Entrevista – Emmanuel Roth (Days Gone)

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Aquando do evento de apresentação do jogo Days Gone por parte da Sony Interactive Entertainment, tivemos a oportunidade de entrevistar Emmanuel Roth, Senior Staff Animator do Bend Studio para este jogo. A conversa envolveu muitos pormenores curiosos e uma visão privilegiada de alguns aspectos da produção.

WASD – Emmanuel, que desafios vos trouxe Days Gone, sabendo que há tantos jogos neste género de mundo aberto com elementos de sobrevivência.

Emmanuel Roth – O desafio inicialmente era criar um novo IP (Propriedade Intelectual). Criar um novo jogo é um desafio. Que é que queremos criar? Que história queremos contar? Decidimos fazer um jogo de acção em mundo aberto e esse foi o início. Isto significava que teríamos um grande espaço para preencher. Tem de ser interessante para as pessoas, tem de ter muita variedade, tem de estar “vivo” e é um dilema para nós. Por outro lado, o director (John Gravin) queria contar uma grande história, um grande evento cinemático com uma história longa e bem orientada. Isto num mundo aberto não é muito fácil de conseguir. Esse foi um dos maiores desafios. Tudo isto em conjunto, escolhendo um motoqueiro, que papel teia a própria mota, como é que este mundo evoluía, foi mesmo muito desafiante.

Na minha parte, na animação, foi o das criaturas, decidir como se movem no mundo, como comunicam e o que fazem. Queremos que o jogador possa aperceber-se que estão a caçar comida ou que se apercebem da presença do jogador, a postura muda e perseguem-nos.

W – Há muita linguagem corporal que precisa ser transposta para a animação.

ER – Exactamente. Tivemos de trabalhar com os actores de captura de movimento para dar-nos isso, procurando essa linguagem, esse movimento.

W – Portanto não trabalhou directamente com Sam Witwer ou outros actores em particular.

ER – Não trabalhei com o Sam. Essas cenas mais cinemáticas não foram a minha parte. Trabalhei com os duplos de captura de movimentos, num “segundo nível” de captura. Mas, foi igualmente importante. Foi a animação da própria jogabilidade, como o Deacon se agacha ou movimenta para cobertura, como arremessa um bastão, tudo isso é feito por uma equipa de animação que perde imenso tempo a perceber como representar esse movimento de forma realista.

Por exemplo, nas criaturas, trabalhámos com a actriz contorcionista Bonnie Morgan para os Newts. O que ela fazia era fantástico. Inventou novas posturas, novas reacções. Não usamos 100% do que ela fez no produto final mas a sua energia e representação foi transposta para o jogo como animação.

W – Isso leva-nos a uma questão interessante. Agora que o MoCap (Captura de Movimentos) está tão na moda, ainda há muito trabalho para os animadores?

ER – Há muita magia e muito trabalho dos animadores. O MoCap é óptimo para os tempos, para os ritmos. Quando é bem capturado, é excelente para representar a transferência de peso, por exemplo. Podemos replicar isso com animação via “key frame” (passo a passo), mas demora imenso tempo a calcular o ritmo certo. Porque temos alguém a fazer mesmo os gestos e a capturar para uma animação, já temos esse ritmo certo. É uma grande vantagem.

Mas, será que não fazemos nada depois? Nem por isso. Era demasiado fácil (risos). Todo o contacto com o chão, com pessoas, com os objectos, por exemplo, precisa ser mexido. Depois, se for animação de jogabilidade, o designer de combate pode achar que a captura não foi suficientemente brutal ou que falta energia. Mudamos os tempos, os ritmos, a resposta ou colocamos uma animação no início do movimento e depois temos de a juntar com outra animação, decidindo a transição. E essa transição é outro problema.

Quando capturamos movimentos, andar a direito, andar a 90º, andar a 45º, andar para trás e por aí em diante, alguém tem de fazer o trabalho entre estes movimentos. Alguém tem de trabalhar as camadas e fazer as animações que não capturámos.

W – Ainda há muita pós-produção, não é só um actor no estúdio a fazer as cenas. 

ER – Era tão bom se fosse assim (risos). Por vezes até a cena pode ter mudado. O designer pode ter mudado a cena e alterado o ritmo. Aí temos muito para mexer. Estamos habituados e adoramos. No meu trabalho acabo também por ter de fazer muitas adaptações. Por exemplo, uma actriz feminina pode ter sido usada e é preciso alterar os movimentos para um corpo masculino. Há muito trabalho para ser feito.

W – Ainda não ficou sem emprego, portanto.

ER – Ainda não! (Risos)

W – Como chegou ao Bend Studio e a este jogo? Fale-nos um pouco de si. 

ER – Cheguei aos Estados Unidos há 21 anos. Fui trabalhar na indústria do cinema no campo da Animação. Cheguei a trabalhar na PDI (Pacific Data Images, hoje Dreamworks), no final do filme Ants e depois no Shrek como animador. Foi uma excelente oportunidade para trabalhar em Hollywood e aprender muito sobre os detalhes complexos da animação. Quando isso terminou, tinha amigos a trabalhar já na indústria dos videojogos e trabalhei num jogo, na altura com o actor Jet Li. Esse foi o meu primeiro contacto com os jogos.

Mas, eu sempre fui um gamer. Na PDI, por exemplo, jogávamos muitos videojogos nas pausas. Por isso, trabalhar na indústria foi fantástico. Levei quase um ano a entender as diferenças entre a animação para cinema e para os jogos, a importância do ritmo que já falámos. E quando finalmente entendi, tudo ficou mais fácil. Depois apliquei o meu gosto pelo detalhe e pela narrativa e foi um sucesso.

Cheguei ao Bend Studio há 14 anos. Trabalhei em Dark Mirror, Resistance e Uncharted: Golden Abyss e agora Days Gone na sua produção completa.

W – Agora que fala de Uncharted, notámos alguma influência desse jogo em Days Gone.

ER – Já ouvi as pessoas mencionarem até alguma influência de Syphon Filter. Como o Deacon corre. Afinal, é a mesma equipa. Temos conhecimento de como fazer combate, como fazer uma aventura, por isso, sim, usamos isso como referência, obviamente.

W – Voltando ao jogo, então o que é diferente em Days Gone. Já falou dos desafios do novo IP mas com certeza que o projecto tem as suas características únicas.

ER – Penso que será a sua história única, uma personagem que gostamos, Deacon St. John, ex-motoqueiro, ex-militar, que se apaixonou por Sarah. Mas, uma pandemia aconteceu e o mundo colapsa. Ele perde-a e agora anda com o seu amigo. Quisemos que o jogador sentisse esse arco de história. É uma história de adversidade, luta contra essa adversidade, luta por uma nova vida num mundo hostil. Temos uma frase no jogo que diz “sobreviver não é viver” e é mesmo isso.

Deacon não é perfeito. Tem os seus “altos e baixos”. O que é ser perfeito, na realidade? O jogador pode decidir que Deacon viva fora dos acampamentos, talvez por acharem ser demasiado fácil. Mas, com isso há decisões para tomar, de modo a, por exemplo, negociar com estes acampamentos. E, por vezes, essas escolhas não são tomadas sem consequências. O que acontece com Boozer no inicio do jogo é da responsabilidade de Deacon, por exemplo. E terá de viver com isso. Penso que é um jogo grande, com uma grande história.

Também é interessante a jogabilidade com a mota, com todas as melhorias para fazer. A mota fica melhor e obriga-nos a cuidar dela. Podemos personalizá-la, mudar-lhe o aspecto com milhares de opções. Deacon era um motoqueiro e essa ligação está no jogo. E os jogadores também vão ter essa ligação.

Esta entrevista foi traduzida de uma gravação ao vivo em Inglês. A ordem das questões, assim como a tradução é nossa e assumimos algum erro ou imprecisão na gramática. As informações concretas, porém, são inteiramente reproduzidas.

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