Análise – The Callisto Protocol
A expectativa em torno de The Callisto Protocol foi bastante evidente. Aqui estava um possível renascimento de um género quase esquecido, o Sci-Fi Horror aprimorado (e desleixado) pela série Dead Space.
Por isso, enquanto o regresso dessa franquia ainda demora, este novo título do estúdios Striking Distance parecia, de facto, interessante. Nas imensas imagens promocionais, ninguém ficou indiferente à sua atmosfera assustadora, os seus monstros grotescos e, claro, as finalizações absolutamente brutais, com gore elevado a um nível de “requinte” que há muito não se via. Infelizmente, como acontece muitas vezes, o hype nem sempre funciona da forma mais desejada. Quando pousei o comando da minha PlayStation 5 (versão analisada) para escrever esta análise, não posso dizer que estivesse totalmente desapontado… mas também não estava deslumbrado. Culpem o tal hype.
Inevitavelmente, temos de voltar atrás e falar novamente de Dead Space. A equipa da Striking Distance é composta por ex-elementos que trabalharam nessa e noutras franquias, com a liderança de Glen Schofield, produtor executivo na extinta Visceral Games do primeiro Dead Space (e ainda teve mão em alguns Call of Duty). A vontade de preencher o vazio de 10 anos deixados pela inépcia da EA em reavivar a sua franquia, terá pesado na decisão de Schofield e companhia de trazer este jogo. Sem dúvida. Ainda bem que assim foi, mesmo com os seus problemas.
Por isso, embora Dead Space não detenha, de facto, alguma “patente” no género, tendo outros títulos revisitado a receita com resultados mistos, quando se soube da existência de The Callisto Protocol, os fãs prestaram atenção. Nas promoções, foi possível constatar que a atmosfera estava perfeita, os monstros dignamente asquerosos, o visual parecia muito apurado e as animações verdadeiramente gráficas, tantas vezes macabras. Só era preciso que tudo isso fosse “embrulhado” numa oferta sólida e o título de “jogo de terror do ano” estava praticamente garantido.
No ano 2320, o negócio de Jacob Lee e Max Barrow está prestes a tornar-se ainda mais lucrativo. Basta fazer uma missão delicada de carga entre a lua Europa e a lua Callisto, onde está situada a infame Prisão de Black Iron. Ao iniciarem a descida em Callisto, porém, a sua nave é abordada pelos terroristas da Outer Way. No meio da confusão, a nave acaba por se despenhar na superfície da lua de Júpiter. Os únicos sobreviventes são Jacob e a líder dos terroristas Dani Nakamura. Entretanto, o Capitão Leon Ferris da segurança encontra-os e estes são presos injustamente na terrível prisão… onde o caos acaba de irromper.
É que a prisão de Black Iron onde Jacob é admitido, depois de integrado no sistema com um implante intrusivo, não é propriamente convencional. Está repleta de prisioneiros hostis, alguns assolados por uma estranha doença que cria mutações grotescas. Felizmente (ou infelizmente), o seu companheiro de cela, Elias, tem um plano de fuga. Pelo caminho, Jacob vai (re)encontrando outras personagens, inclusive a terrorista Nakamura para o ajudar a fugir deste pesadelo e o Capitão Ferris obviamente a dificultar essa tarefa. De um modo geral, o enredo funciona bem a contar a história, com uma óptima construção de personagens.
Devo dizer que um dos elementos mais importantes para esta história funcionar tão bem, é o seu casting de actores que emprestam feições e prestações às personagens. Reconhecerão várias caras entre os protagonistas, com especial destaque para Josh Duhamel (Transformers) no papel de Jacob, Karen Fukuhara (The Boys) no papel de Nakamura e, claro, Sam Witwer (Star Wars: The Force Unleashed) no papel do Capitão Ferris. Embora ache que alguns momentos podiam ser melhor trabalhados, fiquei empolgado para chegar ao fim da trama.
Mas, aí reside o seu primeiro problema: no fim. Sem querer, de forma alguma, estragar-vos a experiência, quero só dizer que o final do jogo é francamente anti-climático. Deu-me uma inesperada insatisfação, depois de tanto trabalho para chegar ao seu auge. Fica óbvio que a produção estará a pensar numa continuação e até aceito isso. O que não gostei mesmo foi construir um evento que devia ser recompensador e, no final… uma óbvia incerteza, como se tudo o que fizemos fosse tecnicamente irrelevante. É, pelo menos, a sensação que me deu.
Contudo, o pior é que este final surgiu para mim em apenas 11 horas de jogo. Não corri pelo mapa e não saltei sequências, notem. Soa a pouco, com o epílogo a aparecer de surpresa, qual “jump scare” barato, daqueles que nunca gostamos. Confesso que não esperava, sinceramente, que a história se pudesse esticar por muito mais que essa duração mas, é como digo acima, o jogo termina algo prematuramente, sem que pareça que a história se tivesse verdadeiramente consolidado. Gostamos sempre quando uma série, um filme ou um jogo, nos deixe em suspenso, sem dúvida. Mas, não desta forma. Joguem, terminem e vão entender o que digo.
Espero não ter-vos demovido de jogar The Callisto Protocol com esta perspectiva de (relativamente) curta duração e um final “abrupto”. De facto, se a duração não define a qualidade de um jogo, este será um bom exemplo. Durante o tempo em que nos é permitido jogar, a jogabilidade de The Callisto Protocol até cativa na sua dinâmica e brutalidade. Inicialmente, só estamos armados com um humilde bastão de atordoamento que não nos deixa fazer muito. Contudo, mais à frente Jacob encontrará mais armas para se defender, até mesmo algumas espingardas e caçadeiras.
Apesar das muitas similaridades com Dead Space, notem, este jogo foca-se mais no combate melee, do que propriamente nos tiros. Tal como no jogo em que se inspira, há também uma lógica de desmembramento apurada, embora o foco seja claramente no combate próximo. Há até uma chance de desvio dos golpes dos mutantes, com um contra-ataque brutal que cria alguns momentos de puxar a náusea pela sua brutalidade visual. Adiante, teremos também uma luva que acrescenta a possibilidade de arremessar objectos, tornando o combate ainda mais variado.
Por causa disto, devo dizer que os primeiros momentos de jogo criam uma sensação de lentidão e uma certa impotência. Aqui estamos nós a procurar uma pistola ou espingarda, pensando na acção que tínhamos com Isaac e, afinal, andamos quase só à “murraça”. Por outro lado, o timing entre desvio e contra-ataque não é muito intuitivo, obrigando a uma certa “dança” que é preciso dominar. Quando as armas finalmente chegam, percebemos que, afinal, não precisamos assim tanto delas. Ajudam, mas não são decisivas.
Das mecânicas que mais gostei em jogo, foi quando a acção furtiva contra uns mutantes cegos nos obriga a abrandar. Aqui, não podemos avançar sem um plano, é preciso estudar a táctica e atacar os monstros com golpes silenciosos, já que não nos vêem mas ouvem muito bem. Também gostei dos momentos de “desconhecido” em que não sabemos mesmo de onde virá o perigo. São frequentes e criam uma sensação de perigo iminente que esperamos num título neste género. Especialmente porque os movimentos são “pesados” não podemos propriamente correr pelo cenário.
Um pormenor que poderá desagradar a alguns é a oscilação da dificuldade. Estamos habituados a que este tipo de jogo possua secções mais desafiantes e outras mais (enganadoramente) pacíficas. Este balanceamento da acção porém, é uma autêntica arte que nem todas as produções dominam. E neste jogo, de facto, não funciona bem. Há picos de dificuldade que são só frustrantes, com dezenas de inimigos mandados para cima do jogador e que não se enquadram particularmente no ritmo. De facto, penso que estes momentos de puro caos não contribuem para aumentar a tensão, apenas parecem chatear o jogador.
E agora o grande problema do jogo, não propriamente na versão que analisei na PS5, embora também aqui encontrasse alguns problemas. O jogo possui uma performance… peculiar. Penso que está interligada com a sua passada lenta, mas graficamente, de facto, parece “arrastar-se” em alguns momentos, como se o rácio de fotogramas abrandasse deliberadamente. Optando no menu pelo modo “performance”, de facto, alivia bastante esta sensação de lentidão, tornando o jogo mais dinâmico. A contrapartida são os pormenores visuais ligeiramente menos detalhados.
De facto, a construção de cenários é deslumbrantemente detalhada, com a prisão decrépita a contribuir para a escuridão e caos que se pretende. As cenas intermédias, então, possuem a qualidade de um bom thriller, com as tais prestações dos actores a ajudar bastante. Visualmente, de facto, o jogo marca todos os pontos que esperamos e, sim, os desmembramentos e os movimentos finalizadores são realmente impressionantes. A iluminação e o som são também óptimas contribuições para o ambiente, que é sempre sombrio e tenso.
Contudo, há mesmo muito para reclamar. Não vou fazer uma lista porque a maioria das questões que encontrei farão parte de um polimento que ainda pode acontecer com actualizações. Mas, tenho de mencionar alguns problemas prementes. A câmara de jogo precisa de uma revisão urgente, desorientando mais em alguns momentos que ajudando. Notei também diversas situações em que os inimigos “surgem” do nada, com pop ups notórios, nem sempre assim tão longe do jogador. E os checkpoints automáticos são qualquer coisa de “aterrador”, especialmente nas secções com bosses em que não dão tempo para nos prepararmos.
Por outro lado, a evolução de Jacob não entusiasma em termos de novo equipamento. Ou seja, apesar dos vários upgrades, habilidades e armas que vamos conseguindo angariar, nada impressiona e falha em fazer-nos sentir que o jogo evolui tacticamente connosco. Aliás, os recursos e créditos são escassos tornando tudo moroso. A falta constante de munições, nos tais momentos em que o jogador fica rodeado de monstros, gera imensa frustração. E, depois, temos um checkpoint que nos devolve exactamente ao início do mesmo momento frustrante…
Por fim, a questão da performance no PC. Se estão a pensar adquirir The Callisto Protocol nessa plataforma, preparem-se. Até à data desta análise, os comentários dos jogadores são negativos, com queixas de “stutters” e quebras acentuadas de performance. Como disse, isto não foi propriamente um problema na PS5, embora se notem alguns “soluços” no início de algumas secções. O jogo tem claros problemas de performance no geral e é francamente desapontante que tudo isto, aliado às demais questões que já falei, manchem o lançamento deste jogo tão esperado.
Veredicto
Se tiver de ser “simpático” para o primeiro jogo da produtora Striking Distance, diria apenas que The Callisto Protocol é um jogo com excelentes ideias, grande ambição, uma jogabilidade relativamente interessante, mesmo sem inovar grande coisa e uma história com bons momentos e ainda melhores protagonistas. Mas, dados os muitos problemas técnicos e de conceito que encontrei, a sua dimensão curta e o final agridoce, tenho de ser honesto e dizer que é apenas uma boa demonstração das capacidades de uma produtora que será capaz de fazer (muito) melhor. De Dead Space, só tem mesmo a inspiração…
- ProdutoraStriking Distance
- EditoraKrafton
- Lançamento2 de Dezembro 2022
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
- GéneroAcção, Terror
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Excelente casting de actores
- A história cativa, mesmo sem surpreender
- Óptimo design de jogo
- Alguns momentos de elevada tensão
- Curto na sua duração total
- Dificuldade demasiado oscilante
- Problemas nos checkpoints
- Câmara por vezes complica
- Performance oscilante, especialmente no PC
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.