Análise – Vampire The Masquerade: Swansong
Esta é uma franquia que, tal como várias outras série de RPGs de tabuleiro, possui muito potencial para videojogos. Vampire The Masquerade: Swansong é uma aposta ambiciosa para a produção da Big Bad Wolf e edição da Nacon.
Sem qualquer dúvida, o género de Role Play Game é dos mais exigentes desta indústria. Para o estúdio de Bordéus, porém, o desafio é bem maior que apenas criar um jogo estruturalmente sólido com os clichés do género, é também preciso provar que “tem o que é preciso”. Anteriormente, o estúdio lançou o modestamente aclamado “The Council” num género de “Aventura Narrativa”. Com Swansong, a produção aposta agora no que chama de “Role Play Game Narrativo”. Do que fomos vendo em promoções, parecia algo realmente interessante. Mas, como sempre, nesta indústria é preciso ter cuidado com as expectativas.
Se não conhecem o lore geral dos RPGs de tabuleiro que lhe dão o nome, vão passar um bom bocado a indagar o que se passa no ecrã. Antes de mais: os factos. Como o próprio título indica, vamos acompanhar uma história de vampiros. Neste universo paralelo, chamado de “World of Darkness”, estes seres sobrenaturais deambulam entre a Humanidade, saciando a sua sede de sangue e controlando a sociedade Humana, a sua comida, desde as sombras. Existem vários clãs de vampiros e muitas guerras internas pelo poder, levando a conspirações, por vezes violentas.
A história aqui gira em torno de uma investigação baseada nestes jogos de bastidores, acompanhando três personagens jogáveis. Galeb um protector do clã Camarilla, Emem uma agente do clã Toreador e a vidente pessoal da liderança, Leysha do clã Malkavian. Os três são chamados à sede de Boston pela “Prince” do clã Camarilla, Hazel Iversen, por causa de um “Alerta Vermelho” que foi activado. Quem despoletou um tiroteio mortal que põe em causa a sobrevivência dos vampiros e qual o objectivo deste acto, será o trabalho das três personagens que vamos controlando de forma alternada.
Tudo isto é apresentado num extenso primeiro capítulo onde acompanhamos as histórias e as perspectivas iniciais das três personagens. Cada personagem possui um papel e habilidades diferentes das demais, sendo até possível passar alguns momentos da história de forma repetida nas três perspectivas. O elemento Role Play surge na forma como angariamos pistas para desvendamos o grande caso. Também interagimos com as demais personagens, desenvolvendo relações e despoletando desenlaces únicos nessas histórias que seguem lado-a-lado.
A grande questão aqui é que o jogo não tenta sequer preparar o jogador para o intrincado lore desta franquia de longa data. Em muitos casos, quem o escreveu parte do suposto que estamos a perceber o que se passa, quem são os intervenientes e porque agem daquela forma. Há uma curtíssima introdução em texto e um codex que tentam explicar em curtas linhas anos de histórias e desenlaces. O que, realmente, não chega. Convenhamos que um singelo videojogo não substituiria a história original.
Entendo que a complexidade deste lore faz as delícias de muitos fãs. E é bem possível que se interessem pela temática ou pelos intervenientes. Só que, se não conhecerem Vampire The Masquerade fora deste contexto de Swansong, esta história e o seu lore tornam-se demasiado intrincados e complexos, fazendo um recém-chegado perder-se um pouco e, claro, perder o interesse. Este é um jogo claramente criado para fãs da série de jogos de tabuleiro ou, pelo menos, inteirados dos pontos principais.
Contudo, nem é este o maior problema do jogo. Todos os que gostam do tema, conhecem minimamente as bases comuns das histórias de vampiros. E muitos que já jogaram algum título deste género, estão habituados a apanhar facilmente os traços gerais. Só que a Big Bad Wolf não se ficou por criar uma lógica de Role Play tradicional e adaptar à história geral de Masquerade. A produtora tentou criar algo diferente, mais de encontro com a sua própria experiência de aventuras gráficas. É aqui que nos perde.
Não é a primeira vez que Vampire The Masquerade deambula pelos meandros dos videojogos. A sub-série Bloodlines é uma das mais populares e o segundo jogo está a ser muito antecipado. Talvez por isso, como irão ver, este jogo foi concebido de uma forma um pouco diferente dos jogo RPG que estamos habituados. Este é um RPG que assenta numa lógica de pura investigação, com uns quantos elementos de acção furtiva. Foca-se essencialmente em contar a sua história tríplice dos mesmos acontecimentos, sem escolhas óbvias, dando opções aos jogadores.
Isto faz com que, em demasiados momentos, sejamos espectadores de uma história algo linear, que demora a “acelerar” e que segue três pessoas de forma paralela, não necessariamente convergente. Isto faz com que não se consiga ganhar empatia por nenhuma das personagens, tornando as nossas decisões um tanto inócuas. Por outro lado, quase tudo parece pré-orquestrado com uma certa sensação de ilusão de escolha. E quando realmente escolhemos algo, os efeitos lá mais para o fim não um tanto desapontantes. Mas, sem spoilers para quem jogar.
No plano da jogabilidade, infelizmente não consigo criar em vocês uma grande expectativa. Este não é um jogo de acção, pelo menos não daquela que, se calhar, gostariam de ver com vampiros. Aliás, o facto destas personagens serem vampiros pouco adiciona à sua jogabilidade. Este é um jogo de investigação e… conversa, muita conversa. A principal componente é a escolha de diálogos, alguns claramente duvidosos a nível de moral, outros, nem por isso. Pelo menos comigo, as opções são escolhidas só para “ver o que acontece” e não tanto baseado numa decisão lógica.
A componente de progressão e melhoria de atributos das três personagens é uma complicação desnecessária. A produção exagerou a criar um sistema com base em quatro árvores de evolução com progressão distinta: habilidades da personagem, disciplinas, talentos e características. Sinceramente, podiam ser só uma ou duas árvores de progressão. Acabamos por escolher os upgrades de forma quase aleatória pela quantidade de escolhas. Contudo, depois percebemos que há falas ou acções bloqueadas porque nos falta um perk. E não me façam falar dos boosts e consumíveis porque só adicionam ainda mais complicação.
Até podemos ter aqui um enredo pouco inspirado e uma jogabilidade algo obtusa, não é descabido que alguns RPGs sejam lentos a cativar e complexos para interagir. Contudo, qualquer bom RPG necessita de um bom suporte na parte técnica. Mas, até aqui vemos a produção a deslizar pelo desconhecido. Devo dizer que nas promoções deste jogo, apreciei bastante a arte conceptual geral, parecendo que tínhamos aqui um título de elevado gosto visual e com um grafismo aparentemente bem conseguido.
Só que, agora que joguei, só me lembro de uma palavra para o descrever: desapontante. A nível de cenários, iluminação e efeitos visuais, devo dizer que o jogo possui um conceito muito elogiável. Em alguns momentos, mostra-se deslumbrante, de facto. Mas, quando a câmara aponta para as personagens, perde-se a magia e o potencial todo. O que, num jogo em que a principal componente são os diálogos frente-a-frente, é uma perfeita contradição que não soa bem num RPG… narrativo…
As faces das personagens parece bonecos genéricos, decorados levemente para não parecerem tiradas directamente do “stock”. A sua anatomia é em muitos casos estranha, com corpos algo disformes e muita falta de cuidado na modelação dos mesmos. As animações gerais são dignas dos anos 90, com destaque pela negativa para as animações faciais e para o quase inexistente sincronismo de lábios. Há momentos em que mais parecem marionetas sem vida. Aliado a isto está um casting de vozes que claramente não fez grande esforço em entregar as falas.
É que “os olhos também comem” e este que poderia ser o “laço no topo do presente” acaba por aumentar ainda mais o nosso desapontamento. Tive a oportunidade de testar o jogo num PC e senti que estava a jogar um título datado visualmente, com animações claramente feitas à mão e sem grande profundidade técnica. Poderão achar que estou a ser muito duro com uma produtora ambiciosa e a quem falta experiência. Contudo, lendo o que escrevo acima, torna-se difícil defender o jogo tecnicamente.
Veredicto
A Big Bad Wolf quis criar em Vampire The Masquerade: Swansong uma mistura do que fez com o seu jogo anterior, introduzindo levemente alguns elementos de Role Play. O que é certo é que a mistura não correu bem, algo exacerbado pela sua notória falta de “know how” ao nível técnico. Para um jogo desta ambição de um estúdio pouco experiente, até pode ser um feito o que aqui conseguiu. Mas, no género RPG espera-se sempre algo mais elaborado que o que entregou. E penso que esta franquia de longa data precisava de mais cuidado.
- ProdutoraBig Bad Wolf
- EditoraNacon
- Lançamento19 de Maio 2022
- PlataformasPC, PS4, PS5, Xbox One, Xbox Series X|S
- GéneroAventura Gráfica, Role Playing Game
Ainda não tem uma classificação por estamos a rever o nosso esquema de pontuações em análises mais antigas.
Mais sobre a nossa pontuação- Design de Cenários
- Alguns desenlaces complicados de decidir
- Modelação e animações das personagens
- Sistema de evolução complicado demais
- Pouca ajuda no lore complexo
Esta análise foi realizada com uma cópia de análise cedida pelo estúdio de produção e/ou representante nacional de relações públicas.