Análise – The Outer Worlds (Spacer’s Choice Edition)
Lendo a análise original e DLC de The Outer Worlds em baixo, percebem que gostámos muito da aposta espacial da Obsidian Entertainment. Por isso, custa mais a aceitar esta “Spacer’s Choice Edition“.
Sejamos claros, o objectivo desta edição é (em princípio) trazer o jogo às consolas PlayStation 5 e Xbox Series X|S. Contudo, esta é também uma reedição de conteúdo, em que também o PC foi contemplado com uma série de novidades técnicas, criando o que seria, na prática, uma remasterização do título de… 2019. Em menos de 3 anos, honestamente, pelo menos no PC, não cremos que existam assim tantas novidades que justifiquem um “upgrade” técnico mas nas novas consolas, até faz sentido.
Simpaticamente, é possível adquirir o upgrade para esta edição a preço reduzido, caso já tivessem o jogo base e DLCs e desejem a nova versão. Contudo, fora de promoção, este é um título a preço de jogo final, pelo que o que se esperaria deste tipo de produto era que, no mínimo, tivesse uma qualidade superior ao original… ou não faria sentido chamá-lo de “remasterização”, certo? Pois bem, ainda agora me pergunto porque é que esta edição foi lançada neste estado.
Não vou, obviamente, falar muito do conteúdo. Tudo o que precisam saber sobre o jogo está escrito em baixo. A nível de conteúdo, tirando alguns pequenos detalhes que não merecem grande foco, tudo está praticamente intacto no jogo base e nos pacotes “Peril in Gorgon” e “Murder on Eridanos”. Para quem não conhece este jogo, esta é uma óptima oportunidade de conhecer mais um óptimo RPG da Obsidian, com “ares” de “Fallout” no Espaço, isto ainda sem termos o longínquo Starfield.
Se quiserem mesmo saber, temos um novo nível máximo de personagem e… bom, é isso. Como disse, não é nada que realmente mereça qualquer tipo de destaque. Podíamos receber este novo “level cap” numa banal actualização de título no jogo original. O único foco para esta edição, portanto, é a nível técnico, numa óbvia tentativa de lucrar mais um pouco com uma reedição. E é só mesmo sobre o plano técnico que iremos falar nesta actualização da análise original. Acreditem, há mesmo muito para falar sobre isso, infelizmente, não pelos melhores motivos.
Embora os ecrãs de carregamento mais chatos e alguns bugs que precisavam de ser “passados a ferro”, The Outer Worlds foi um jogo fantástico de analisar e de terminar, com todo o humor, acção e intriga que tento relatar em baixo. Tal como aconteceu em outras remasterizações recentes, não vi grande necessidade de uma actualização, num jogo visualmente competente. A minha análise original numa PS4 Pro, conforme poderão constatar, foi tecnicamente estável, com boa performance no geral, tornando-se ainda melhor com actualizações posteriores.
Desta vez na PlayStation 5, o que foi prometido na promoção desta reedição foram melhores texturas, mais detalhes de cenário, melhor iluminação e melhores efeitos visuais, assim como, passo a citar: “um melhor desempenho”. Aqui, a promoção refere-se, não só à maior velocidade nos carregamentos mas também à própria performance do jogo, falando, claro, de fotogramas por segundo ou “fps”. O que é francamente irónico, porque é mesmo aí que o jogo “cai ao comprido”.
Não sei bem onde reside o problema. Tanto a jogar como nas cenas intermédias há quebras inexplicáveis de fps, independentemente do modo gráfico que escolhemos no menu, seja modo “performance” ou “cinemático”. Sim, tudo tem um outro “look”, mais polido, com melhor definição e gostei imenso da melhoria geral nos controlos, ainda mais com a performance do nosso adorado comando DualSense. Mas, essa maior definição provocou uma quebra notória na fluidez.
Parece que a produção quis simplesmente melhorar onde podia visualmente, deixando a optimização para segundo plano. Basta instalar a versão PS4 do jogo e testar em paralelo (na própria PS5) para ver que já era possível correr o título original numa resolução 4K com uma fluidez muito melhor, na ordem dos 60fps. Nesta reedição, embora tente, nunca consegue lá chegar, havendo momentos que nos parece atingir a metade deste valor. Pelo menos no modo “performance” deveria ser possível estabilizar os fps mas não é isso que acontece.
Sejamos claros, isto não vos impede realmente de jogar ou de disfrutar desta óptima experiência. Apenas vos dará a sensação de estar a jogar uma “beta” de um jogo ainda em produção ou por optimizar. Não há bugs ou falhas técnicas gritantes, é certo, mas fico profundamente desapontado que a Obsidian e a Private Division decidam lançar esta reedição sem perder umas horas adicionais a optimizar tudo, de modo a que, pelo menos, tenha a mesma performance do original. E não só na PS5!
Embora não tivesse testado o jogo no PC, basta uma visita à página do jogo no Steam para vermos que o mal não é das consolas da Sony. Ao que parece, no PC a situação é idêntica, senão pior, com jogadores a relatarem quebras igualmente drásticas de performance em PCs de grande capacidade. Pelas redes sociais, também ficou claro que a versão Xbox padece dos mesmíssimos problemas. Correndo o risco de mencionar o óbvio, diria que a Spacer’s Edition merecia mais tempo “no forno”.
Veredicto da Spacer’s Choice Edition
O principal foco desta reedição era o visual e a performance melhorados, ao mesmo tempo que oferecia um pacote completo e modernizado desta óptima experiência, agora nas novas PlayStation e Xbox. Infelizmente, The Outer Worlds: Spacer’s Choice Edition é uma (cara) reedição que consegue o autêntico “feito” de ter pior performance geral, a troco de um novo look mais bonito. Continua a ser um excelente jogo, sem dúvida, mas não oferece nada de novo, pelo contrário. De certa forma, é bem possível que ficassem melhor servidos comprando o jogo original e os DLCs.
[Análise ao DLC “Murder on Eridanos” de 21 de Março de 2021]
Com cerca de um ano meio de vida, The Outer Worlds ainda dá cartas. Consolidou-se como um dos melhores jogos de 2019, confirmando que a Obsidian Entertainment é mesmo exímia a criar bons RPGs. E agora temos mais uma expansão, “Murder on Eridanos” para nos fazer lembrar o quão bom realmente é.
Confesso que torci um pouco o nariz para regressar a este jogo e analisar esta expansão. Afinal, já tinha acabado a história principal e o DLC obrigou-me a voltar atrás para o conseguir jogar. Se o tinha de fazer novamente para este outro título, pensei que não teria paciência. De facto, para jogar este título, também temos de ter um nível elevado (30 é o recomendado) e só se desbloqueia depois de conseguirmos acesso à plataforma de aterragem de Stellar Bay. E, não, uma vez mais não podem jogar a expansão se já acabaram o jogo. A minha decisão, desta feita, foi recomeçar o jogo todo em vez de recuperar um savegame antigo. Poderão achar uma decisão um tanto desnecessária, mas aproveitei para mudar de plataforma. Analisei o jogo base e o primeiro DLC na PlayStation 4, agora escolhi o PC para abordar esta expansão. Se é para reiniciar, que se reinicie em beleza.
Eridanos pode parecer um bonito planeta para visitar, mas não estamos aqui para fazer turismo. Houve um assassinato na colónia de Halcyon e é preciso um detective para investigar. Como já devem ter adivinhado, somos nós, comandantes da nave Unreliable e a nossa tripulação improvável. A vítima é famosa Halcyon Helen, a porta-voz da Rizzo’s, na verdade a actriz Ruth Bellamy. Helen estava em Eridanos durante o evento de lançamento da nova vodka Spectrum Brown e apareceu morta. Todos os presentes neste evento são obviamente suspeitos e o mistério só se adensa com alguns desenlaces inesperados. Felizmente, não vamos apenas usar a intuição, uma vez que temos um novo dispositivo, o Discrepancy Amplifier para nos ajudar a descobrir o culpado.
Claro que, num jogo que tanto assenta no seu enredo e complexa construção de personagens, não pode ser algo assim tão simples, como só reunir pistas de um assassinato. Há algo estranho a acontecer em Eridanos e está certamente ligado à morte da actriz. Alguns habitantes desta colónia da Rizzo’s estão a comportar-se de maneira estranha. Todo o ambiente artificialmente colorido deste planeta de plataformas flutuantes esconde um mistério muito maior que este assassinato. Tal como o DLC anterior, não esperem muito mais de umas 6 horas adicionais de jogo, fazendo tudo pausadamente e sem pressa. Ainda assim, diria que, pelo menos o enredo é suficientemente competente para vos agarrar.
Para justificar o nosso regresso ao jogo, temos alguns novos destaques. Eridanos, claro, é uma nova área de jogo que explora bem o conceito de “semi” mundo aberto do jogo base. O mundo é composto por plataformas de terreno flutuante, repletas de imensas áreas para explorar, com o destaque para o Grand Colonial Hotel, o centro das atenções nesta nova trama. Esperem também um aumento do nível máximo da personagem (36), uma série de novas armas e armaduras únicas, com destaque para três novas armas de ciência. Não pensem, porém, que este é um DLC mais cerebral, uma espécie de CSI no espaço. Uma boa parte das missões envolve investigação, sim, mas todo o combate visceral e “à lá Fallout” do jogo está aqui.
O já mencionado Discrepancy Amplifier é, na verdade, a grande “arma” que usaremos nesta expansão. Trata-se de um aparelho que mede as inconsistências temporais em volta do local do crime, desvendando segredos de outra forma invisíveis. Pensem na “visão de detective” de Batman e terão uma ideia do que faz. Odores, pegadas, impressões digitais, assim que activamos o dispositivo, nada escapa ao seu faro electrónico. Como não podia deixar de ser, o dispositivo tem um certo carisma próprio, muitas vezes dando-nos uma avaliação cómica do que observa. Por exemplo, constatando o facto do corpo de alguém ser… um cadáver…
Uma nota curiosa para a versão PC que pude testar nesta ocasião. Obviamente, temos aqui um jogo bem mais refinado, com melhores prestações e melhores efeitos visuais que na versão original testada na PS4. O suporte para teclado e rato (também suporta gamepads) é obviamente onde qualquer RPG que se preze se sente “em casa”. Alie-se a isso uma performance bem acima da média, efeitos de iluminação mais apurados e texturas de maior resolução, sem esquecer os melhores tempos de carregamento (depende do tipo de disco rígido que têm no vosso PC) e temos aqui a versão mais interessante no plano técnico. Mesmo que tenha recentemente recebido uma actualização para correr a 60FPS na PS5 e Xbox Series X|S via retrocompatibiliade, diria que a versão PC é a melhor de todas.
Ainda assim, nota-se que o motor gráfico do jogo já está datado. Lançar um DLC nesta altura, em que muitos jogos andam a puxar pelos PCs e pelas capacidades do Hardware moderno, faz com que qualquer jogo que não acompanha “a onda”, sofra um pouco. Tecnicamente, continua a ter um design fantástico, admito. Mas, ao esperar tanto tempo para lançar um segundo DLC, a Obsidian podia ter lançado algumas novidades técnicas para o actualizar visualmente. Ainda por cima, sabendo que temos por aí mods para activar Ray Tracing e outras opções visuais. Considero uma oportunidade perdida para a Obsidian dar uma verdadeira nova vida ao jogo. Duvido que tente criar alguma nova versão, até porque esta foi a última grande actualização feita ao jogo.
Veredicto de Murder on Eridanos
Demorou mas lá foi lançada a segunda e última expansão para The Outer Worlds. Novamente, não se pode dizer que, com expansão, “Murder on Eridanos” traga grandes novidades ao jogo. Tal como a primeira, esta é uma expansão para ampliar a jogabilidade um pouco mais, trazendo-nos um novo planeta, novas personagens e uma história original, sem esquecer um novo utensílio modificador que nos divertirá. Não tenta reinventar-se, com pena minha. Gostava que a Obsidian Entertainment tivesse aproveitado a oportunidade para rejuvenescer o jogo com as novidades de hardware do momento. Assim não foi. Ainda assim, considero uma boa forma de encerrar o conteúdo de um dos melhores RPGs dos últimos anos. Seguramente, um clássico no futuro.
[Actualização DLC “Peril on Gorgon” de 14 de Setembro de 2020]
Quando uma receita é apreciada, é bom que não se mexa muito, sob pena de perder o “sabor”. The Outer Worlds foi um dos jogos que mais gostámos de jogar no ano passado. E a Obsidian Entertainment traz agora “Peril on Gorgon“, um DLC que é “mais do mesmo” e ainda bem…
Convenhamos que The Outer Worlds veio colmatar uma enorme lacuna que sentíamos. Há quanto tempo não tínhamos algo no género tão único criado por Fallout? Na altura, a resposta da Obsidian foi bem à altura e adorámos cada momento, algo que podem constatar na análise em baixo. 11 meses depois, “Peril on Gordon” veio relembrar-me porque é que gostei tanto de jogar o original em Outubro passado. Mas, mais do que isso, porque é que gostei tanto de jogar um dos clássicos RPGs de acção da… Bethesda. Não se preocupem, uma vez mais, pode parecer mas continua a não ser um plágio… não no seu pleno sentido. Este é um jogo com um ADN muito próprio e este DLC é como uma assinatura por baixo.
Convenhamos que esta é uma expansão no pleno sentido da palavra. Não recebem grandes modificadores da jogabilidade, tudo será francamente familiar. Terão meramente um aumento do nível máximo (33) e um punhado de novas armas e armaduras. E é, basicamente, só isto que podemos listar no que toca a adições de algo novo neste sector. Não há alteração nas personagens já conhecidas e nem sequer terão um novo modo de jogo ou uma complexa nova linha de história alternativa. É mesmo mais uma porção de jogo extra para justificar o nosso regresso. E notem que não estou a criticar… Por mim, tudo bem!
O que recebemos, na realidade, é uma nova missão na onda das outras missões originais, com vários passos e secções, além de uma série de novas missões secundárias, tudo numa nova região para explorar. Este é um novo capítulo, sim, mas não precisam sequer acabar a história base (nem podem, já explico), bastando-vos passar a história além do planeta Monarch para activar a nova área. Este novo ciclo acrescenta um tom “noir” ao jogo, que inclui também imensas novas cenas intermédias e diálogos, com a mesma qualidade do jogo base. Houve também imenso cuidado em transmitir este ambiente mais sinistro através das personagens e também através do visual geral, com uma clara alteração de design das novas áreas.
A tripulação da nave Unreliable descobre um braço decepado que possui uma enigmática mensagem. Este estranho “bilhete” leva-os para o asteróide Gorgon, mais precisamente até um antigo centro de estudos científicos da Halcyon. E, sim, uma vez mais, aqui também aconteceram algumas experiências absolutamente catastróficas. Sem querer desvendar muito, porque é a descobrir a história que mais se irão divertir, numas 7 ou 8 horas vamos desvendar mais um mistério, enquanto caçamos meliantes e monstros aberrantes, enquanto fazemos acordos improváveis com gente honesta e arruaceiros de igual forma. O costume, portanto. E também há mais habilidades e falhas para explorar a nossa personalidade, claro.
Por causa da sua inserção “ali a meio”, fiquei com a sensação que a porção de jogo neste DLC podia muito bem estar no jogo base. Ainda assim, a sua história é bastante bem compartimentada para ser jogada de uma assentada, entre os eventos da grande história principal. Só que há um senão. É que não podem jogá-lo no início da carreira, como já expliquei. Mas, também não podem jogar este DLC depois de terminada a história base. O que foi para mim algo negativo, porque já tinha terminado o jogo-base e só queria mais uma “dose” desta trama. Inserida no meio de uma primeira passagem ou num reinício, ainda podem jogar o DLC. Mas, se já o acabaram, terão de recuperar um save-game antigo. Uma opção para jogar só o DLC era bem vinda depois de terminado o jogo base.
Se há algo que tenho mesmo de realçar nesta expansão é o seu humor. Era já um dos destaques no jogo base mas aqui a Obsidian entrou num autêntico “overdrive cómico”. Todo o guião e os seus diálogos, já agora, estão pejados de pequenos pormenores cómicos, sempre dispostos a arrancar-nos um sorriso ou mesmo uma gargalhada fácil. Ninguém aqui vai ganhar algum prémio de comédia “stand up”, notem, mas a boa disposição é constante, resultante também do excelente casting de actores. Diria que a atmosfera é algo na onda de Guardians of the Galaxy ou parecido. Aliado a algumas ideias rocambolescas no conceito do jogo, teremos momentos mesmo caricatos.
Veredicto
Se gostaram tanto de The Outer Worlds como eu gostei, vão adorar “Peril on Gorgon”. Não porque adicione algo inovador a um jogo já tão brilhante mas porque continua a boa disposição, dando-nos um novo asteróide a uma história inédita para seguir. Só tenho pena que não possamos jogar este DLC de forma individual, obrigando-nos a começar o enredo de novo ou a recuperar um savegame anterior. Mesmo assim, foi um prazer voltar a este jogo da Obsidian Entertainment. E a comédia latente, junto com a sua jogabilidade já tão apreciada, compensou voltar atrás um pouco.
[Análise original de 23 de Outubro de 2019]
Apertem os cintos, a Obsidian Entertainment quer levar-nos até ao espaço longínquo. Este The Outer Worlds é a mais recente aposta deste experiente e aclamado estúdio dedicado aos Role Play Games. E que aventura esta equipa nos preparou.
Embora seja também um fã de Pillars of Eternity, quanto a mim, onde a Obsidian brilhou foi sempre nos RPGs de acção. E, embora recorde com saudade o seu incompreendido Star Wars: Knights of the Old Republic II: The Sith Lords, ainda hoje considero Fallout: New Vegas como um dos seus melhores jogos, além de ser igualmente um dos melhores jogos dessa série. E tenho uma ligeira impressão que a produtora sentiu uma certa saudade desse grande clássico quando iniciou este projecto. Mais do que simplesmente reinventar um conceito, a produção decidiu recuperar muitas das mecânicas e lógicas que gostámos nesse jogo, deu-lhe uma nova identidade, poliu o que precisava ser polido e arrumou tudo no devido lugar. Mais do que um plágio, contudo, esta é uma “declaração de amor” a um género tão único. E, raios… deu-me ganas de jogar New Vegas novamente, confesso.
No que a produção chama de “futuro alternativo”, a sociedade humana evoluiu de tal forma, que enveredou pela conquista espacial. Contudo, com essa evolução, também o espírito corporativo ganhou tracção e o espaço é agora lidado como uma enorme área de negócios de grandes empresas. As colónias subsistem para contribuir para o sistema e todos são praticamente obrigados a viver neste regime capitalista, de uma forma ou de outra. E para colonizar os planetas, é preciso colonos. Da Terra são enviadas várias naves com trabalhadores em hibernação de modo a preencher as necessidades das colónias da mega-corporação Halcyon. Contudo, numa dessas viagens (a nossa), as coisas não correm bem e a nave fica à deriva, abandonada pelo infame “The Board”.
Perdido para sempre? Obviamente que não. No nosso sono (muito) profundo, somos acordados por um famoso activista contra este sistema corporativo, Phineas Welles. A nossa viagem começa logo aí, inicialmente com contornos pouco claros. Mas, cedo percebemos que há uma enorme conspiração no ar que cabe a nós desvendar. E pelo meio, vamos deambulando pelo complexo mundo burocrático e de um certo esclavagismo assumido das várias organizações que gerem as colónias, ajudando ou prejudicando facções inteiras. Devo dizer que, como é hábito nesta produtora, a história ramifica-se e os inúmeros pequenos desenlaces e decisões tomadas criam reverberações de enorme alcance. Esta é, de facto, uma história moldável e onde somos mesmo os protagonistas.
E muitos destes desenlaces surgem em diálogos. Muitos, mesmo muitos, diálogos. Gostava de saber quantas horas de estúdio a Obsidian gastou para captar todas as linhas de diálogo de vários actores que emprestam a voz às personagens. Foram certamente muitas. Só tenho pena que a nossa personagem não fale. Ao bom jeito dos RPGs clássicos, escolhemos linhas de texto e só as personagens é que falam connosco. Mas, não pensem que os diálogos são sintéticos ou pro-forma. Cada personagem em jogo possui o seu próprio enredo, a sua própria história para contar e as suas motivações. Há conversas verdadeiramente brilhantes, bem humanizadas, algumas hilariantes pelo meio, num bom humor latente em quase tudo.
Aliás, foi um dos elementos que mais gostei neste jogo. Porque podemos escolher o que perguntar ou responder, muitas das reacções rondam o tom jocoso ou até de insulto. A nossa personagem vai-se moldando nestes diálogos, muito além das escolhas de habilidades e traços de personalidade (já lá vamos). Ajuda bastante que as personagens possuam animações credíveis com emoções bem talhadas nas suas expressões, com um casting de vozes bem escolhido e absolutamente dedicado às suas personagens. Algumas coisas não funcionam a 100% nas interacções, como o sincronismo de lábios, por exemplo mas não é nada que quebre verdadeiramente a jogabilidade. A imersão nos diálogos está lá e é isso que interessa.
As personagens que servem como nossos companheiros de aventura são o exemplo máximos desta qualidade. Para cada missão, podemos escolher levar connosco dois companheiros. Cada novo companheiro que encontramos ao longo da história, tem também a sua própria personalidade vincada, além de contribuírem para as missões com habilidades únicas. A ingénua Parvati Holcomb é das primeiras companheiras disponíveis, sendo bastante útil como engenheira para algumas tarefas mais tecnológicas. Felix Millstone quase que implora para nos acompanhar mas na sua irritabilidade inata, acaba por ser importante com as suas armas pesadas. E há mais gente para descobrir, até um vigário nos pode acompanhar. A selecção destes companheiros certos é essencial em algumas missões.
O que também é essencial é a evolução, não só do nosso “Stranger” mas também destes companheiros. Não seria um RPG se não tivesse uma complicada tabela de habilidades. Quem estiver familiarizado com a fórmula “S.P.E.C.I.A.L.” de Fallout, vai facilmente reconhecer esta. Além de traços de personalidade, como inteligência, intimidação ou liderança, também nos movimentos furtivos, no ataque ou na defesa com diferentes tipos de armas são importantes. A cada novo nível temos 10 pontos para distribuir. E, partilhando com os companheiros, também temos perks para desbloquear, como maior velocidade de passada, mais energia (stamina) ou mais vida, etc. Cada habilidade e equipamento tem prós e contras e vão passar imenso tempo a estudar cada combinação neste menu.
Mas, há uma habilidade que é de extrema importância, pelo menos no combate. A Tactical Time Dilation (Dilatação Táctica do Tempo) permite pausar o tempo à nossa volta, dando-nos uma importante vantagem nos ataques. Basicamente, desaceleramos tudo à nossa volta e movimentamo-nos furtivamente. Isto permite uma série de vantagens, desde ataques surpresa a incautos, ou até tiros de precisão com tempo para mirar. É inevitável associar este modo ao infame sistema VATS de Fallout. Mas, aqui, é “on demand” mesmo fora dos tiroteios. Confesso que, ao fim de umas horas, esta habilidade acaba por ser pouco usada e age como uma mera opção quando estamos mais “apertados”.
Isto, porque o próprio combate não é nada de extraordinário. Nas primeiras horas de jogo, notei que a história não faz muito para nos empurrar para os tiroteios, com algumas decisões que evitam mesmo actos mais agressivos. Percebi que, de facto, mesmo andando sempre de arma em punho, The Outer Worlds não é tão focado na distribuição de munição. Temos diversos tipos de pistola, carabinas, caçadeiras, etc, contando ainda com diversas armas melee (combate próximo), mas não há grande personalização ou foco nestas ferramentas letais. Aliás, são todas “esquecíveis”, mesmo algumas armas de ciência mais raras. Acabamos por desmantela-las ou vendendo-as quando encontramos uma nova unidade mais potente.
Uma das mecânicas que este jogo tanto tenta promover no combate, também não é lá muito brilhante. Embora tenha grande ênfase na movimentação furtiva, permitindo-nos ver através da vegetação alta, por exemplo, por mais que apostemos nesta forma de jogar, atacar inimigos de forma furtiva é frustrante. Não só não temos armas silenciadas, como os ataques melee não são muito fortes. Mesmo com o bónus de dano dado pelos ataques surpresa, nunca são totalmente eficazes e alertam sempre os demais inimigos. Diria mesmo que a habilidade furtiva é um pouco irrelevante, por causa disto. Mais vale mover os nossos companheiros para os flancos e abrir fogo “sem dó nem piedade”.
Mas, noutros lados, vale bem a pena o investimento. A habilidade da Engenharia permite-nos arrombar portas ou cofres cada vez mais desafiantes. Mas, não se assustem. Não há aqui nenhuma lógica de lockpick ou hacking complexo. Arrobar fechaduras é um processo automático, condicionado apenas pelo nosso nível de habilidade e pela quantidade de “lockpicks” que temos. A acção em si é só um pressionar de botão. Também é bom evoluir as capacidades de diálogo e de personalidade para desbloquear linhas de conversa importantes. Mentir, por exemplo, pode nos safar muitas vezes. Apenas recordo uma vez mais, que há prós e contras. Arrombem muitas fechaduras ou mintam muito e verão a vossa reputação cair a pique.
Esta forte base nas decisões, aliás, é de ter em conta em tudo. Ao fim de umas boas dezenas de horas (das cerca de 30 prometidas no total), ou somos um zeloso cumpridor da lei, salvador das colónias e benfeitor, ou somos um aventureiro irreverente e “carta fora do baralho”. As muitas missões e tarefas disponíveis, algumas entre planetas, envolvem quase sempre uma decisão. Ou trabalhamos de forma altruísta ou somos perfeitamente egoístas e só zelamos pelos nossos interesses. Lá mais para o fim verão as vossas decisões ter efeitos positivos e negativos entre as facções, contudo, não há aqui nenhum lado bom ou mau. Tudo é perfeitamente arbitrário com desenlaces em aberto. A moral é perfeitamente dúbia e varia com a vossa forma de jogar.
Um bom exemplo disto está na forma como podemos resolver algumas missões. Numa das primeiras que irão encontrar, é dada a opção de cortar energia a uma colónia inteira ou a um grupo de dissidentes. A opções são bem mais vastas que apenas decidir quem fica sem electricidade, porém. Podemos entrar no acampamento de dissidentes e aterrorizá-los, ameaçar a chefe da colónia (ou até matá-la) ou decidir tudo de forma pacífica, em nome da lei das colónias. Só quando a missão termina e queremos voltar atrás para decidir de outra forma é que vemos o grau de empenho da Obsidian de colocar tudo nas nossas mãos. Talvez tenham alguma influência dos companheiros mas a moral é só nossa e não há decisões “certas” ou “erradas”. Enfim, como todos os RPGs deviam ser.
E a aventura só tem a beneficiar do seu palco de fundo. Tudo isto se passa no espaço, em planetas exóticos e cheios de fauna e flora absolutamente alienígena. O trabalho da Obsidian de criar cada planeta com ADN próprio é de louvar. Embora os mapas não sejam propriamente abertos na sua inteireza, sendo alguns até algo lineares, são suficientemente amplos e com muitas áreas para explorar. E podemos entrar na nossa nave, carinhosamente chamada de “Unreliable” (“Não Confiável”), um nome claramente injusto. Em cada planeta há paisagens inóspitas e estranhas, tendo sempre algumas colónias implantadas, na maioria repletas de edifícios padrão com néon capitalista. Houve muito trabalho de design para criar estes mundos credíveis e complexos.
E tudo isto correu muito bem na nossa PlayStation 4 Pro. Aliás, que enorme contraste que é este jogo, se comparado com os inúmeros problemas que New Vegas teve na anterior PS3. Outros tempos, é verdade. Na actual PS4, The Outer Worlds foi criado com o robusto Unreal Engine, o que se traduz em modelação, texturas e efeitos visuais de qualidade. Notem que o jogo nunca tenta ser foto-realista propriamente, tendo até alguns elementos exagerados e a roçar a banda-desenhada ou o surreal. Contudo, o design assenta muito bem no tipo de jogo. E não há nenhum problema de performance de assinalar. Talvez uns poucos bugs que testemunhei e alguns ecrãs de carregamento mais chatos. Mas, é tudo.
Veredicto
Esta é a prova que a Obsidian Entertainment é uma das melhores produtoras de Role Play Games da actualidade. The Outer Worlds é uma aventura sólida, com muito elementos familiares mas trabalhados de uma forma dedicada e para se tornar em algo único, com um design tão próprio e uma história que nos envolve até ao fim. O foco nos diálogos em detrimento de uma abordagem mais virada para o combate, pode ser um retrocesso para alguns. Mas, para mim, é uma aposta muito bem vinda para recuperar a fórmula mais clássica dos RPGs. Decisões! Muitas decisões, numa história moldada à nossa forma de jogar, afinal o que tornou este género tão popular.
- ProdutoraObsidian Entertainment
- EditoraPrivate Division
- Lançamento25 de Outubro 2019
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
- GéneroAcção, Role Playing Game
Este título ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- A história de um modo geral
- Muitas decisões e diálogos
- Humor latente
- A fórmula clássica dos RPG revisitada
- Combate não é muito entusiasmante
- Alguns ecrãs de carregamento mais longos
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.