. Entretanto, os tempos mudaram e as tendências são outras. Olhando para trás, como sempre fazemos quando seguimos uma série, Syberia 3 precisará de muitos argumentos para nos convencer, não dependendo apenas do relativo sucesso dos seus antecessores.

Como seria de esperar, este tipo de jogos terá sempre uma história algo forçada. A heroína da série, a advogada Kate Walker de Nova Iorque, Estados Unidos da América (um título e origem que o jogo faz questão de nos repetir até à exaustão) está de volta. Acordando com perda de memória num rudimentar hospital, desperta na companhia de um indígena Youkol. Numa breve conversa, Kate descobre que revela que este a salvou de um barco à deriva. Agora num hospital que mais parece um sanatório, Kate quer escapar o mais rápido possível e perceber o que se passou consigo. Eventualmente, também é informada que os Youkol está a braços com uma perseguição governamental que os tenta impedir de realizar uma peregrinação. Portanto, a sua busca pessoal pode esperar, uma vez que a tribo precisa da sua ajuda.

Se este enredo não vos impressionar muito, não estão sozinhos. Por esta altura estaria a dizer algo como “a história desenvolve-se para algo fantástico”. Infelizmente, não o posso dizer. Sim, há alguns desenvolvimentos interessantes para seguir, nem que seja pela nossa inerente curiosidade. Até até algumas referências interessantes aos títulos anteriores que (se jogaram, obviamente) irão recordar. Contudo, na descolagem das histórias anteriores, nem seja no seu foco em seres mecânicos e os seus criadores, a produção criou um enredo um tanto ou quanto acessório. Mas, já sabem como este tipo de jogos se desenvolve. Acaba por ser uma experiência que varia de pessoa em pessoa. E quando abordar os demais pontos de avaliação, irão perceber que o enredo simplista é o que menos vos vai incomodar.

Por onde começar? Bom, talvez pela jogabilidade. Recebemos a versão PlayStation 4 para a nossa análise e há uma clara desvantagem nesta plataforma. Esta é uma aventura “point and click”, claramente criada para controlo com teclado e rato. O que faz com que o controlo com o Dualshock 4 (ou qualquer outro comando) uma tarefa absolutamente atroz. Temos de orientar Kate com o analógico esquerdo e (supostamente) orientar a sua atenção com o direito. Só que esta segunda tarefa é absolutamente aleatória, uma vez que… não temos um cursor. Por vezes passei largos segundos para tentar destacar um ponto de interacção para descobrir que simplesmente não sabia onde Kate estava a olhar. Mover o analógico em círculos até, eventualmente, o ponto ficar destacado é uma constante.

A falta de cursor exaspera, mas os movimentos de Kate também não ajudam. Diria que nem é tanto a movimentação em si, mas as perspectivas fixas da câmara. Este é o primeiro jogo 3D da série e nota-se que a produtora se debateu com esta nova dinâmica. Muitas vezes, acabarão presos no cenário porque a perspectiva da câmara não vos permite ver um obstáculo que vos impede de avançar. Em muitas outras ocasiões, a mudança de câmara ocorre fora de tempo com a acção, obrigando a trocar direcção no analógico. De certa forma, esta lógica faz-me lembrar os jogos da Telltale Games. Só que, mesmo nesses títulos da concorrência, algumas secções possuem ajuste manual da câmara e, lá está, temos um cursor para interagir. De facto, este jogo parece favorecer o uso de um teclado e rato. Ironicamente, dei uma vista de olhos na versão PC e lá o jogo até aconselha a usar um game pad. Enfim.

Depois de vencerem a luta com os controlos, talvez ainda não tenham perdido ainda muito tempo com os puzzles. Para terem uma ideia, a solução da vasta maioria dos puzzles possui várias fases. Não há nada de errado nisto, apenas obrigará a fazer algumas tarefas intermédias até os resolvermos. Só que a forma como a produção nos obriga a seguir um determinado procedimento é que me aborreceu bastante. Num dos primeiros puzzles que vão encontrar, terão de reparar um botão na sala do tal hospital. Inicialmente, olham apenas para a caixa e notam que há um parafuso para abrir. O vosso instinto é procurar alto para desaparafusar a caixa. Procuram em volta, não há nenhum ponto de interacção. Mas se falarem com o indígena, ele sugere que procuremos algo para abrir a caixa e… voilá… surge um ponto de interacção novo onde podemos apanhar uma faca…

Repito, não há nada de errado com interacções intermédias para resolver puzzles. Mas, agora imaginem os puzzles maiores que vão encontrar mais à frente, alguns envolvendo alguma complexidade. Como uma fechadura, cuja chave está incompleta, mas só descobrem isso depois de perder tempo a mover peças para alinhar os dentes da chave. A solução só surge depois de… adivinharam… falar com personagens. E estas não darão uma solução directa. Terão de executar outras tarefas encadeadas, mais ou menos aborrecidas, para conseguir, finalmente, abrir a dita fechadura. E este é apenas o segundo puzzle que vão encontrar. Há uma clara linearidade que nos forçará a passar por todas as linhas de diálogo e todos os pontos de interacção possíveis. Por um lado, é garantido que não ficam presos num puzzle, por outro, é garantido que se vão aborrecer depressa com esta linearidade.

O que poderia ajudar bastante seria a interacção com personagens. Afinal, neste tipo de aventuras gráficas, ainda por cima, muitos dos puzzles só são solúveis com estas conversas, são os diálogos que oferecem profundidade à história. Em Syberia 3 isto também é uma realidade, com muitas conversas a darem sentido ao próprio enredo. Contudo, se o casting de vozes não for competente, rapidamente vamos perder o interesse nos diálogos. Diria que uma boa parte dos actores que emprestam a voz no jogo, pelo menos na versão em Inglês que testei, são óptimos leitores de guião. Quero com isto dizer que na maioria das conversas, o tom é puramente formal, quase até de leitura de um papel, sem grande emoção ou esforço para… bem… actuar.

Algumas vozes também são algo desajustadas, muitas vezes com tons claramente desenquadrados para a idade ou para a personalidade das personagens. Isto já para não falar dos fatídicos erros de construção de frases e expressões idiomáticas na tradução para Inglês, fazendo-nos recordar demasiadas vezes que a produção é inteiramente Francesa. Traduções menos positivas à parte, porém, nada explica a formalidade dos diálogos. São muitas vezes ditados de forma tão linear, como se os próprios actores tivessem dificuldade em articular as frases contidas no guião. Qualquer jogo pode ter diálogos menos elaborados mas que acabam por brilhar graças às prestações dos actores. O contrário também é verdade e Syberia 3 sofre bastante neste campo.

Ok, então o jogo tem algumas deficiências no seu enredo, na sua interacção e nos próprios diálogos. Então, no plano técnico, será que se consegue redimir? Afinal o primeiro jogo foi um marco histórico no seu tempo ao nível visual. Uma aposta da série no realismo de texturas e modelos visuais, só podia resultar agora numa excelente experiência visual, ainda para mais com os avanços técnicos desde o seu anúncio, certo? Ainda estou para concluir o que a Microids tentou fazer com este jogo, honestamente. A dada altura, parece que temos aqui uma arte estilo Cell Shading, a fazer lembrar a banda desenhada, com algumas personagens exageradamente caricaturadas. Noutras alturas, o jogo parece querer apostar novamente no realismo. Em ambas as ocasiões não consegue deslumbrar.

É perfeitamente conjugável este tipo de abordagem de duas artes tão distintas, algo que até já vimos noutros jogos. O motor gráfico Unity usado neste jogo é capaz de grandes proezas visuais. Contudo, nem modelos, nem animações ou texturas impressionam. Nas cenas intermédias, parece que as animações foram criadas de forma genérica e mecânica. E as coisas não ficam muito melhores quando passamos para os momento de interacção em si. As próprias personagens principais ou secundárias possuem movimentos absolutamente exagerados, incluindo as expressões faciais e movimentos de lábios. Diria que estas animações não são dignas de 2017 e deste motor gráfico. Sobretudo, depois de tanto tempo “na forja”.

Veredicto

Gostava muito que Syberia 3 recuperasse a grande surpresa que foi o primeiro jogo, sobretudo depois do segundo título ter, de alguma forma, falhado em continuar a sua história irrepreensível. Este título teve imenso tempo em produção, podendo aproveitar o que de melhor se faz hoje neste género tão único. Contudo, a terceira parte desta série de culto parece uma autêntica formalidade para os intervenientes, começando nos artistas visuais que não se empenharam em trazer uma experiência tecnicamente polida e terminando nos actores que se limitam a ler um guião a precisar de uma revisão. O resultado é um jogo sem grande primor técnico que só os fãs inveterados conseguirão gostar.

  • ProdutoraMicroïds
  • EditoraAnuman
  • Lançamento20 de Abril 2017
  • Plataformas
  • GéneroAventura Gráfica
?
Sem pontuação

Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.

Mais sobre a nossa pontuação
Não Gostámos
  • História meio acessória
  • Interacção com gamepad
  • Diálogos e respectivos actores
  • Não impressiona visualmente

Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.

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