Análise – Tekken 8
Numa era em que temos os colossos Street Fighter 6 e Mortal Kombat 1, entre outros títulos menores, a “dar cartas”, o género de luta tem mais um desafiador. Tekken 8 entrou em cena e é bem possível que ganhe o combate.
No mundo dos jogos de luta, a série Tekken tem um sucesso notável. Enfrentou vários desafios, vencendo onde outras séries do género acabaram no esquecimento. Enquanto que os seus títulos rivais perderam tracção ao longo dos anos, por seu lado Tekken continua ainda hoje a prosperar, atraindo grandes audiências em torneios online e conquistando milhões de jogadores. Nesta análise, vamos conversar um pouco sobre este mais recente título na série mas também explorar o que poderá estar por trás da popularidade duradoura de Tekken, examinando como a equipa da Bandai Namco superou obstáculos durante várias edições, mantendo esta série viva e de boa saúde.
O mercado de jogos de luta pode parecer uma arena. É uma visão estereotipada, eu sei, mas é a melhor perspectiva para a nossa discussão. Peço que visualizem duas arenas: Uma para jogos de luta 2D e outra para os jogos tridimensionais. Na primeira arena, temos jogos como os já mencionados Street Fighter ou Mortal Kombat, mais recentemente também Guilty Gear e outros. É, sem dúvida, o tipo de jogo de luta mais popular na sua história. Na segunda arena, porém, o cenário é diferente. Apostando na tal tridimensionalidade, que também os jogos 2D agora apostam, Tekken domina facilmente, já que os seus rivais directos vão desaparecendo a pouco e pouco.
Esta série também teve seus contratempos, principalmente com Tekken 4 na sua transição para puro 3D e a controversa alteração na lógica de combos. Ainda assim, conseguiu ultrapassar a crítica de cabeça erguida, sem perder a confiança dos fãs. A razão para isso pode ser simplesmente no histórico negativo de séries de jogos desaparecidas ou na decadência de qualidade das mesmas. No entanto, a queda na popularidade de uma saga como Dead or Alive não remonta a muitos anos. Recentemente, Virtua Fighter fez um tímido regresso. Soul Calibur vai também aparecendo aqui e ali. Tekken, por seu lado, até tem vindo a melhorar a olhos vistos, estabelecendo sempre novos patamares. Um feito.
A verdade é que não há só um segredo para o sucesso de Tekken. Resulta de uma série de factores e de uma estratégia inteligente levada a cabo ao longo de décadas. A Bandai Namco conseguiu ao longo do tempo, não só prestar sempre atenção às tendências da época, mas também manter a popularidade com um grande investimento na imagem, assim como no desenvolvimento da jogabilidade e das tecnologias. Mesmo quando teve momentos menos bons, Tekken conseguiu apresentar algo novo para semear ideias úteis para o capítulo seguinte. Ao mesmo tempo, foi construindo uma sólida comunidade muito fiel e fortemente competitiva, disseminada de maneira invejável por todo o mundo.
Para mim, Tekken 7 foi o ápice desse esforço impressionante, um excelente resultado deste processo evolutivo e muito calculado. Porque é um somatório de tudo o que a série foi adicionando, aprimorando muito bem o que poderia ser apenas uma compilação para “cumprir calendário”, conseguiu sobreviver por tanto tempo, sendo uma óptima referência no género. No entanto, chegou a hora de “se reformar” com a chegada do tão esperado oitavo capítulo. Esta é uma sequela que prometeu desde cedo um salto evolutivo enorme. Ainda assim, tem um caminho incrivelmente difícil a percorrer, não só para superar o seu antecessor, dando o devido louvor ao seu legado, como para fazer frente à fortíssima concorrência.
Na realidade, tenho de dedicar a primeira parte desta análise a um tópico que, sem dúvida, estará entre os mais discutidos após o lançamento do jogo, a campanha principal do jogo. Aqui, a Bandai Namco optou por uma abordagem não muito diferente dos títulos da NetherRealm, oferecendo um modo de história que não é particularmente duradouro, pretende ser apenas introdutório do “lore”, personagens e jogabilidade geral que poderão encontrar no resto da oferta. Não deixa de ser um modo espectacular, além de todas as expectativas que tinha, mesmo depois de tudo o que a Bandai mostrou nestes meses. Obviamente, essa espectacularidade deve-se, sobretudo ao grafismo apurado. Contudo, num todo, o modo de carreira tem muito bom gosto.
É importante salientar que entre os criadores de Tekken 8 está também Yohei Shimbori, produtor e diretor da série Dead or Alive. Obviamente, dizer que “a influência é notável” é um eufemismo. A campanha deste jogo é uma mistura de loucura e serviço aos fãs, que praticamente nunca pára (nem sequer se dá ao trabalho, por um momento) de manter a seriedade. Narrativamente, a não ser que sejam fãs incondicionais de longa data, conhecedores de todo o lore, chega a ser incompreensível, cheio de momentos caricatos. Todavia, consegue dar a volta à estranheza, diria mesmo que está entre as melhores histórias oferecidas na série (não que fosse um patamar muito alto para superar). No geral, apesar de se focar demasiado em Jin e haver fases repetidas, achei o modo história agradável.
Contudo, o modo principal do jogo não é a campanha. Arcade Quest é a verdadeira estrela, uma interessante tirada do excelente “Quest Mode” de Virtua Fighter 4 Evolution. Na prática, aqui podem enfrentar vários adversários controlados pela inteligência artificial e subir no ranking virtual, com o objectivo de vencer o Tekken World Tour. Sejamos claros, mesmo neste caso, não se espera nada de extraordinário. Não há muitas quests disponíveis e achei a dificuldade no geral relativamente baixa, mesmo sendo um passo em frente em comparação com o resto da saga. No entanto, porque continua depois de concluída a história principal, representa um tutorial agradável, que ensina uma boa parte das mecânicas fundamentais do jogo entre uma série de confrontos. Ao completá-lo oferece objectos de personalização, semelhante ao que acontecia no modo Treasure Battle em Tekken 7, dando assim mais motivação para enfrentá-lo.
Para os jogadores sem aptidão para o online, terão os Ghosts, um extra significativo que oferece um nível de desafio bem acima da média. Quando disse que a inteligência artificial de Tekken 8 melhorou, não estava a exagerar. Não apenas é geralmente capaz de lidar com os movimentos complexos de uma forma muito mais elaborada e semelhante aos jogadores humanos, como assimila activamente as tendências do jogador e as reproduz de uma maneira realmente surpreendente. É possível treinar uma inteligência artificial com as suas próprias características usando praticamente qualquer personagem. Apenas algumas partidas são suficientes para começar a imitar os vossos hábitos e habilidades. Considerando o quão bem esse sistema funciona, há um grande potencial em desafiar os fantasmas de alguns dos melhores jogadores do mundo e melhorar prestações. O trabalho feito pela equipa nesta área é digno de elogios.
Já mencionei como grande parte do sucesso da fórmula surge ao transformar a série seguindo as tendências de forma sensata. Tekken 8 também parece querer seguir essa filosofia, dado que as novas mecânicas são claramente projectadas para seguir essa moda do visual pungente e agressividade dos golpes. Mesmo em termos de acessibilidade, houve mudanças significativas capazes de tornar tudo mais simpático para os iniciantes, uma tendência vista também nos jogos rivais. Apenas não esperem grande facilitismo. Este ainda é um Tekken, construído com uma óbvia base no sétimo capítulo, chegando até a tornar o já muito importante sistema de movimento tridimensional mais eficaz, com passos laterais úteis para desviar dos movimentos dos inimigos. Em resumo, se vierem para este jogo directamente de Tekken 7, não vão ter problemas com os conceitos básicos, porque a produção manteve o que funcionava bem.
Em relação ao elenco, há aqui uma óbvia divisão ainda mais clara nas habilidades e pontos fortes/fracos de usar uma das personagens. Algumas permaneceram extraordinariamente técnicas e difíceis de gerir, mesmo para os veteranos. Outras tornaram-se mais simples e agora podem ser usadas efectivamente mesmo que as habilidades não estejam completamente dominadas ou se estratégias simples forem seguidas. Essa maior diversificação distingue bem Tekken de outros jogos, uma vez que altera ritmos, a eficácia de golpes e até permite alguma experimentação para ver qual a personagem que melhor se adapta à nossa própria forma de jogar. Obviamente, isto é também convidativo para novos jogadores não desanimarem perente adversários mais tecnicamente habilidosos.
Por outro lado, exacerba bem a impressionante capacidade da série de ser divertida mesmo se jogada superficialmente, apesar de enorme profundidade em potencial se quisermos explorar tudo. Uma das funcionalidades que permite distinguir bem cada uma das personagens, com o objectivo de torná-las únicas, é o novo indicador de Heat. Na prática, é um aprimoramento temporário, indicado por uma barra abaixo da barra de vida, que pode ser activado de duas maneiras: com um ataque chamado Heat Burst que o inicia imediatamente ou realizando movimentos especiais indicados como Heat Engager na lista de movimentos do personagem. À partida, pode parecer uma espécie de “limit breaker” para situações de aperto, algo que historicamente foi sempre tido como um “injusto”.
De facto, muitos jogadores inicialmente acreditaram que este novo recurso poderia provocar abusos dessa mecânica. No entanto, se aprofundarem um pouco como funciona, vão perceber como, na sua essência, Tekken continua a ser um jogo em que defender compensa, fazendo com que os Heat Engagers sejam menos relevantes. Por outro lado, o atalho do Heat Burst expõe o lutador a uma resposta idêntica do adversário, especialmente se considerarmos que o movimento pode ser usado para recuperar a sua vez em situações de pressão. Além disso, o dano infligido no Heat é um temporário, que pode ser regenerado se atacarmos de imediato. Não me parece que seja algo que possa realmente decidir um combate. Mesmo sendo muito perigoso, há formas de o contrariar.
O Heat oferece ainda a cada personagem novos movimentos e habilidades únicas, que podem levar os jogadores a usar estratégias adicionais que não estão disponíveis no “estado normal”. No entanto, o uso dessas habilidades consome sempre a barra de forma drástica, pelo que também não permite grandes abusos no seu uso, devendo ser usado de forma muito mais estratégica. E parece-me mesmo essa a intenção da produção com esta funcionalidade, sendo particularmente útil para prolongar os combos com uma ajuda extra praticamente gratuita. De um modo geral, gostei, pois muda significativamente o ritmo das partidas, obrigando-nos a pensar mais amplamente, tornando cada confronto mais competitivo, especialmente entre jogadores que conseguem contrapor cada movimento.
Em termos de mecânicas e em termos de conteúdo já perceberam que há bastante oferta para os amantes de Tekken, mas como se comporta o netcode? A Bandai Namco optou por uma mistura entre delay based netcode e rollback. O risco aqui é que se podia tornar um meio-termo, incapaz de satisfazer a todos, de render dignamente as partidas online ou até piorar os aprimoramentos atingidos no antecessor. Felizmente, o resultado final demonstrou realmente uma estabilidade louvável e não me deu qualquer problema durante as partidas que consegui participar contra outros jogadores europeus. Mesmo assim, não há milagres. Não tive boas experiências em partidas fora da Europa, especialmente contra adversários asiáticos, com personagens verdadeiramente incontroláveis devido a quebras de animações e frames atrasados.
Aprecio a inclusão do inesquecível modo descontraído de Tekken Ball entre as opções offline e online. Embora não seja, de todo, o modo mais desejado nesta série, confesso que senti mesmo a falta deste modo nostálgico em jogos anteriores. Isto, porque, apesar de caótico, continua a ser muito divertido em grupo, muito agradável se quiserem um desafio online sem a preocupação com classificações e médias de vitórias. Por outro lado, também a concorrência já começa a apostar em modos secundários menos virados para a pancadaria, mais a pensar no puro entretenimento. Por isso, venham de lá essas partidas de vólei.
Finalmente, há pouco a reclamar em relação ao sector técnico e ao som do jogo. Embora os servidores não colaborassem muito nas primeiras horas pós-lançamento, as coisas lá estabilizaram um pouco e deixei de ter grandes problemas nas ligações online. Visualmente, assisti a algumas cenas capazes de levar o hardware do PS5 (versão analisada) perto do limite. Notei apenas que, para garantir uma experiência online sem falhas, a qualidade visual do jogo é reduzida um pouco com efeitos de iluminação menos realistas e detalhes geralmente mais baixos. Não significa que Tekken 8 deixe de ter bom aspecto geral, notem. Visualmente, está entre os melhores actualmente no mercado, inclusive com a sua banda sonora que tornar os confrontos ainda mais emocionantes.
Veredicto
É uma experiência exagerada, por vezes descaradamente, que evoluiu significativamente em quase todos os aspectos. Continua a ser uma oferta excepcional, capaz de capturar, mais do que nunca, aquele espírito que hoje torna esta série praticamente imortal. Tekken 8 consegue caminhar sem tropeçar naquela fina linha que gostaria de agradar tanto aos novatos como aos veteranos da série. As adições e mudanças no sistema são massivas e todos sabemos como quaisquer alterações desse tipo nunca serão consensuais. Ainda assim, fiquei sinceramente convencido de que este é actualmente o jogo de luta mais divertido no mercado e é para continuar, quase certamente devidamente suportado nos próximos anos, dada o histórico da produtora. Em resumo, mais um grande protagonista desta era dourada do género, que parece cada vez mais imparável.
- ProdutoraBandai Namco
- EditoraBandai Namco Entertainment
- Lançamento26 de Janeiro 2024
- PlataformasPC, PS5, Xbox Series X|S
- GéneroLuta
Óptimo, aconselhamos a apreciar ao máximo.
Mais sobre a nossa pontuação- O sistema Heat calculado e justo
- Tecnicamente espetacular
- Elenco massivo e mais variado do que nunca
- Os controlos simplificados não substituem os clássicos
- O equilíbrio geral das personagens custa a discernir
- Problemas no online nas primeiras horas de lançamento
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.